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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Ação Civil Pública. Contratação de empregados de empresa pública sem concurso.mprobidade administrativa caracterizada, porque a empresa pública, conquanto de natureza jurídica de direito privado, compõe a Administração Indireta, sujeitando-se os seus administrados às regras do art. 37, da Constituição. Ação Procedente.

SENTENÇA:

Vistos etc...

O Ministério Público Federal propõe a presente ação civil pública contra Luiz Carlos de Moraes, Sylvio Raimundo Mendonça Seixas e José Carlos Vieira Gonçalves, objetivando sejam os mesmos responsabilizados e condenados a ressarcirem os prejuízos sofridos pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais – CPRM, pela prática de ato de improbidade administrativa, decorrente de contratações, sem concurso público ou licitação, de diversas pessoas, neste Estado, para prestarem serviços à aludida empresa, eis que, à época dos fatos, exerciam cargos de direção e chefia na CPRM.

Historia toda a questão, esclarecendo, em síntese, que as contratações irregulares ocorreram, principalmente, durante o período em que a CPRM desenvolvia o Projeto Canindé, na cidade de Canindé do São Francisco-SE, tendo diversos contratos de trabalho sido declarados nulos pelo TRT da 20ª Região, que encaminhou representação à Procuradoria da República solicitando providências.

Fundamenta seu pedido no malferimento do art. 37, da CF/88, dos arts. 11 e 12, da Lei 8.112/90 e art. 10, IX, XI e XII, e art. 11, da Lei 8.429/90.

Pede a citação da CPRM nos termos do art. 6º, § 3º, da Lei 4.717/65, a intimação da União para dizer do seu interesse no feito, junta documentos (fls. 07 a 95) e requer, ao final, a procedência da ação.

Às fls. 102, a União pede que seja aguardada a manifestação da CPRM para, só então, também se manifestar.

A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-CPRM, opta por contestar o feito, alegando, preliminarmente, falta de interesse de agir, porquanto a Lei 8.197/91, autoriza aos representantes da Administração Direta e Indireta, à efetivação, em litígios, de acordos de até R$ 50.000,00, montante bem inferior aos R$ 10.730,49, que admite ter gasto como consequência de condenações em ações trabalhistas.

No mérito, tece longos comentários acerca da natureza jurídica da CPRM e seus objetivos, reconhece a contratação de diversos prestadores de serviços, e argumenta pela desnecessidade de realização de concurso público para a contratação de mão-de-obra sem especialização, diante de situações excepcionais e urgentes, a exemplo daquelas tratadas nos autos, deduzindo não ser obrigatória a observância do preceito contido no inciso II, do art. 37, da CF/88.

Conclui o raciocínio, entendendo que, por inexistir lei regulamentadora versando sobre contratações nos moldes realizados pelos réus, regulamentação essa exigida diante da nova redação do § 1º, do art. 137, também da Carta Magna, não há como se apontar ilegalidades nos atos ora combatidos, pois os mesmos estavam dentro dos limites da legislação vigente, inocorrendo qualquer tipo de lesão ao erário (fls. 118 a 140).

Vale-se de ensinamentos doutrinários, junta documentos (fls. 141 a 280), e pede a improcedência dos pedidos.

Os réus Luiz Carlos de Moraes, Sylvio Raimundo Mendonça Seixas e José Carlos Vieira Gonçalves, oferecem, em conjunto, contestação às fls. 281 a 303, aduzindo, tanto em preliminar, como no mérito, os mesmos argumentos apresentados pela CPRM.

Com a contestação, os documentos de fls. 307 a 430.

Nas fls. 444 e 445, a União manifesta-se, entendendo não haver interesse a justificar sua presença na lide.

O M.P.F. manifesta-se acerca das contestações e documentos acostados, ratificando a inicial e pugnando pelo julgamento antecipado da lide.

A Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais-CPRM, às fls. 452, requer a produção das provas que especifica.

 

É o relatório.

 

Pelas provas documentais produzidas, não há necessidade de prova testemunhal como requereu a ré. O fato, reconheço, deve-se, entretanto, a um despacho equivocado meu, que instou as partes a indicarem as provas a produzir, sem necessidade. Penitencio-me pelo equívoco e passo ao julgamento antecipado.

A questão fática é tranqui-la, os documentos anexados comprovam e os réus confirmam que, de fato, contrataram sem concurso público Avilano Gomes dos Santos, como trabalhador braçal, Josefa de Araújo França, cozinheira, Antônio Carlos dos Reis, topógrafo, e José Rodrigues Neto, como motorista.

Os contratados reclamaram perante a Justiça do Trabalho e esta declarou a nulidade dos contratos, pela inobservância da regra do art. 37, da Constituição.

O que é inusitado é que a ré, Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, ao contestar as reclamações trabalhistas, ratifica os atos praticados pelos réus, e, ela mesma, vale-se da própria torpeza, ao invocar a nulidade dos contratos, para se livrar do pagamento dos direitos trabalhistas. Tudo isso é fruto do cinismo, que é quase uma regra de conduta de grande parte dos administradores públicos do nosso País. Sabem o que podem e o que não podem fazer, mas desprezam a Constituição, como se ela não existisse.

No caso, a simples leitura do "caput", do art. 37, da Constituição, deixa claro que a Administração Indireta também acha-se sujeita às regras ali estabelecidas, norteando-se pelos princípios da legalidade, moralidade e publicidade.

Se o princípio da moralidade comporta interpretação, em consonância com o senso ético comum, os princípios da legalidade e publicidade foram arranhados de forma despudorada, a começar pela própria Constituição, que teve ofendido o inciso II, do art. 37, que traz a exigência de concurso público.

O fato da CPRM ser uma empresa pública, com natureza jurídica de empresa privada e sujeita a obrigações trabalhistas, tal como define o art. 137, § 1º, da Constituição, não afasta a exigência do concurso, porque esta não é só para os cargos efetivos sujeitos ao regime jurídico único. O concurso também é exigido para empregados regidos pela CLT, porque as empresas públicas, repita-se, conquanto de direito privado, são órgãos da Administração Indireta, subordinando-se, portanto, às regras do art. 37, da CF/88.

A alegação dos réus de que se valeram da Lei nº 8.745/93, que dispõe sobre a contratação temporária e excepcional, em consonância com a regra do inciso IX, do art. 37, da CF, também não procede.

É que a lei citada define quais as hipóteses de necessidade temporária de excepcional interesse público, no art. 2º, dele constando: "I – assistência a situações de calamidade pública; II – combater os surtos endêmicos; III – realização de recenceamentos; IV – admissão de professor substituto e visitante; V – admissão de professor e pesquisador visitante estrangeiro; e VI – atividades especiais nas organizações das Forças Armadas para atender a área industrial ou a encargos temporários de obras e serviços de engenharia."

Nenhuma das atividades elencadas abrange as de trabalhador braçal, cozinheira, topógrafo ou motorista.

Ainda que fosse o caso, com relação ao topógrafo, como pretendem os réus, o ato de contratação haveria que ser motivado e publicizado, em face das exigências dos §§ 1º e 2º, do art. 3º, da Lei nº 8.745/93.

A forma de proceder dos réus caracteriza a improbidade administrativa, com as consequências do § 4º, do art. 37, da Constituição e do art. 12, da Lei nº 8.429/92, pela prática dos atos previstos nos incisos IX e XI, do art. 10, consistentes na prática de autorização de despesas não realizadas por lei ou regulamento e na liberação de verba pública sem estrita observância de normas pertinentes. Entretanto, com base no parágrafo único, do art. 12, da Lei 8.429/92, deixo de aplicar as penas elencadas nas disposições retro citadas, porque os réus não obtiveram vantagem econômica com as contratações irregulares, sendo bastante o ressarcimento.

Isto posto, julgo totalmente procedente a ação para condenar os réus Luiz Carlos de Moraes, Sylvio Raimundo Mendonça Seixas e José Carlos Vieira Gonçalves, a ressarcirem, integralmente, os prejuízos sofridos pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, em razão das contratações referidas, tudo a ser apurado em liquidação (§ 4º, do art. 37, da Constituição).

Custas pelos réus.

 

Aracaju, 19 de abril de 1999.

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal - 1ª Vara