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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Proc. JF/SE. Nº 99.0003870-3 - Classe V - 3ª Vara.

Ação: "Ação Civil Pública".

Autor: Ministério Público Federal.

Réu: União Federal.

 

 

 

E M E N T A: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MPF. LEGITIMIDADE PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO. SOBRINHO. MANUTENÇÃO EM CARGO DE CONFIANÇA. LEI Nº. 9.421/96. AUSÊNCIA DE PROIBIÇÃO. 1O Ministério Público Federal é órgão constitucionalmente legitimado para propor ação em defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, especialmente quanto à probidade administrativa. 2 – É a Ação Civil Pública a via processual adequada para a discussão deste tipo de demanda, visto estar em questionamento interesse coletivo. 2 – Conforme o preceptivo da lei 9.421/96, fica vedada a nomeação ou designação, para cargos ou funções comissionadas, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, de parente até o terceiro grau de juízes ou membros a eles vinculados. 3  - É de se notar, contudo, que a lei não faz referência à manutenção dos parentes designados antes de sua vigência, sendo que às normas limitativas de direito não se deve dar interpretação extensiva. 4 – Diante da ausência de proibição, deve-se rejeitar o pedido.

S E N T E N Ç A:

O Ministério Público Federal, por conduto de Procuradores da   República, ajuizou a presente “Ação Civil Pública em defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa” em face da União Federal e do Sr. Carlos Eduardo Carvalho Moura.

O autor aduz, como substrato fático-jurídico, as seguintes afirmações:

1- O réu Carlos Eduardo Carvalho Moura foi nomeado em 02 de abril de 1993, pela via do ato administrativo nº 138, do TRF da 5ª Região, para o cargo de diretor do Núcleo Judiciário dessa seção judiciária.

2- Que o supramencionado réu é sobrinho do Juiz Federal Titular da 2ª Vara desta Seção Judiciária, a qual é vinculada ao TRF da 5ª Região. Sendo assim, o servidor, que não é efetivo, não pode ocupar cargo em comissão no âmbito deste Tribunal, uma vez que seu tio, conforme dito, é Juiz vinculado ao TRF da 5ª R. e também Diretor do Foro desta Seção Judiciária de Sergipe

3- Com o advento do art. 10 da Lei nº 9.421/96, a situação funcional do já referido servidor estaria eivada de ilegalidade.

Consubstanciado nos argumento acima declinados, pediu:

I – antecipação dos efeitos da tutela, com o fito de afastar o réu do cargo.

II – No mérito, a exoneração do réu da função ora ocupada, bem assim, a condenação deste a ressarcir, integralmente, o dano causado ao erário público, desde o início da relação funcional ilícita, e, ainda, as penas previstas no art. 12, III, da lei nº 8.429/92, ou seja, a perda da função pública por decisão judicial, a suspensão dos direitos políticos, de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes a remuneração percebida e proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, por três anos.

O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi denegado, em decisão de fls. 51 a 54 dos autos.   Desta decisão, o representante do MPF interpôs Agravo de Instrumento.

Os réus foram citados.

O réu Carlos Eduardo Carvalho Moura apresentou a sua resposta, na forma de contestação (fls. 72 a 81), argüindo:

1) Preliminarmente, a inadequação da via eleita, sob o argumento de que a Ação Civil Pública, de que trata a lei nº 7.347/85, não se presta a atacar situações não definidas nela mesma.

2) No mérito, argüiu:

2.1) a inexistência de proibição quando da nomeação, uma vez que fora designado Diretor de Núcleo através do ato nº 138, de 02 de abril de 1993, assinado pelo Juiz Castro Meira, tendo sido indicado o seu nome pelo Juiz Vladimir Souza Carvalho, seu tio, à época Diretor do Foro desta seção Judiciária.

2.2) A proibição existente no art. 10 da Lei 9.421/96 diz respeito tão somente à nomeação ou designação e não à manutenção do servidor no cargo para o qual fora nomeado outrora.  Procurando embasar esta tese, traz citações da decisão administrativa exarada pelo Egrégio TRF da 5ª Região favorável ao seu pensamento.

2.3) Inexistência de proibição na manutenção do parente de terceiro grau em cargo de Diretor de Núcleo.

A União também ofereceu a sua contestação, fls. 102 a 107 dos autos, aduzindo que nem a lei 8.112/90, nem a de nº 8.233/91, esta última porque versa sobre a criação do TRT da 20ª Região, acodem o pleito autoral.  Bem assim, que o art. 6º da LICC e art. 5º, XXXVI da Constituição Federal proíbem que a lei nº 9.421/96 alcance a retroatividade desejada pelo eminente procurador da República.

Documentos foram acostados aos autos.

 Aberta vista ao MPF, este requereu o julgamento antecipado da lide.

 

Numa visão per suma capita, eis o RELATÓRIO.

 

FUNDAMENTO E DECIDO.

 

Deveras, presente a situação processual insculpida no art. 330 do CPC, é o caso de julgamento antecipado da lide.

           

I- Preliminarmente, é de se analisar a legitimidade do MPF para ajuizar a presente demanda, bem como o cabimento da via eleita.

 

O art. 129, III, da Carta da República, é explícito:

“Art. 129: São funções institucionais do Ministério Público:

(omissis)

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

O disposto nos art. 16 e 17, da Lei 8.429/92 apenas reafirma o texto constitucional.

Por sua vez, o art. 6º, VII, da LC 75/93, repete o texto magno e, no inciso XIV, explicita que, além do inquérito civil e da ação civil pública, o MPF também pode “promover outras ações necessárias ao exercício de suas funções institucionais, em defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, especialmente quanto: (...) f) à probidade administrativa”.

Evidentemente que o MP, legitimado, conforme já demonstrado acima, ao propor a ação estará se valendo da ação civil pública, incidindo, então a Lei 7.347/85 e o CPC, subsidiariamente.

A ação cabível é, realmente, a Ação Civil Pública, conforme se extrai da própria lei 8.429/92, arts. 17 e 18, bem assim de entendimento doutrinário e jurisprudencial consolidado. 

Com efeito, assim dispõe o art. 17: “ A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo pelo Ministério Público ou pessoa jurídica interessada (...)”.  E, no art, 18, inserto está: “A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano (...)” (original sem negrito).

A que ação civil a lei está se referindo? Naturalmente, à Ação Civil Pública. Em verdade, não apenas para as situações previstas na lei nº 7.347/85 é que se pode lançar mão da referida Ação, podendo ela ser utilizada em diversas outras situações até porque o inciso IV do art. 1º da lei supra possibilita uma plêiade de ocorrências desencadeadoras, ao dispor: “IV- a qualquer outro interesse difuso ou coletivo”.  Naturalmente, que toda a sociedade tem interesse na preservação da probidade administrativa.

Na esteira deste tema, bem lembra o autor Rodolfo de Camargo Mancuso in Ação Civil Pública, 6ª ed., Ed. RT, 1999, p. 19, citando magistério de outro não menos festejado autor, Hugo Nigro Mazzilli: “A rigor, ação civil pública é a ação não-penal proposta pela Ministério Público”.

Por sua vez, a jurisprudência pátria ecoa, harmoniosamente:

1- “(...) II- O afastamento liminar do agente público de seu cargo, previsto no art. 20, parágrafo único, da Lei 8.429/92, medida restrita aos casos de improbidade administrativa, a serem apurados em ação civil pública, (...)”. (STJ, RHC 8749, Turma 5, DJ 13.09.1999).

2- “Legitimidade ativa, Ministério Público, ajuizamento, Ação Civil Pública, Objetivo, ex-prefeito, reparação de danos, erário, Município, decorrência, Improbidade Administrativa, caracterização, interesse difuso, interesse coletivo, aplicação, norma, Constituição Federal, ampliação, atribuições, Ministério Público. O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento segundo o qual tem o Ministério Público legitimidade para propor ação civil pública, visando ao ressarcimento de danos ao erário municipal”. (RESP nº 119827, Turma 1, DJ 01.07.1999).

3- “Ação Civil Pública. Atos de improbidade administrativa. Defesa do patrimônio público. Legitimação ativa do Ministério Público.  Constituição Federal, arts. 127 e 129, III. Lei 7.347/85 (arts. 1º, IV, 3º, II, e 13).  Lei 8.625/95 (arts. 25 e 26). 1. Dano ao erário municipal afeta o interesse coletivo, legitimando o Ministério Público para promover o inquérito civil e ação civil pública objetivando a defesa do patrimônio público.  A Constituição Federal ( art. 129, III) ampliou a legitimidade ativa do Ministério Público  para propor Ação Civil Pública na defesa de interesses coletivos.” (RESP nº 154128, Turma 1, DJ 18.12.1998).

 

II – Adentrando no mérito.

 

Considerando que o Representante do Parquet pediu a aplicação das penas previstas para improbidade, “no caso concreto aquelas especificadas no inciso III dos art. 12 da lei nº 8.429/92” para o segundo réu, convém que se faça um ligeiro apanhado das disposições desta lei.

Pois bem, nos arts. 9º a 11 da Lei 8.429/92, há a tipificação das condutas que constituem atos de improbidade administrativa.

O art. 9º, nos incisos I a XII encerra as modalidades de improbidade que implicam no enriquecimento ilícito, ou seja, “qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida, em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividades mencionadas no art. 1º desta lei”.

De sabença que, mediante o reconhecimento de qualquer conduta enquadrável no caput bem como nos 12 incisos deste artigo, ainda que isto não se traduza em prejuízo ao erário ou patrimônio (salvo as situações dos incisos III, IV, XI e XII, nos quais o dano material está encerrado), ocorrerá, não obstante, ato de improbidade.

Já no art. 10, da Lei em referência, o caput e os seus 13 incisos tratam dos atos de improbidade administrativa que causam lesão ao erário, mediante ação ilegal ou culposa do agente, sem cogitar de enriquecimento ilícito do responsável pelo ato causador, posto que este tipo já se enquadra no art. 9º, mas sendo típico, aqui, se enseja o enriquecimento indevido de terceira pessoa, física ou jurídica.

Por outro lado, o art. 11 cuida dos atos de improbidade por contrariedade aos princípios administrativos, nele se enquadrando qualquer ato que atente contra os princípios da administração pública, mediante “qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições e notadamente  (...)”. Aí há os incisos elencando comportamentos típicos.

Neste tópico, oportuno transcrever doutrina de Mariano Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio Júnior, autores da excelente obra Improbidade Administrativa, ed. Atlas, pág. 116:

“Deve ser enfatizado que as condutas enumeradas nos sete incisos do art. 12 não autorizam cogitar do elemento subjetivo que as motiva, sendo todas presumidamente dolosas”.

 O art. 11, ora em estudo, segundo se observa da análise da lei e doutrina a respeito, inclusive dos autores supra, funciona como norma de reserva, pronta a ser utilizada se dos atos de improbidade não houver conseqüências atinentes a enriquecimento do agente autor da prática ou lesão ao erário.

Observadas as premissas supra delineadas, oportuno ressaltar que as sanções para os praticantes de tais atos repousam em fundamento constitucional, que é o art. 37, §§ 4º e 5º, XXXV. Sendo que ao longo dos arts. 5º, 6º, 8º e 12, I a III, da Lei 8.429/92, o legislador ordinário, em obediência ao preceptivo constitucional, cuidou de elencar as punições.

 

Ultrapassada essa explanação, analiso, propriamente, o mérito da lide posta em juízo.

Neste momento, insta salientar algumas disposições presentes em preceptivos legais pertinentes ao objeto da demanda.

Com efeito, assim dispõe o art. 72 da lei nº 5.010, de 30.05.66: “É vedada, sob pena de nulidade, a nomeação de cônjuge ou de parente até o segundo grau, consangüíneo ou afim do Juiz Federal, para cargo dos serviços auxiliares da Seção Judiciária em que servir”.

Já o doc. de fl. 83 dos autos comprova que o Sr. Carlos Eduardo Carvalho Moura, sobrinho do Juiz Vladimir  Souza Carvalho, portanto parente em terceiro grau, foi nomeado para o cargo em comissão em 02 de abril de 1993, através de ato assinado pelo Juiz Castro Meira, então Presidente do TRF da 5ª Região. Evidencia-se que, à época, não havia qualquer impedimento legal para a nomeação.

Por sua vez, o art. 10, da lei nº 9.421, de 26 de dezembro de 1996, portanto bem posterior ao ato administrativo, assim dispõe: “No âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo é vedada a nomeação ou designação, para os Cargos em Comissão e para as Funções Comissionadas de que trata o art. 9º, de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, salvo a de servidor ocupante de cargo de provimento efetivo das Carreiras Judiciárias, caso em que a vedação é restrita à nomeação ou designação para servir junto ao magistrado determinante da incompatibilidade

Com efeito, penso que o cerne da questão não passa pela alegação de direito adquirido ou de ato jurídico perfeito, uma vez que não haveria vedação constitucional alguma a que a lei dispusesse retroativamente, em casos como este dos autos, posto que sabido e proclamado pelos Tribunais pátrios, conforme jurisprudências colacionadas pelo próprio autor da exordial, que não existe direito adquirido ao exercício de função comissionada ou de ocupação de cargo em comissão, até porque, uma de suas características é a possiblidade de demissão ad nutum.  Ou seja, tivesse o legislador dito na Lei que, a partir de sua vigência, estaria também proibida a permanência dos ocupantes de cargo em comissão, detentores de grau de parentesco vedado naquele diploma, naturalmente, necessário seria que o servidor fosse exonerado, e inexistiria qualquer eiva de inconstitucionalidade no diploma legal, porque o servidor de cargo em comissão não pode, à luz do disciplinamento jurídico pátrio, argüir qualquer situação jurídica consolidada no tempo, que o ponha a salvo de exoneração, de vez que a sua presença no serviço público ocorre a título precário.

Patente, portanto, não ser o caso de se buscar o abrigo do art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil, o qual dispõe: “A Lei em vigor terá efeito imediato e geral.  Não atingirá entretanto, salvo disposição expressa em contrário, as situações jurídicas definitivas e a execução do ato jurídico perfeito.  Muito menos é de se abrigar a situação no art. 5º XXXVI, da nossa Constituição.

A questão é mais singela: trata-se, na verdade, de ausência de proibição legal para a permanência do servidor no cargo em comissão que ocupa.   Da leitura atenta, minuciosa e cuidadosa do art. 10, da Lei 9.421/96, percebe-se, às escâncaras, que tão somente ficou proibida “a nomeação e a designação para Cargos em Comissão e para  as Funções Gratificadas de que trata o art. 9º, de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados (...)”. (original sem grifo).  E a manutenção? O legislador foi silente,  e, sendo silente, pode o intérprete ampliar as hipóteses?  Obviamente que não, pois é Princípio do Direito, conhecido e consagrado, que as normas limitativas hão de ser interpretadas restritivamente.  Aliás, o dispositivo legal, devido à clareza, objetividade e explicitude com que foi redigido, torna despicienda uma outra interpretação além da literal.  Pretender criar hipótese ali não ventilada é usurpar a função legislativa, o que é vedado em nosso Estado Democrático de Direito.

Parece-me cristalino, portanto, que o art. 10, da Lei nº 9.421/96, em hipótese alguma, proibiu a permanência do servidor no cargo.

Diante de tudo quanto foi ponderado, extingo o processo com julgamento do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC, e rejeito o pedido do autor desta Ação Civil Púlbica.

Sem custas  ou honorários, consoante pensamento pacífico da nossa jurisprudência, considerando que não houve má fé na atuação do Ministério Público.

 
EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA - MINISTÉRIO PÚBLICO.
I - "O
Ministério Público não responde por honorários de advogado, custos e despesas processuais, a não ser em caso de comprovada má-fé" (REsp. 168569-SP/Garcia). II - Precedente do STJ. III - Recurso provido.
(RESP 183089/99. SP. DJ 07-01-1999. Min. Rel. HUMBERTO GOMES DE BARROS, 1ª Turma, STJ)

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

 

Aracaju, 28 de abril de 2000.

 

 

Telma Maria Santos

Juíza Federal Substituta da 3ª Vara