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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Processo nº 98.5231-3 - Classe 010000 - 1ª Vara

Ação: Ordinária.

Autor: Marineide Bonfim Bastos.

Réu: Escola Técnica Federal de Sergipe.

Juiz Federal: Dr. Ricardo César Mandarino Barretto.

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Administrativo. Jornalista da Escola Técnica Federal. Direito à jornada de 25 horas semanais, em razão da Portaria 2.561/95, alterada pela 2.343/96, do MARE. Ação procedente em parte.

 

 

 

 

SENTENÇA:

Vistos, etc...

Marineide Bonfim Bastos, qualificada na inicial de fls. 02, propõe, em face da Escola Técnica Federal de Sergipe, a presente ação ordinária, objetivando a redução de sua jornada de trabalho para 25 horas semanais, percepção de horas extras e pagamento da diferença das verbas que indica, em dobro, acrescendo-se juros e correção monetária.

Alega que é servidora pública federal integrante da carreira de jornalista e, como tal, tem direito a uma jornada de 25 horas semanais. Todavia, ao ser adequada a referida jornada de trabalho à sua carreira, ocorreu uma redução em sua remuneração, derivada de um entendimento equivocado em relação ao parecer jurídico que se posicionou favoravelmente à redução da carga horária.

Assevera, por igual modo, que a citada redução fora revogada em janeiro de 1997 e, desde então, vem trabalhando em regime excessivo de horas, sem receber, contudo, a devida compensação financeira.

Enumera acórdãos de Cortes Trabalhistas e junta documentos.

Citada, a ré contesta, sustentando que a redução da remuneração da autora decorreu diretamente da redução de sua carga horária, a qual teria sido ilegal e, por isso, fora revista, uma vez que, de acordo com a Lei 8.112/90, a jornada de trabalho compreende 40 horas semanais.

Afirma que as normas que garantem semelhante jornada de trabalho aos jornalistas só são aplicáveis a casos em que haja relação de emprego, regida pelas normas trabalhistas, o que não se verifica na hipótese, que versa sobre servidor público estatutário.

Salienta que a Portaria MARE/GM nº 2.561/95 estabeleceu, em seu anexo III, quais os cargos pertencentes aos quadros da Administração Pública Federal que teriam jornada de trabalho inferior a 40 horas semanais, não se encontrando ali o cargo de jornalista.

Esclarece que o cargo de Técnico em Comunicação Social, mencionado no referido anexo, não se confunde com o cargo de jornalista, pois aquele primeiro sequer existe em seu quadro de carreiras, ao contrário do segundo.

Diante de tais argumentos, entende que tanto o pedido para a redução da jornada de trabalho, quanto os demais, devem ser rejeitados.

Intimada, a autora manifestou-se sobre a contestação.

É o relatório.

Configurada aqui a hipótese do art. 330, I, do CPC, passo ao julgamento antecipado da lide.

Primeiro ponto que importa destacar é a inaplicabilidade, na hipótese, da legislação trabalhista. Não há falar em contrato de trabalho, não há falar em relação de emprego. Os autos versam sobre uma relação estatutária, de direito público, consubstanciada em uma situação institucional, regida pelas regras de Direito Administrativo. A autora tem "status" de servidora pública. Sob tal prisma, portanto, é que deve ser analisada a sua pretensão.

Assim, a solução do litígio consiste em aferir se o cargo que ocupa a demandante enquadra-se em uma das exceções previstas pela legislação aplicável, que contam com jornada de trabalho diferenciada das 40 horas semanais.

Pois bem. Sustenta a ré, nesse aspecto, que a portaria MARE/GM nº 2.561/95, que regulamentou as referidas exceções, não contemplou o cargo jornalista de autarquia federal, que seria regido pela Lei 7.596/87 e pelo Decreto nº 94.664/87.

Todavia, semelhante argumento parece-me equivocado.

À época da edição da citada portaria, estava ainda em vigor a antiga redação do art. 39 da Constituição Federal, atualmente modificado pela EC-19, de 05.06.98, que então dispunha:

"A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas."

 

Nesse dispositivo constitucional, estava consignado, em caráter específico, o princípio da isonomia para os servidores públicos, no que tange à disciplina legal de sua vinculação à pessoa jurídica de direito público a que servem. Em outras palavras, o regime jurídico único garantia, aos servidores da Administração direta, autarquias e fundações públicas, igualdade de direitos e obrigações perante à respectiva entidade política.

Sendo assim, não vale o argumento de que o cargo de jornalista de autarquia federal, por ser regido por um decreto específico, não teria sido atingido pela citada portaria do MARE. O regime jurídico, como visto, era, necessariamente, o mesmo na época. Assim, se, hipoteticamente, o jornalista, ou o ocupante de cargo equivalente, integrante da administração direta fora alcançado pela portaria, assim também deverá ter sido o jornalista de autarquia federal, sob pena de flagrante inconstitucionalidade. Disso decorrem duas conseqüências: a) não havia necessidade da retrocitada portaria explicitar sua aplicação às autarquias federais; b) se o Decreto 94.664/87 impunha qualquer diferenciação entre o servidor pertencente a uma autarquia e aquele ocupante de cargo paritário ao seu na administração direta, é ele inconstitucional.

No particular, a portaria 2.343/96, ao alterar a 2.561/95, foi explícita ao disciplinar no art. 1º ". . . com a finalidade de incluir a categoria funcional de Técnico em Comunicação Social – Área de Jornalismo, na relação dos cargos cuja carga horária seja inferior a quarenta horas semanais...".

Ora, ninguém tem dúvida de que a portaria abrangeu os jornalistas, tanto que foi específica para os Técnicos em Comunicação Social, a fim de que não houvesse dúvidas em relação a esses. Os jornalistas, na verdade, compõem o núcleo da disposição legal, pois o órgão emissor da portaria fez questão de deixar claro que os Técnicos em Comunicação Social estavam ali incluídos, porque são da área de jornalismo.

Desse modo, difícil é compreender que a portaria alcance aqueles Técnicos, porque são da área de jornalismo, mas tenha deixado de fora os próprios jornalistas. Uma contradição, que o intérprete da norma não pode admitir.

Não se diga que, pelo fato de ter sido retirada a previsão constitucional acerca do regime jurídico único, a diferenciação, nos moldes identificados, seria possível. Se a diferenciação, hipoteticamente instrumentalizada pelo Decreto 94.664/87, foi proibida pela Constituição, mesmo que suprimida, posteriormente, a proibição expressa, o Decreto não volta a ter validade jurídica nesse aspecto, isto é, não ocorre a repristinação da diferenciação. Além disso, há o princípio genérico da igualdade, previsto no art. 5º da CF, o que já seria suficiente para que não se admitisse uma situação como a que sustenta a demandada, confessadamente discriminatória.

Posto isso, creio que deva ser observada, no caso, a aludida portaria, mais especificamente em suas disposições acerca do cargo de Técnico em Comunicação Social.

Como se vê, ao falar sobre o citado cargo, a portaria MARE/GM nº 2.561/95, com sua posterior alteração, esclarece que o mesmo corresponde à "área de Jornalismo, especialidade em redação, revisão e reportagem", remetendo ao Decreto-lei nº 972/69. Nesse ponto, a ré argumenta, asseverando que o mencionado cargo não se confunde com o de Jornalista e, assim, não aproveitaria à autora. Mais uma vez, sem razão, como veremos.

O que define um cargo público é seu conjunto de atribuições. No conjunto de atribuições do cargo de Técnico em Comunicação Social estão descritas atribuições inerentes aos Jornalistas, que, além das ali consignadas, desenvolve outras mais, não se pode negar, principalmente se não há especialização, o que justificaria ainda em maior grau a proteção legal.

Por outro lado, a ré admite que a autora é ocupante de um cargo técnico (fls. 39, primeiro parágrafo) e, se a nomeclatura difere, a razão está no fato de que ele fora nominado pela legislação anterior à Constituição Federal, época em que a paridade não era exigência, por assim dizer.

A remissão da aludida portaria ao Decreto-lei nº 972/69 põe termo a qualquer dúvida que ainda possa persistir, pois regulamenta ele, justamente, o exercício da profissão de jornalista. Com certeza, por tal Decreto-lei não é feita uma menção sequer ao cargo de Técnico em Comunicação Social e, se a lei, abrindo exceções, permitiu buscá-lo para reger, ao menos em parte, no âmbito administrativo, a jornada de trabalho de um cargo público, é intuitivo que, com isso, quis contemplar o cargo de jornalista, ainda que denominado de outra forma.

É verdade que o Decreto-lei 972/69 rege a função de jornalista, com referência àqueles que a desempenham em relação de emprego, mas o seu conceito passa ao âmbito do Direito Público, por força da portaria referida que nada mais fez que regulamentar, entre outras a função de jornalista, valendo-se de elementos de estatuto legal que rege relações de direito privado.

Em suma, se há, no caso, a exigência quanto à unicidade do regime jurídico aplicável aos servidores e a administração, direta ou indireta, se o cargo de jornalista abrange todas as atribuições do cargo de Técnico em Comunicação Social, pelo princípio da isonomia, não há como querer que seja concedida jornada reduzida àquele último e não ao primeiro.

Uma vez merecedora a autora, por força de lei, da jornada especial, não poderia ter sido reduzida a sua remuneração, quando a mesma lhe fora concedida e, se vem trabalhando além das 25 horas semanais, faz jus a horas extras.

Único reparo a se fazer na pretensão autoral diz respeito ao pagamento em dobro das verbas que foram pagas a menor por ocasião da redução de sua carga horária. Essa intenção deriva de uma tentativa equivocada para que se apliquem, na hipótese, normas trabalhistas, as quais, conforme já dito, refogem à matéria, que pertine ao direito administrativo e só podem ser invocadas naquilo em que este último expressamente consente, o que não ocorre no caso. Nesse aspecto, tem razão a ré quando afirma que inexiste amparo legal para a postulação.

Isto posto, julgo procedente, em parte, o pedido, para condenar a ré a conceder à autora a jornada especial de 25 horas, nos termos da portaria MARE/GM nº 2.561/95 c/c a 2.343/96, bem como para pagar-lhe horas extras desde janeiro de 1997, com reflexo em todas as parcelas remuneratórias indicadas na inicial, até a data da efetiva concessão da jornada especial e, ainda, para pagar-lhe, sem dobra pecuniária, as diferenças aludidas no período de outubro a dezembro de 1996, acrescendo-se, em ambos os casos, juros e correção monetária, verificando-se tudo em liquidação.

Condeno a ré ainda em honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor que for apurado.

Sujeita ao reexame necessário.

 

P. R. I.

 

Aracaju, 14 de dezembro de 1999.

 

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal da 1ª Vara