Processo nº 99.0000591-0 - Classe XII- 3ª Vara.
Ação: Cautelar.
Requerente: Ana Lúcia Aragão de Carvalho.
Requerida: Caixa Econômica Federal - CEF.
E M E N T A: SFH. CAUTELAR. AÇÃO PRINCIPAL. PENDÊNCIA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. ÓRGÃOS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO. INSCRIÇÃO. PROCEDÊNCIA. O ajuizamento da ação principal, com citação válida, onde se discute cláusulas do contrato de compra e venda de imóvel, mútuo com obrigações e quitação parcial, segundo regramento próprio do Sistema Financeiro de Habitação, torna litigiosa coisa. Inexistem, pois, razões que autorizem o desapossamento do imóvel e/ou a inserção do nome do mutuário nos órgãos de restrição ao crédito.
S E N T E N Ç A:
Através de ação cautelar incidental, com pedido de liminar, proposta por Ana Lúcia Aragão de Carvalho em face da Caixa Econômica Federal CEF, pretende a requerente suspender execução extrajudicial do imóvel onde reside, promovida pela requerida.
Esclarece que adquiriu o referido bem através de contrato de financiamento firmado com a requerida, consoante regramento legal do Sistema Financeiro de Habitação, e que a demandada não está observando a avença, rompendo ao seu talante o equilíbrio contratual inicialmente estabelecido, matéria esta que pretende discutir no feito principal a ser oportunamente ajuizado.
Alega a inconstitucionalidade do Decreto-lei nº 70/66, por vislumbrar malferimento aos princípios o devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.
Entendendo presentes os requisitos legais, requer medida liminar que vede à CEF promover qualquer tipo de execução, judicial ou extrajudicial, ou lançar o nome da requerente nos cadastros restritivos de créditos e, ao final, a procedência da demanda cautelar ajuizada, com as cominações legais cabíveis.
Com a inicial foram trazidos os documentos de fls. 09/39 e comprovante de pagamento das custas (fl. 40).
Deferida liminar, com ordem de citação da requerida (fl. 42/45).
Citada, a requerida apresentou resposta e juntou documentos (fls. 55/64).
Em sua contestação, a CEF suscita como preliminar a carência de ação, por impossibilidade jurídica dos pedidos e impropriedade procedimental.
No mérito, alega que a requerente, ao persistir em inadimplência, deu ensejo à guerreada execução extrajudicial, procedimento legítimo regulado pelo Decreto-lei 70/66, cuja constitucionalidade é reconhecida amplamente pelos nossos tribunais.
Argumenta que não estão presentes os pressupostos específicos para a concessão de medida cautelar o fumus boni iuris e o periculum in mora pelo que requer ou o indeferimento da inicial, por força das preliminares argüidas, ou a improcedência da ação.
A parte ativa se manifesta em fls. 65/66, onde informa que a requerida, apesar da litigiosidade do objeto da lide, está a promover execução extrajudicial, e requer ordem judicial suspendendo leilão já designado.
Após o deferimento do pedido (fl. 69), a requerente noticia novo leilão extrajudicial a ser realizado sob os auspícios da CEF e requer a suspensão do ato, pedido este indeferido em fl. 81.
A parte ativa replica em fls. 83/88, onde rebate a argumentação da defesa e reitera pedido de procedência da ação.
É o relatório.
Fundamento e decido.
Em princípio, analiso as preliminares suscitadas:
1. inicialmente, entendo que a vontade manifesta da requerida não é de se servir desta demanda judicial para permanecer inadimplente e obstar à requerida a cobrança legítima de seu crédito. Não é disso que se trata. Uma vez que a lide cautelar intenta coibir qualquer medida de desapossamento do bem e/ou restritiva do crédito do(a) requerente, enquanto se define no feito principal os critérios definidores do quantum devido, rejeito a preliminar de carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido;
2. inacolho, também, a preliminar de impropriedade da via processual eleita, posto que esta ação cautelar tem o objetivo de garantir o resultado útil do feito principal ajuizado, evitando danos consideráveis à requerente, enquanto litiga acerca do valor das prestações do mútuo imobiliário.
Passo, enfim, ao mérito.
Discorrendo sobre a necessidade do processo cautelar, o preclaro José Carlos Barbosa Moreira, argumenta que ela "resulta da possibilidade de ocorrerem situações em que a ordem jurídica se vê posta em perigo iminente, de tal sorte que o emprego de outras formas de atividade jurisdicional provavelmente não se revelaria eficaz, seja para impedir a consumação da ofensa, seja mesmo para repará-la de modo satisfatório" (O novo processo civil brasileiro, 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1990, pág. 410).
Quanto aos fins das ações cautelares, ensina o magistério do Doutor Humberto Theodoro Júnior, "Não é o direito material que assegura o exercício dessa ação, mas o risco processual de ineficácia da prestação definitiva sob influência inexorável do tempo que se demanda para alcançar o provimento definitivo no processo principal" (Processo cautelar. São Paulo: LEUD, 1976, pág. 60).
Como se vê, os provimentos cautelares constituem-se em mecanismos processuais através dos quais se procura assegurar a efetividade do resultado definitivo no processo principal, evitando-se, por essa via, que a força corrosiva do tempo torne inócua a lide.
Analisemos, então, os requisitos da tutela cautelar:
Segundo o art. 798, do Código de Processo Civil, um dos parâmetros para a concessão de medida cautelar é a existência de fundado receio de lesão grave, iminente e irreparável, a um determinado direito da parte.
Conforme se depreende dos elementos trazidos aos autos, o(a) requerente está submetido a uma situação que ameaça seriamente o direito de permanecer na posse do imóvel em questão e, ao mesmo tempo, discutir em juízo as cláusulas contratuais cuja aplicação, por parte da requerida, não tem, em tese, respeitado os critérios legais e/ou contratuais pertinentes.
Por outro lado, inocorre o periculum in mora inverso, uma vez atendida a determinação judicial que condicionou a manutenção da medida liminar concedida à caução, a ser prestada pelo(a) requerente, através de depósitos judiciais dos valores aproximadamente equivalentes aos encargos mensais relativos ao imóvel.
Outrossim, na pouca profundidade com que se deve apreciar "o quesito de aparência da existência de um direito", o proverbial fumus boni iuris, tenho por relevantes as razões fáticas e jurídicas apresentadas pelo autor, eis que o contrato de mútuo imobiliário celebrado entre as partes tornou-se coisa litigiosa, não podendo a ré esvaziar o objeto da ação principal com medidas restritivas de direitos da suplicante, quais sejam, a execução extrajudicial ou a inclusão do nome do mutuário em cadastros públicos ou privados de inadimplentes, sobretudo porque a dívida encontra-se sub judice, outra não sendo a intenção da ré, com tal procedimento, senão compelir a mutuária a satisfazer o seu crédito em discussão, assim frustando futura decisão judicial que, porventura, lhe seja favorável.
Além disso, a inclusão do nome da requerente nos combatidos cadastros pode ensejar-lhe prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação à sua imagem e ao seu patrimônio, inclusive inviabilizando as suas atividades econômicas e, por conseqüência, a sua própria sobrevivência.
Isto posto, ressaltando a provisoriedade da medida cautelar, julgo procedente o pedido e concedo a medida cautelar requerida, determinando que a requerida se abstenha de promover qualquer medida extrajudicial que implique em desapossamento do bem em discussão, vedando-se, também, que a CEF inscreva o nome do(a) requerente, ou mantenha a inscrição eventualmente operada, nos cadastros de inadimplentes, especialmente da SERASA, do CADIN e do SPC.
Condeno a CEF no pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Cópia desta sentença nos autos principais.
Publique-se. Registre-se. Intime(m)-se.
Aracaju, 31 de maio de 2000.
Telma Maria Santos.
Juíza Federal Substituta da 3ª vara