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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Processo n.º 2000.85.499-0 - classe 2000 - 1ª Vara

Ação: Mandado de Segurança

Impte: Gileno Chagas Fontes e Outros

Imptdo: Diretora Regional da Empresa de Correios e Telégrafos

Juiz Federal: Ricardo César Mandarino Barretto

 

Administrativo. Desconto de parcelas salariais pagas a maior, por força de enquadramento errôneo da administração. Legalidade da revisão do enquadramento e impossibilidade do desconto de parcelas pretéritas, uma vez verificada a boa-fé dos servidores. Segurança concedida em parte.

 

 

SENTENÇA:

Vistos, etc...

Gileno Chagas Fontes e Outros, qualificados na inicial de fls. 02, impetram o presente "writ", com pedido de liminar, contra ato da Diretora Regional da Empresa de Correios e Telégrafos, objetivando seja determinado à autoridade coatora, que não proceda nenhum desconto nos proventos do impetrantes, oriundos de devolução de salário por reenquadramento funcional, bem como sejam mantidos nas referências em que se aposentaram.

Alegam que por conta da revisão efetuada por aquele órgão em suas tabelas salariais, foram reenquadrados em níveis de referência diferentes daqueles em que se aposentaram, advindo daí, um pagamento a maior em seus proventos, cuja devolução dar-se-ia a partir do mês de fevereiro de 2000, nos moldes em que citam na inicial.

Sustentam a legalidade e a boa-fé dos pagamentos recebidos, pois não foram eles quem elaboraram as tabelas, aduzindo, também, a inconstitucionalidade dos atos praticados, eis que efetuados à sua revelia, sem que lhes fosse oportunizado o direito de defesa.

Tecem comentários doutrinários e jurisprudenciais para fundamentarem seu direito.

Pedem a liminar e, ao final, a concessão da segurança.

Nas fls. 82, a MM. Juíza Telma Maria Santos concedeu a liminar, somente para que a autoridade coatora se abstivesse de efetuar qualquer desconto nos proventos dos impetrantes, a título de devolução por quantias recebidas a maior.

Notificada, a autoridade coatora argüi, em preliminar, a inadequação da via eleita, tendo em vista que o ato de reenquadramento não se trata de ato de autoridade, já que não está diretamente ligado aos serviços públicos de coleta, transporte e correspondência, esta sim, a atividade pública exercida pelos Correios. Aduz, ainda, a satisfatividade da medida liminar.

No mérito, rechaça as alegações da inicial, afirmando que todo o reenquadramento dos níveis de referência salarial ocorreu dentro dos ditames legais, não havendo abusividade por parte da Direção dos Correios na efetivação das medidas, eis que os impetrantes foram previamente notificados acerca da conclusão da auditoria, que entendeu haver incorreções nos pagamentos dos proventos, sendo-lhe, ainda, concedido o prazo de 30 dias para manifestarem a discordância.

Junta documentos e pede a denegação da segurança.

Os impetrantes manifestaram-se sobre os documentos acostados pela autoridade apontada como coatora.

Em seu parecer, o MPF opina pela indeferimento das preliminares e, no mérito, pela concessão da segurança.

É o relatório.

Sustenta a autoridade coatora, a alegação de inadequação da via eleita, por entender que o ato de reenquadramento dos impetrantes, refoge ao alcance na norma prevista no inciso LXIX, do art. 5º, da Constituição Federal, não sendo atacável, portanto, por via de mandamus.

A tese suscitada pela autoridade, não merece acolhida. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, empresa pública de prestação de serviços, integra a chamada administração indireta, sujeita, portanto, aos princípios insculpidos no art. 37, da Constituição.

Conforme se vê, ainda, do disposto no mesmo art. 37 e do disposto no 173, § 1º, e seus incisos, as empresas públicas são criadas por lei específica, ficando sujeitas, assim, à obediência fiel daquilo que dispuser a sua lei de criação, revelando-se, assim, o caráter público de que se revestem aos atos praticados pelos administradores, agentes públicos, portanto, no exercício de sua função.

É verdade que a Emenda 19, conferiu maior liberdade aos administradores públicos, que, entretanto, não podem distanciar-se da legalidade que rege os seus atos.

Logo, o reenquadramento efetuado pela Diretora dos Correios, que reposicionou os impetrantes em níveis de referência nas tabelas salariais diferentes daqueles em que se aposentaram, tem a característica de ato de agente público, corrigível por meio de mandado de segurança.

Rejeito a preliminar.

A preliminar de satisfatividade da medida liminar, não fosse a obrigação de análise, não deveria ser apreciada.

O mandado de segurança é uma ação autônoma, cuja sentença tem eficácia própria, não estando adstrita à existência de nenhuma outra ação.

Se o Juiz, ao receber a inicial, entendendo presentes os requisitos de sua concessão, convence-se, ainda, da existência dos requisitos da fumaça do bom direito e do perigo da demora, a lei n.º 1.533/51 permite-lhe conceder, liminarmente, a própria pretensão deduzida em juízo. Ora, se pode conceder a própria pretensão requerida, é lógico que se trata de medida satisfativa, pois corresponde ao próprio pedido autoral.

Ademais, toda liminar tem conteúdo satisfativo, importando apenas saber se a situação jurídica decorrente de sua concessão, tornar-se-á ou não irreversível. Essa é a única consequência nefasta da satisfatividade, que, no caso, inocorreu.

Rejeito, igualmente, a preliminar.

No mérito, pretendem os autores obter um provimento jurisdicional que lhes assegure o direito de não devolverem os valores relativos aos proventos de aposentadoria que, equivocadamente, vinham sendo pagos a maior, desde 1992. Pretendem, ainda, a manutenção das referências salariais nas quais foram efetivadas as suas aposentadorias. Vê-se, portanto, que duas são as questões a decidir.

Os impetrantes, ex-empregados dos Correios, foram aposentados levando-se em conta as tabelas salariais implantadas pela lei n.º 8.529/92, que, posteriormente, a par das diversas solicitações de revisão do enquadramento, revelou o equívoco do referido posicionamento, como parâmetro para cálculo dos valores dos proventos.

No caso dos autos, o posicionamento equivocado, levou ao pagamento de proventos em valores maiores que os efetivamente devidos.

A questão, então é: Sobre esses pagamentos a maior, concorreram os impetrantes? A resposta que se obtém é não. Pode até ser que, eventualmente, num caso qualquer ou diante da posição que ocupava dentro dos quadros funcionais da empresa, um ou algum deles, ciente da nova situação que se vislumbrava com o enquadramento previsto na lei n.º 8.529/92, omitiu, alterou informações para se beneficiar. Mas, dentro do que extrai dos autos, nada disso ocorreu. Todos eles, ao se aposentarem, foram enquadrados pela critérios adotados pela empresa, sem que tivessem concorrido para isso.

Tanto isto é verdade, que o reenquadramento ocorreu por conta das diversas revisões solicitadas pelos administrados, inconformados com o posicionamento que lhes fora conferido pela empresa, ao se aposentarem. Isto revele que não sabiam que estavam num nível acima daquele que, efetivamente, deveriam estar.

Na situação aqui tratada, a boa-fé dos impetrantes se presume, só sendo elidida por uma prova em contrário. No caso, o ônus é da administração, pois, diante da presunção de veracidade dos atos administrativos, os proventos eram pagos de acordo com os níveis que ela, anteriormente, conferira aos seus empregados.

Como a boa-fé dos impretrantes não foi elidida, a responsabilidade pelo pagamento a maior não lhes pode ser imputada, não sendo, portanto, de sua alçada, a obrigação de devolver aquilo que receberam a mais.

A Jurisprudência pátria, notadamente os Tribunais Regionais Federais, adotam idêntica posição. Vejamos.

 

Ementa: ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. MAGISTERIO PUBLICO SUPERIOR. PROFESSOR ADJUNTO. EXIGENCIA DE CONCURSO PUBLICO PARA PROFESSOR TITULAR. DEVOLUÇÃO DE DIFERENÇAS DE VENCIMENTOS.

1 - Prevendo a legislação ordinária, como prevê, a exigência de concurso para se galgar a honrosa titularidade de certa cadeira, no magistério público, e imprescindível o cumprimento de tal exigência, para tanto. CF/88, art. 37, I e II e CF/67, art. 176, §3º., VI.

2 - Quanto as diferenças de remunerações, não e justo nem jurídico que se imponha aos apelados a obrigação de restitui-las, uma vez que houve boa-fé na sua percepção, tratando-se, inclusive de verba de cunho nitidamente alimentar, e, ainda, pressupondo-se que a contraprestação funcional, no período, o foi na condição e no desempenho de atribuições próprias da titularidade.

 

(Acórdão na AMS n.º 0219445-7/RJ/TRF – 2ª Região/3ª Turma/Relator: JUIZ ARNALDO LIMA/14-04-98/DJ: 06-08-98 PG:000156).

 

Ementa: TRABALHISTA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. MODIFICAÇÃO DE CRITERIO. DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS RECEBIDAS POR ERRO IMPUTAVEL AO ADMINISTRADOR.

1. Incidência da Súmula-187 do extinto Tribunal Federal de Recursos.

2. Não há direito adquirido a pagamento erroneamente feito. A administração tem o dever de ajustar a situação ao comando legal.

3. Valores recebidos de boa-fé pelo servidor não serão devolvidos.

4. Recursos ordinários improvidos.

 

(Acórdão no RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA n.º 0414171-5-RS/TRF 4ª Região/3ª Turma/Relator: JUIZ FABIO B. DA ROSA/02-06-92/DJ: 05-08-92 PG:022767).

 

Ementa: RECLAMATORIA TRABALHISTA. ALTERAÇÃO DA BASE DE CALCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. SERVIÇO PUBLICO. POSSIBILIDADE. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FE.

1. Inexiste direito adquirido a percepção de adicional de insalubridade calculado sobre o salário contratual, podendo a administração, a qualquer tempo, corrigir a distorção, acertadamente fazendo-o incidir sobre o salário mínimo. Prevalência, na espécie, do interesse publico sobre o particular.

2. Os valores percebidos a tal titulo, que se presumem recebidos de boa-fé, entretanto não serão objeto de restituição.

3. Recurso parcialmente provido.

 

(Acórdão no RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA n.º 0405552-7-RS/TRF 4ª Região/1ª Turma/Relator: JUIZ RONALDO PONZI/12-09-1995/DJ: 20-12-95 PG:088845).

Ementa: ADMINISTRATIVO. CONVERSÃO DO TERÇO DE FERIAS EM ABONO PECUNIARIO. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO DO TCU. RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A MAGISTRADOS. IMPORTANCIAS DE BOA-FE. DESNECESSIDADE.

1- Este tribunal, modificando anterior entendimento, passou a não mais reconhecer aos magistrados o direito a conversão de 1/3 de ferias em abono pecuniário.

2- Decisão do tribunal de contas da união que se acolhe, para tornar sem efeito os atos anteriores que converteram em abono pecuniário o terço de ferias dos magistrados.

3- Entretanto, em homenagem ao princípio da presunção de legitimidade que acompanha os atos praticados pelo administrador público e a doutrina da aparência e considerando que as importâncias recebidas a aquele titulo o foram de boa-fé, correspondendo a serviços efetivamente prestados, porquanto os magistrados trabalharam no período de ferias convertidos em pecúnia, dispensa-os de devolução.

(Acórdão no PROCESSO ADMINISTRATIVO n.º 03039584-4-SP/TRF 3ª Região - Pleno/ Relator: JUIZ JOSE KALLAS/25-05-1995/DJ: 30-04-96 PG:027735).

 

A outra questão, prende-se ao desejo dos autores de continuarem recebendo seus proventos de acordo com as tabelas em que foram aposentados, alegando, para tanto, a existência do direito adquirido.

Neste particular, a pretensão não merece acolhida. É lícito à Administração rever seus próprios atos, modificando-os, tudo isto, obviamente, visando, sempre, a obediência aos princípios estatuídos pela Constituição.

Assim, se o enquadramento foi equivocado, nada mais lógico que proceder-se a sua adequação, para que refletisse a verdadeira situação em que deveria ter ocorrido a aposentadoria.

Se a lei estabeleceu critérios, estes devem ser fielmente observados, sob pena de responsabilidade do administrador no gerenciamento da coisa pública.

Assim, não se pode alegar a existência de direito adquirido, pois não se adquire aquilo que nasceu em dissonância com a lei, ou, em outras palavras, não pode haver direito adquirido onde este sequer existiu.

Isto posto, concedo em parte a segurança, somente para determinar que a autoridade coatora abstenha-se de efetivar qualquer desconto, a título de devolução por quantias recebidas a maior, decorrentes de errôneo enquadramento dos impetrantes nas tabelas estabelecidas pela lei n.º 8.529/92, quando de suas aposentadorias, até a notificação referente à conclusão da auditoria que constatou os equívocos.

Sem honorários por força da Súmula 512, do STF.

Sentença sujeita ao reexame necessário.

P.R.I.C.

 

Aracaju, 10 de agosto de 2000.

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal - 1ª Vara