PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe
Proc. JF/SS. Nº 95.0001882-9 - Classe I - 3ª Vara.
Ação : "Ordinária".
Partes: ... Geraldo Soares Dias.
... União Federal.
E M E N T A: MERCADORIA ESTRANGEIRAS. AQUISIÇÃO NO TERRITÓRIO NACIONAL. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ. APREENSÃO. PERDIMENTO. INVIABILIDADE. DEVOLUÇÃO DE MERCADORIA APREENDIDA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ASTREINTE. A aquisição de mercadorias estrangeiras, no território nacional, com documentos fiscais, está suportada pelo princípio de presunção da boa-fé. Não se pode exigir que o consumidor só adquira bens, após ter comprovada a regularidade fiscal do vendedor. Seria inviabilizar a atividade mercantil. Para tanto, dispõe o Poder Público de seu aparato fiscalizatório. A pena de perdimento não é de ser aplicada se se comprova a aquisição da mercadoria, no mercado interno, com a respectiva nota fiscal, e à míngua de prova de conluio entre o comerciante e o adquirente. Determinada a devolução da mercadoria, o que envolve obrigação de fazer, cabe a inserção de ASTREINT, para o caso de atraso, a partir da execução sentencial, no termo inicial fixado pelo Juiz.
S E N T E N Ç A
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I - RELATÓRIO.
1.1 - Suma do(s) Pedido(s).
O autor sofreu pena de perdimento de equipamentos de informática, conforme auto de infração e termo de apreensão, sendo que os equipamentos foram deixados na empresa ZELAR IMÓVEIS LTDA, ficando como depositário o autor.
A liminar requerida, em ação cautelar ajuizada nesta 3ª Vara, foi indeferida. Os equipamentos foram removidos para a Receita Federal. Entretanto, por sentença, foi acolhido o pedido acautelatório de suspensão da pena aplicada.
Diz que, no caso, não se configura nenhuma das hipóteses legais ( art. 514, do Regulamento aduaneiro ) que autorizariam a sanção imposta.
Afirma que os equipamentos arrolados foram adquiridos e permutados na mais pura boa fé, e através de nota fiscal.
Interessante é que houve apreensão até mesmo de mercadorias nacionais, que não estão sujeitas ao regulamento aduaneiro.
Não pode ser aceita a alegação do fiscal de que os CGCs e as notas fiscais são "frias", ou de que as mercadorias nacionais dispõem de componentes estrangeiros.
Estando as notas fiscais corretas, com os dados pertinentes, não pode o adquirente saber se são "frias", e nem tem condições de saber se componentes do produto adquirido são estrangeiros e tiveram regular importação.
Ademais, não pode o fisco fazer exigência dessa ordem, uma vez que o próprio fisco se recusa indevidamente a colaborar com contribuintes que procuram se precaver em transações com importadores, não lhes repassando informações que lhe são solicitadas e que constam de seus cadastros, como já aconteceu com o autor.
Conclui, reiterando que: a autuação não tem amparo legal; agiu de boa-fé; inexiste, para o autor, a obrigação de fiscalizar a regularidade na importação da mercadoria.
Pede, pois, que seja decretada a nulidade da autuação e a cassação da pena de perdimento imposta e, em decorrência, a liberação dos equipamentos apreendidos, condenando-se, também, a demandada em custas e honorários.
1.2 - Suma da(s) Resposta(s).
Aduz que o fato relatado se enquadra na norma sancionatória aplicada ( art. 514, inc. XI, do Dec. 91030/85 ), uma vez que os bens foram adquiridos de firma inexistente, através de notas fiscais "frias" ( com CGC inexistente ), sem o recolhimento dos tributos devidos, conforme apurado pelo fisco.
Observa que jurisprudência adota a presunção de boa-fé e procura proteger o consumidor que transaciona com comerciante regularmente estabelecido, e não quem adquire de firma fantasma e apresenta nota fiscal "fria".
Procura respaldar a autuação, também, no art. 389, inc. I, do Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados IPI.
Alega falta de provas, tanto quanto a negativa em fornecer o CGC solicitado de algumas empresas, quanto a apreensão de mercadorias nacionais.
Pede, então, o improcedência da ação e a condenação do autor em custas e honorários.
1.3 - Registro das Principais Ocorrências.
Com a vestibular vieram documentos.
Custas iniciais honradas.
Com a contestação vieram documentos.
Houve réplica.
A ré junta documento, sobre o qual o autor se manifesta.
Instadas, as partes não se manifestam pela produção de provas em audiência
II - FUNDAMENTAÇÃO.
2.1 - Questões de Fato.
Parece-me que toda a matéria fática se exaure com o exame jurídico das questões envolvidas, que devem ser dirimidas a seguir.
2.2 - Questões de Direito.
2.2.1 - Preliminares.
As partes não invocaram preliminares.
2.2.2 - Mérito.
Pretende o autor:
... decretada a nulidade do auto em referência, bem como decretada a cassação da pena de perdimento imposto ao requerente, no Processo Administrativo Fiscal de nº 10510.001021/92-65;
liberação dos equipamentos apreendidos, relacionados no termo de apreensão e auto de infração.
Ao refutar a pretensão proemial aduz a requerida que:
... as mercadorias importadas foram adquiridas de firma fantasma
A fundamentação normativa invocada pela demandada, em sua peça contestatória, é o artigo 513, XI, do Decreto 91.030/85, bem como o artigo 389,I e II, do Regulamento do IPI, Decreto 87.981/82.
Vejamos cada qual de per si:
Aplica-se a pena de perdimento de mercadorias:
XI estrangeira, já desembarcada e cujos tribunos aduaneiros tenham sido pagos apenas em parte, mediante artifício doloso;
Esta provado nos autos, QUANTUM SUFFICIT, que o demandante não desembarcou qualquer mercadoria estrangeira no país, mas sim que o adquiriu, com nota fiscal, no mercado interno.
Quanto ao segundo fundamento:
... incorrerá na pena de perdimento...
I Quando o produto, sujeito ou não ao imposto, tiver sido introduzido clandestinamente no país, ou importado irregular ou fraudulentamente;
Parece-me claro o destinatário da norma, qual seja aquele que introduz clandestinamente ou importa de forma irregular e fraudulenta. Em nenhum dos casos está enquadrado o demandante.
Mencionou a demandada as notas fiscais 1119 e 1130, emitidas pela Eletron, e que o CGC lá consignado não existe. Vê-se que as notas fiscais são de 20.10.91, e 19.11.91, respectivamente.
Traz a demandada um documento de 31.10.96, dizendo que aquela empresa, com número do CGC não está cadastrada.
Isto é, um documento de cinco anos após a emissão da nota fiscal. Nem ao menos a demandada se quis dar ao trabalho para ver a situação no momento da emissão da nota.
Curiosamente, o próprio fisco de recusou a dar informações ao demandante, que se mostrou cuidadoso, e certamente, ressabiado com a ocorrência, e as pediu para confirmar a regularidade de um vendedor.
VIDETUR QUOD, não é tarefa do contribuinte, ao adquirir bens no mercado interno, com a obtenção de notas fiscais, sair averiguando de aquele comerciante está regular, se adquiriu corretamente os bens sujeitos à mercancia. Tarefas estas exclusivas do aparato estatal fiscalizatório. Espera-se que o desempenhe a contento, tanto para a produção de receita, quanto para a segurança do cidadão.
Evidentemente, que não se há de olvidar a possibilidade de um adquirente entrar em conluio com um comerciante irregular. Mas, isto não foi comprovado. Então:
BONA FIDES SEMPER PRAESUMITUR NISI MALA ADESSE PROBETUR.
Assim, entreguemos a palavra ao ínclito GERALDO APOLIANO:
Prova da regular aquisição, no mercado interno, dos bens constritos. Inexistência de ilícito fiscal a justificar a pena de perdimento, eis que não cabe exigir que o adquirente de bens, além de estar de posse da nota fiscal que fique obrigado a fazer a prova de que o importador a tenha internado regularmente no país.
Daí que, configurada a invalidade do procedimento administrativo, cabe o seu desfazimento, via controle judicial e a conseqüente liberação das mercadorias apreendidas.
Como a liberação envolve uma obrigação de fazer, cabe a cominação de ASTREINTE.
2.3 - Sucumbência.
2.3.1 - Honorários Advocatícios.
Por força de dispositivo dos arts. 20ss, do Estatuto Civil de Ritos, a parte contra quem o resultado do conteúdo sentencial for desfavorável deve arcar com o encargo da verba honorária. Até mesmo, se vem plasmando o entendimento que tal cominação prescinde de qualquer menção no pedido inicial. Opera-se OPE LEGIS.
A alíquota arbitrada deve incidir, em princípio, e salvo disposição diferente, expressamente manifestada na sentença, sobre o valor total da condenação, por força do art. 20, § º, do CPC.
2.3.2 - Despesas Processuais.
No que concerne ao aspecto das custas, incide o princípio geral de que a parte sucumbente arca com o ônus.
No entretanto, temos na lembrança a isenção prevista no art. 4º, I, da Lei 9.289/96, mas que onera as pessoas lá mencionadas, quanto ao reembolso do que foi adiantado pelo vencedor. É a previsão do parágrafo único do art. 4º, do mesmo diploma legal.
III - DISPOSIÇÃO.
Como Órgão do Judiciário, Poder da União emanado do povo:
Acolhido o Pedido.
Extingo o processo com julgamento do mérito e acolho o pedido da parte ativa para:
- pronunciar a anulação do procedimento administrativo de que trata a lide;
- determinar a liberação de todos os bens apreendidos. Como se trata de obrigação de fazer, comino multa de R$ 130,00 (cento e trinta reais) por dia de atraso, e com termo inicial de incidência, quarenta e oito horas após ser citado o demandado em execução.
Honorários de 10% sobre o valor da causa, a serem arcados pelo Requerido, com atualização a partir do ajuizamento.
Custas devem ser reembolsadas à parte ativa, pela Suplicada.
SENTENÇA SUBMETIDA À ORDEM DE DEVOLUÇÃO.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Aracaju, 15 de dezembro de 1998.
Carlos Rebêlo Júnior
Juiz Federal - 3ª Vara