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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Proc. JF/SE. Nº 99.0002090-1 - Classe II - 3ª Vara.

Ação: "Mandado de Segurança".

Impetrante: Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado de Sergipe – SINTSEP/SE.

Impetrado: Coronel da 19ª CSM do Ministério do Exército.

 

E M E N T A: TRIBUTÁRIO E PREVIDENCIÁRIO. SERVIDORES PÚBLICOS. SEGURIDADE SOCIAL. LEI 9.783/99. ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS. EFEITOS CONFISCATÓRIOS. CONTRIBUIÇÃO. FUNÇÃO CONSTITUCIONAL. DESCARACTERIZAÇÃO. O custeio da seguridade social do servidor público, com base em alíquotas progressivas incidentes sobre remuneração, proventos e pensões, conforme regramento da Lei 9.783/99, tem efeito confiscatório. Tal sistemática, instituída para cobrir déficits pretéritos e não para pagar benefícios futuros, desvirtua a função da contribuição previdenciária, conforme definição constitucional

S E N T E N Ç A:

Versam os autos sobre Mandado de Segurança Preventivo impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Serviço Público Federal no Estado de Sergipe - SINTSEP, na qualidade de substituto processual, com pedido de liminar, no qual visa obter provimento jurisdicional que impeça a implementação dos descontos da contribuição social com as alíquotas previstas na Lei n.º 9.783/99 incidentes a partir de maio de 1999 sobre os vencimentos, proventos e pensões dos servidores federais substituídos.

 

Aduziu a inconstitucionalidade da referida Contribuição, em razão da lei em epígrafe haver majorado as alíquotas de contribuição, instituindo um sistema de tributação progressiva e confiscatório não acolhido pela Lei Maior.

 

Juntou à inicial os documentos de fls. 50/131, com a comprovação do pagamento das custas iniciais (fl. 132).

 

A liminar foi concedida, com a determinação para que os valores fossem depositados à disposição do Juízo (fls. 134/142).

 

O Coronel da 19ª CSM do Ministério do Exército veio aos autos alegando sua ilegitimidade passiva ad causam, visto que as alterações na folha de pagamento, decorrentes da aplicação do diploma legal atacado, são da competência do Centro de Pagamento do Exército(CPEx).

 

Por sua vez, apresentou a União Federal contestação (fls. 150/160), pugnando pela constitucionalidade e legalidade da referida cobrança.

 

O Representante do MPF opinou pela concessão da Segurança (fl. 167), entendendo ser flagrante a inconstitucionalidade do referido desconto.

 

 

 

RELATADOS, FUNDAMENTO E DECIDO.

 

 

Inicialmente, rejeito a preliminar argüida, uma vez que não restou comprovado não ser o(a) impetrado(a) a autoridade competente para cumprir a ordem judicial. Ao contrário, o(a) própria impetrado(a), ao prestar as informações, confirmou a sua legitimidade passiva.

 

Numa incursão ao tema "confisco": os eminentes tributaristas Hugo de Brito Machado e Roque Antônio Carraza assim comentam o assunto, respectivamente:

 

 

1) "Cabe ao judiciário dizer quando um tributo é confiscatório. A regra constitucional, no mínimo, deu ao judiciário mais um instrumento de controle da voracidade fiscal do Governo (...).

Já no regime constitucional anterior alguns tributaristas sustentavam ser inadmissível o tributo confiscatório, posto que isto implicaria negar o direito de propriedade, constitucionalmente garantido.

O caráter confiscatório do tributo há de ser avaliado em função do sistema, vale dizer, em face da carga tributária resultante dos tributos em conjunto" (Curso de Direito Tributário, 11ª ed., p. 31).

2) "O tributo, de algum modo, esgarça o direito de propriedade. Ora, na medida em que o direito de propriedade é constitucionalmente protegido, o tributo só será válido se, também ele, deitar raízes na Constituição." (Curso de Direito Constitucional Tribunal, p. 226).

Ou seja, não apenas sob o aspecto do desconto a ser efetuado o confisco se caracterizaria, como também quando a lei instituidora faz tábula rasa de diversas regras constitucionais e, portanto, é inválida.

 

No caso destes autos, não será necessário adentrar em complexas indagações posto que, a esta Juíza, o confisco se apresenta, conforme visto acima na lição de Carraza, pelo simples fato de a lei instituidora conter diversas inconstitucionalidades, conforme fundamentação discorrida ao longo desta sentença.

 

De acrescentar os outros tributos a que o cidadão está obrigado: no dizer de Celso Bastos,

 

 

"o art. 150, IV, proíbe a utilização do tributo com efeito de confisco. A atividade tributária deve ater-se à captação de apenas uma parte da expressão econômica da operação tributária. Deve cifrar-se ao razoável, no sentido de não ser tão ínfima a ponto de tornar-se insignificante para a arrecadação do Estado, como também não pode exceder um determinado montante, a partir do qual estaria havendo uma apropriação que sacrificaria o próprio direito à propriedade.

Contudo, há que se referir algumas exceções por ocasião da utilização do tributo com finalidades extrafiscais. Admitem-se, portanto, em tese, alíquotas altas em impostos de importação ou mesmo de consumo quando não se desejem ver importadas ou consumidas determinadas mercadorias. É o caso, por exemplo, do fumo e das bebidas alcoólicas no imposto de consumo. Essas hipóteses, valores de extrema significação social ou econômica podem legitimar a cobrança de tributos com altas alíquotas. A inexistência, contudo, dessa motivação de interesse coletivo leva naturalmente a que o imposto se torne confiscatório, lesivo ao direito da propriedade que a própria Constituição assegura.

A doutrina reconhece a dificuldade da exata demarcação do ponto a partir do qual um tributo se torna confiscatório. A existência dessas áreas cinzentas não conduz, todavia, à diluição do próprio conceito; aliás, o fato de haver essas áreas limítrofes de difícil precisão é muito peculiar a todos os ramos do Direito.

Uma tributação pode ser confiscatória sob duas modalidades fundamentais: uma consiste na tomada em consideração exclusiva da operação tributária; a outra, traduz-se na significação da cobrança daquela quantia ante a situação patrimonial do contribuinte. Temos para nós que o Texto Constitucional veda o confisco em qualquer dessas modalidades.

Sobre o tema aqui versado é extremamente enriquecedor ouvir-se Ives Gandra da Silva Martins:

"Não é fácil definir o que seja confisco, entendo eu que, sempre que a tributação agregada retire a capacidade de o contribuinte se sustentar e se desenvolver (ganhos para suas necessidades essenciais e ganhos superiores ao atendimento destas necessidades para reinvestimento ou desenvolvimento), estar-se-á perante o confisco.

Na minha especial maneira de ver o confisco, não posso examiná-lo a partir de cada tributo, mas da universalidade de toda a carga tributária incidente sobre um único contribuinte.

Se a soma dos diversos tributos incidentes representa carga que impeça o pagador de tributos de viver e se desenvolver; estar-se-á perante carga geral confiscatória, razão pela qual todo o sistema terá que ser revisto, mas principalmente aquele tributo que, quando criado, ultrapasse o limite da capacidade contributiva do cidadão.

Há, pois, um tributo confiscatório e um sistema confiscatório decorrencial. A meu ver, a Constituição proibiu a ocorrência dos dois, como proteção do cidadão." (Comentários à Constituição Federal do Brasil, cit., págs. 161/4)"

Bernardo Ribeiro in Compêndio de Direito Tributário, vol. II, 2.ª ed., p. 127, assim consigna:

 

 

"Dino Jarac, examinando a matéria, salienta que o princípio da vedação do imposto confiscatório deve ser levado em conta diante do problema de não se tirar do direito de propriedade o seu verdadeiro conteúdo. O tributo confiscatório não se define por um percentual, mas pelo ônus fiscal que sem motivo se torne insuportável para o contribuinte."

Um outro aspecto que vejo como mácula à lei em comento, é a estipulação de alíquotas progressivas, quando o art. 145, § 1º da CF somente permite, a teor do que se extrai dele, nos impostos, senão vejamos: "Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte (...)" (original sem grifo).

 

Como tão bem evidenciou o ilustre constitucionalista Carlos Brito, no "Comentário à Lei 9.783/99 e suas inconstitucionalidades",

 

 

"A contribuição que recai sobre o funcionalismo é exigente de eqüidade na forma de participação no custeio das aposentadorias e pensões. Eqüidade, na acepção de que os servidores devem suportar o ônus da contribuição de modo proporcionado à remuneração de cada qual deles. É deduzir: quem recebe mais do Poder Público, mais expressivamente deve contribuir, mantidas, porém, as originárias diferenças estipendiárias; ou seja, preservadas as proporções entre os níveis de remuneração dos cargos públicos, tal como legalmente fixados, pois a contribuição previdenciária não se presta como instrumento de alteração de vencimentos, nem enquanto mecanismo redutor de distâncias sociais no âmbito do setor público (ao contrário do imposto de renda, este, sim, utilizando como ferramenta de política extra fiscal). Longe de desconfirmar diferenças de ganhos pelo exercício de cargos públicos, as alíquotas de desconto previdenciário deve primar, justamente, pela sua confirmação. Para isso é que elas existem, a custear, mês a mês, futuras aposentadorias e pensões também caracterizadas por diferentes valores."

Ademais, o STF recentemente decidiu de modo idêntico, ao deferir medida cautelar na ADIn 2.010-DF, por considerar que

"A CF, na redação dada pela EC 20/98, não autoriza a cobrança de contribuição de seguridade social sobre os servidores aposentados e pensionistas ..." (Informativo 164 do STF)

E, ainda,

 

"O Tribunal, por maioria, deferiu o pedido de liminar para suspender a eficácia do art. 2º e seu parágrafo único da Lei 9.783/99, que acresce à alíquota de 11%, prevista no art. 1º da citada Lei, 9% ou 14%, de acordo com a remuneração, provento ou pensão recebida. À primeira vista, o Tribunal considerou relevante a argüição de inconstitucionalidade pela descaracterização da função constitucional da contribuição de seguridade social, já que foi instituída em alíquotas progressivas com a finalidade de cobrir o déficit passado e não benefício a ser pago ao contribuinte. O tribunal também considerou relevante a tese de ofensa ao princípio que veda a utiização de qualquer tributo com efeito de confisco (CF, art. 150, IV) ..." (Informativo 164 do STF)

Assim, concedo a segurança requerida, ordenando que não seja efetuado o desconto da contribuição social com os aumentos previstos no art. 2º e parágrafo únicoº da Lei nº 9.783, de 28 de janeiro de 1999, sobre os vencimentos dos servidores substituídos neste mandamus.

 

Torno sem efeito a restrição feita por ocasião do deferimento da medida liminar, no sentido de que os valores descontados ficassem à disposição deste Juízo em um dos postos bancários nesta Seção Judiciária, e determino que os valores sejam liberados em favor dos respectivos titulares.

 

Custas pelo impetrado.

 

Sem honorários, nos termos das Súmulas nº 105, do STJ e 512, do STF.

 

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

 

Aracaju, 20 de outubro de 1999.

 

 

Telma Maria Santos

Juíza Federal Substituta da 3ª Vara