PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA
FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe
Processo nº 96.3153-3 - Classe 05005 - 4ª Vara.
Ação: Embargos à Execução.
Partes:
Embgte: Hotese Hotéis de Sergipe S/A
Embqdo: Fazenda Nacional
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. IMPOSTO SOBRE O LUCRO LÍQUIDO. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO ART. 35 DA LEI Nº 7.713/88. ANULAÇÃO DO DÉBITO INSCRITO NA DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
SENTENÇA:
Vistos etc...
Hotese Hotéis de Sergipe S/A, qualificado na exordial e por seu advogado regularmente constituído, opõe Embargos à Execução que lhe promove a Fazenda Nacional, alegando haver sofrido fiscalização tributária federal, tendo sido lavrado auto de infração alusivo ao exercício de 1989, exigindo imposto de renda na fonte, a ser calculado sobre o valor do lucro líquido obtido pela embargante na presunção de que houve sua distribuição com os acionistas.
Salienta que o débito foi enquadrado nos termos do art. 35 da lei nº 7.713/88, lei esta declarada insconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, através de decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 172.058-1/Santa Catarina, o que lhe confere o direito de não mais recolher a exação.
Alicerça seu pleito na Instrução Normativa nº 139, de 22.12.89, do Sr. Secretário da Receita Federal, que considera o tributo um adicional do imposto de renda de pessoa jurídica, uma vez que ele incide de qualquer forma, quer tenha havido ou não a distribuição dos lucros, caso em que será pago como ônus da pessoa jurídica, como despesa indedutível.
Argumenta, também, que a supramencionada lei extrapola os seus limites, tributando os lucros e elegendo como fato gerador a sua própria existência, em flagrante violação ao art. 43 do CTN, que define esse fato gerador como sendo a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda ou de proventos de qualquer natureza.
O embargante traz aos autos acórdão proferido pelo Eg. TRF/5ª Região, declarando a inconstitucionalidade da legislação em tela.
Requer: a) a procedência dos embargos com a conseqüente anulação do débito inscrito na Dívida Ativa da União, haja vista as ilegitimidades apontadas; b) a produção de todos os meios de prova em direito admitidos; c) a condenação da embargada aos ônus sucumbenciais.
Junta, às fls. 09, a procuração e, às fls. 10, o termo de substabelecimento, bem como os documentos de fls. 11 a 34, e o comprovante do recolhimento de custas à fl. 35.
Recebidos os Embargos e intimada a Fazenda Nacional para oferecer impugnação, fê-lo às fls. 45/48, rechaçando as alegações da embargante no que tange ao argumento da infração ao art. 43 do CTN. Segundo a embargada, a adoção do procedimento de tributar na fonte o imposto sobre lucro líquido, não viola tal dispositivo e tampouco se altera o seu fato gerador. Acrescenta que o art. 116 do CTN prega o elemento temporal como indicador do momento em que o fato gerador ocorre, podendo ser tanto o da disponibilidade jurídica quanto o da efetiva percepção dos lucros por seu titular ou do nascimento do direito ao crédito. Relata a confusão feita pelo embargante em relação a fato gerador e base de cálculo, bem assim quanto a contribuinte (sócio-acionista) e responsável pelo recolhimento na fonte (pessoa jurídica).
Prossegue sua contraposição dizendo não se tratar de tributação antecipada, posto que, com a percepção do lucro, tenha ou não sido distribuído, o fato gerador já ocorreu e a obrigação tributária já se constituiu.
Finalizando e pretendendo demonstrar a pacificação da matéria, ilustra suas assertivas com decisões dos tribunais.
Requer a improcedência dos Embargos, com a condenação da embargante nas custas processuais e honorários advocatícios.
Instada a manifestar-se sobre a Impugnação ofertada, a embargante não o fez, consoante certidão de fls. 50v.
Desnecessária a produção de provas em audiência, impôs-se o julgamento antecipado da lide, à fl. 51, inocorrendo recurso.
Vieram-me os autos conclusos para prolação de sentença.
É O RELATÓRIO.
ASSIM, DECIDO.
Pretende a autora ver declarada a inconstitucionalidade do art. 35 da Lei nº 7.713/88, que instituiu a cobrança do Imposto de Renda sobre o Lucro Líquido das empresas, à alíquota de 8%, mediante retenção na fonte, considerando o referido lucro como automaticamente distribuído aos sócios e acionistas, que seriam os contribuintes da exação, figurando o embargante como responsável pela retenção e pagamento do imposto à Fazenda Nacional.
À propósito, dispõe o art. 35 da Lei nº 7.713/88 que:
"O sócio quotista, o acionista ou o titular da empresa individual ficará sujeito ao imposto de renda na fonte, à alíquota de oito por cento, calculado com base no lucro líquido apurado pelas pessoas jurídicas na data do encerramento do período-base."
E o art. 36 da mencionada lei determina:
"Os lucros que forem tributados na forma do artigo anterior, quando distribuídos, não estarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte."
A irresignação do embargante está embasada na alegação de que o art. 35 da Lei nº 7.713/88 criou novo fato gerador e nova base de cálculo do Imposto de Renda, que não estão compreendidos nos dispositivos que regulamentam a matéria no Código Tributário Nacional-CTN, sendo inconstitucional a exação em apreço, porquanto somente a lei complementar poderia dispor sobre o assunto, face ao CTN ter nível hierárquico de lei complementar, o que viola os arts. 59 e 146, III, "a", da Lei Maior.
Dispõe o art. 43 da Lei nº 5.172, de 25.10.66, denominada Código Tributário Nacional, que:
"Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior".
Este é o fato gerador do Imposto de Renda, que somente pode ser alterado por lei complementar, já que o CTN tem esta categoria no ordenamento jurídico.
A base de cálculo do Imposto de Renda está definida no art. 44 do diploma legal supramencionado e é o montante real, arbitrado ou presumido da renda ou dos proventos tributáveis.
Contribuinte do Imposto de Renda, estatui o art. 45 do CTN, é o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43, arrematando o parágrafo único deste dispositivo que a lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam.
Como transcrito acima, o fato gerador do Imposto de Renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de proventos de qualquer natureza e a lei contestada, ao meu sentir, não criou novo Imposto, nem instituiu novo fato gerador ou nova base de cálculo do IR, a exigir edição de lei complementar, pois, apenas determinou, como lhe autoriza o parágrafo único do art. 45 do CTN, a retenção e o recolhimento ao Erário, antecipadamente, do imposto incidente sobre os lucros auferidos ou a serem auferidos pelos sócios, acionistas ou titulares de empresa individual.
A hipótese de incidência do IR de que cogita o art. 35 da Lei nº 7.713/88 já está prevista no art. 43 do CTN. A aquisição de disponibilidade econômica de renda ocorre quando o lucro líquido da empresa é distribuído entre os seus beneficiários, enquanto que a aquisição de disponibilidade jurídica está representada pelo crédito que têm os beneficiários do lucro líquido da pessoa jurídica quando este não é distribuído, mas capitalizado, ou integrado ao patrimônio da sociedade, ou tenha qualquer outra destinação atribuída pelos seus titulares.
A base de cálculo do IR na hipótese em apreço também já está definida no art. 44 do CTN e é o montante real da renda tributável que, na espécie, está representada pelo valor do lucro líquido destinado a cada sócio quotista, acionista ou titular de empresa individual.
Contribuintes do IR, no caso aventado nos autos, são os beneficiários do lucro líquido distribuído ou a distribuir, como estabelecido no art. 45 do CTN, assumindo a suplicante, na relação jurídica determinada no art. 35 da Lei nº 7.713/88, a sujeição passiva, na qualidade de responsável tributária pela retenção e recolhimento ao Tesouro Nacional do Imposto de Renda devido.
Assim, está positivado que o fato gerador, a base de cálculo e os contribuintes da exação prevista no art. 35 da Lei nº 7.713/88 já se encontram definidos na lei complementar pertinente, isto é, o CTN, inexistindo qualquer ofensa aos arts. 59 e 146, III, "a" da Constituição Federal, eis que respeitada a hierarquia existente no ordenamento jurídico e já previstos em lei complementar fato gerador, base de cálculo e contribuintes do imposto cobrado.
Por outro lado, inocorre hipótese de bitributação, pois a empresa paga o seu Imposto de Renda com base no lucro líquido apurado no período anual, enquanto que os sócios, acionistas e titulares individuais da empresa o pagam com lastro no valor desse lucro, atribuído a cada um, considerando a participação individual que têm na sociedade.
Entendo que vedar a tributação determinada no art. 35 da Lei nº 7.713/88 sobre os lucros não distribuídos é frustrar a ocorrência do fato gerador definido no art. 43 do CTN.
Todavia, curvo-me á orientação do egrégio Supremo Tribunal Federal que, ao julgar o RE nº 172.058-1-SC, relatado pelo eminente Ministro Marco Aurélio, assim decidiu:
"Por unanimidade de votos, o Tribunal conheceu do recurso extraordinário. Decidindo a questão prejudicial da validade do art. 35 da Lei nº 7.713/88, nele, declarou-se a inconstitucionalidade da alusão a "o acionista" e a constitucionalidade da expressão "o titular de empresa individual". Quanto às palavras "o sócio cotista", o Tribunal declarou sua constitucionalidade, salvo quando, segundo o contrato social, não dependa do assentimento de cada sócio a destinação do lucro líquido a outra finalidade que não a de distribuição(...)IMPOSTO DE RENDA RETENÇÃO NA FONTE SÓCIO COTISTA. A norma insculpida no artigo 35 da Lei nº 7.713/88 mostra-se harmônica com a Constituição Federal quando o contrato social prevê a disponibilidade econômica ou jurídica imediata, pelos sócios, do lucro líquido apurado, na data do encerramento do período-base. Nesse caso, o citado artigo exsurge como explicitação do fato gerador estabelecido no artigo 43 do Código Tributário Nacional, não cabendo dizer da disciplina, de tal elemento do tributo, via legislação ordinária..." (DJU, 1,13.10.95, pág. 34.282)."
No lastro do entendimento do STF, e em se tratando, "in casu", de sociedade anônima, cujo capital é dividido em ações, estando sujeita a uma administração escolhida periodicamente pelos acionistas, os quais não assumem qualquer responsabilidade acerca dos negócios sociais, limitando-se suas obrigações tão somente ao capital subscrito, julgo procedentes os embargos ofertados, para o fim de decretar a anulação do crédito inscrito na Dívida Ativa da União e objeto da execução embargada, face à sua inexigibilidade, tornando insubsistente a penhora realizada e condenando a embargada no ressarcimento das custas e no pagamento de processuais e honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa.
P.R.I
Aracaju, 04 de agosto de 1999.
Juiz Edmilson da Silva Pimenta