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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Processo nº 99.2462-1 - Classe 2000 - 1ª Vara.

Ação: Mandado de Segurança.

Impte.: Manoel Adroaldo Bispo.

Imptdo.: Delegada Regional do Trabalho e Emprego em Sergipe.

Juiz Federal: Ricardo César Mandarino Barretto.

 

 

Administrativo. Indenização de Transporte revogado. Impossibildade de devolução, face ao efeito "ex nunc" da decisão administrativa que não pode retroagir para atingir situações jurídicas consolidadas. Segurança deferida apenas para impedir os descontos ou determinar restituição dos mesmos, se já efetivados.

 

 

SENTENÇA:

Vistos, etc...

Manoel Adroaldo Bispo, qualificado na inicial de fls. 02, propõe o presente "writ" preventivo, em face da Delegada Regional do Trabalho e Emprego em Sergipe, objetivando que não sejam efetuados quaisquer descontos em seus vencimentos, a título de devolução da Indenização de Transporte paga de forma proporcional, em consonância com a interpretação do art. 1º, caput, c/c § 2º, do art. 2º, todos do Decreto nº 2.703/98.

Alega que é Agente da Inspeção do Trabalho, ocupante do cargo efetivo de Fiscal do Trabalho e, por conta das atribuições do cargo exercido e ainda, por força de lei, é-lhe assegurado o direito a verba denominada de "Indenização de Transportes", quando, no desempenho de suas atividades, utiliza-se de meio próprio de locomoção.

Salienta que, desde a vigência do Decreto acima aludido, passou a perceber a referida indenização subordinada a um critério de proporcionalidade do seu valor total, equivalente a 1/20 (um vinte avos) por dia de deslocamento, tendo, como limite máximo, vinte deslocamentos ao mês, sendo esse o entendimento formulado pelos órgãos de pagamento de todo o serviço público federal, inclusive do próprio Ministério do Trabalho.

Informa o impetrante que a Secretaria de Recursos Humanos, ligada ao Ministério do Orçamento e Gestão, firmou entendimento contrário à autorização para pagamento da indenização proporcional ao número de dias de deslocamento do servidor para execução de serviços externos inerentes ao próprio cargo, com utilização de veículo próprio, só sendo devida a indenização se o mesmo comprovar que executou os serviços externos por, no mínimo, vinte dias, o que gerou, por parte da autoridade impetrada, a determinação de que se procedesse a descontos nos seus vencimentos, a título de devolução do pagamento proporcional da indenização por transporte recebida.

Junta documentos, pede a liminar e, ao final, a concessão da segurança.

Custas pagas, às fls.20

O MM. Juiz reservou-se para apreciar o pedido de liminar após as informações da autoridade coatora.

Intimada, a autoridade coatora presta suas Informações, fls. 76/79, aduzindo que, diante de divergências em relação à interpretação dos artigos do Decreto nº 2.703/98, os departamentos encarregados pelo pagamento dos servidores públicos federais, inclusive o do Ministério do Trabalho, decidiram, ao seu próprio alvedrio, adotar interpretação mais benéfica aos interesses dos seus subordinados, entendendo ser facultado, aos agentes de inspeção, o recebimento da indenização de transporte, na proporção de 1/20(um vinte avos) do valor máximo da mesma, por dia de serviço prestado fora da repartição, com a utilização de meio de locomoção próprio, ainda que o agente não tenha cumprido os vinte dias mínimos para a percepção do mesmo.

Porém, com a edição da Portaria Normativa nº 03, de 03.03.99, proveniente da Secretaria de Recursos Humanos, vinculada ao Ministério do Orçamento e Gestão, dando novo entendimento ao Decreto nº 2.703/98, ficou determinado que a concessão da referida indenização somente é cabível aos servidores que tenham cumprido, pelo menos, 20(vinte) dias de serviço externo, e que o desconto previsto, na proporção de 1/20(um vinte avos) sobre o seu valor global, somente é possível se, nos dias restantes, o servidor tiver faltado injustificadamente ao serviço, não sendo previsto o pagamento proporcional da indenização de transporte.

Daí os descontos nas indenizações, nos meses de agosto, setembro de dezembro de 1998.

Liminar indeferida, às fls. 80.

O MPF pugna pela concessão parcial da segurança, vez que avalizada, inicialmente, a concessão da indenização de transporte proporcional, por ato emanado da própria administração pública, descabendo impor-se ao impetrante a devolução dessa vantagem, quando flagrante a boa-fé, rechaçando, porém, o requerimento de manutenção da mesma nos moldes da primeira interpretação.

 

 

É o relatório.

Tomo, como razão de decidir, os fundamentos expostos pelo MPF, através do seu ilustre representante Dr. Gilson Gama Monteiro, no parecer de fls. 83 a 85, nos seguintes termos:

 

"Irresignado com a "Portaria Normativa nº 3/99-SRH", almeja o Acionante, em resumo alcançar a edição de comando judicial reconhecedor do direito de "não devolver os valores recebidos, de boa-fé, a título de indenização de transporte""(fls. 02/18).

 

 

Indeferida a liminar (fls. 73 e 80) e prestados os informes de praxe (fls. 76/79), convocou-se o Custos Legis para emitir seu pronunciamento de estilo (fls. 80 e v.).

 

Rechace-se, DE PRONTO, o 2º pleito autoral (fls. 18-item 4-2ª parte), avalizando, destarte, as idéias abraçadas pelo Informante, por "ser clara a intenção da Administração Pública de limitar a concessão da indenização aos servidores que tenham cumprido, pelo menos, 20(vinte) dias de serviço externo e que o desconto previsto, na proporção de 1/20 sobre o seu valor global, somente seria cabível caso nos dias restantes o servidor tenha faltado injustificadamente ao serviço, não sendo previsto o pagamento proporcional da referida indenização" (fls. 22/25, 28 e 78/79 – arts. 60, da Lei nº 8.112, de 11/2/90; 1º, "caput", do Decreto nº 2.703, de 03/08/98; e 2º, inc. II, da Portaria Normativa nº 3, de 03/03/99).

 

Na realidade, como jurisprudencialmente assentado, à luz da Legislação anterior,

 

"...o objetivo do legislador, ao instituir a indenização de transporte, foi o de possibilitar ressarcimento por despesas concretas, efetivas, realmente empreendimentos pelo servidor, no cumprimento de suas atribuições e dentro de um PERÍODO de tempo MÍNIMO determinado. Não significa vantagem atribuída a todos os integrantes de determinadas categorias funcionais, mas apenas àqueles que, no pleno exercício de suas funções, gastam numerário para executá-las. Não tendo empreendido, o Autor, os atos imprescindíveis à percepção, mesmo considerando ter sido, a demissão, anulada judicialmente, impedido fica de receber dita indenização..."( AI nº 0419077-PR/2ª Turma/TRF/4ª Região/Rel.: Juiz OSVALDO ALVAREZ/DJU-29.11.89).

 

NO MAIS, à evidência, assiste razão ao Impetrante (arts. 5º, inc. LXIX, da CF; e 1º, "caput", da Lei nº 1.533/51), mesmo porque, "mutatis mutandis", como bem acentuado pelo Juiz Federal VLADIMIR SOUZA CARVALHO, "o pagamento da parcela atinente a periculosidade foi efetuado por ter sido, à época, considerado devido. Se, depois, há mudança de entendimento, não há como considerar o pagamento como indevido, porque não foi fruto de erro matemático, mas de posicionamento anteriormente tido como devido. Neste caso, o servidor não se submete a devolver as parcelas recebidas. Só a vê-las retiradas do seus vencimentos" (Processo nº 99.1943-1).

 

Perceba-se, a propósito, que se concedeu a "indenização de transporte proporcional" ao Autor, "Agente da Inspeção do Trabalho", por força de "interpretação mais benéfica" (aos "seus interesses") erigida pelo próprio Ministério do Trabalho(fls. 78).

 

Em verdade, avalizada a concessão da "indenização de transporte proporcional" por ato (emanado da própria Administração) defensor de determinada tese, descabe impor-se, ao Impetrante, a devolução dessa vantagem com inspiração em nova tese, fruto de exegese diversa, mormente quando flagrante a boa-fé.

 

 

Cumprimente-se, assim, o escorreito escólio propagado por GERALDO ATALIBA (ao tratar da "eficácia do ato administrativo") no sentido de que

 

 

 

"é importante assinalar que eventual futura modificação de orientação, não pode ter efeito retroativo. Ou seja, o fato a que ela(orientação) foi aplicada fica imodificável; aos fatos iguais deve ser aplicada (enquanto não modificada). Todos esses fatos estão rigorosamente amparados pela nossa ordem jurídica"(in Revista de Direito Público/vol. 99/p.16).

 

Aplauda-se, ainda, a lúcida idéia transmitida por LUIZ FABIÃO GUASPE, ao estudar a "nulidade e anulabilidade do ato administrativo e seus efeitos":

 

 

 

"Todas as vezes que ocorrer nulidade de um ato, a declaração de sua ineficácia não desconstitui a relação que porventura se tenha criado pela boa-fé" (in Revista de Direito Público/vol.99/p. 143).

Isto posto, concedo parcialmente a segurança, apenas para assegurar, ao impetrante, o direito de não devolver os valores recebidos a título de indenização de transporte, ficando a autoridade apontada como coatora impedida de efetuar os descontos ou compelida a devolvê-los, se já efetuados. Nessa hipótese, devidamente atualizado e acrescidos de juros de 6% ao ano.

Custas pelo impetrante.

Sem honorários por força da Súmula 512, do STF.

 

P.R.I.

 

Aracaju, 10 de novembro de 1999.191

 

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal - 1ª Vara