small_brasao.jpg (4785 bytes)
PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

wpe20.jpg (2542 bytes)

   bt-administrativo.jpg (3094 bytes)

Proc. JF/SS. Nº 96.0000349-1 - Classe X - 3ª Vara.

Ação : "Sumária".

Partes: ... Decide Empreendimentos Ltda.

... Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA.

 

 

E M E N T A: AMBIENTAL. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. CONSTRUÇÃO. CERCA. Atividades. obras, planos e projetos a serem instalados na faixa de preservação permanente devem ter prévio licenciamento. Os regulamentos administrativos podem estabelecer restrições no que apraza ao proprietário em seu direito de construir. Improcedência do pedido.

S E N T E N Ç A.

I - RELATÓRIO.

1.1 - Suma do(s) Pedido(s).

1.1.1 - Ação Sumária.

O requerente adquiriu uma área de terra com 3.025 m2 da empresa Decide Imobiliária, a qual, por sua vez o adquirira de Roberto Rezende Machado, tudo conforme escritura, devidamente registrada. O terreno não é de marinha e é composto de 90% de área verde e 10% de dunas, sendo, pois, a maior parte útil para construção, sem qualquer prejuízo ao meio ambiente.

Em setembro/95, o requerente foi visitado por fiscais do IBAMA, que lhe autuaram e embargaram os serviços, sob a alegação de que estavam causando alterações nas características da zona costeira.

Os serviços embargados, entretanto, constituíam-se tão-somente da colocação de postes, visando à demarcação do imóvel bem como a impedir a invasão por parte de terceiros. Além do embargo, os fiscais entenderam de apreender materiais ali encontrados.

A própria norma mencionada pelo requerido refere-se ao embargo da obra, mas não permite a apreensão de materiais, a qual ocorrera de forma abusiva.

Enfatiza que outros terrenos circunvizinhos encontram-se cercados, sem qualquer óbice imposto pela requerida.

Requer, pois, a anulação do auto de infração aplicado e dos embargos aos serviços, cominando-se ao suplicado custas e honorários.

 

 

 

1.2 - Suma da(s) Resposta(s).

Houve embargo da obra, por estar sendo realizada em área de preservação ambiental, de que trata a Lei 4.771/65. Destaca Resoluções do CONAMA, das quais transcreve vários trechos.

Além disso, sem o prévio licenciamento, o requerente estava a construir uma cerca que impediria o livre acesso do povo à praia: o interesse coletivo deve sobrepujar o interesse particular.

Requer a improcedência da ação, cominando-se ao autor custas e honorários.

 

 

1.3 - Registro das Principais Ocorrências.

Com a vestibular vieram documentos.

Custas iniciais honradas.

Realizada audiência de instrução, em que foram ouvidas testemunhas, e deferida a perícia.

A contestação veio acompanhada de documentos.

Realizada inspeção judicial.

Apresentado laudo pericial.

A requerente apresentou suas últimas alegações em forma de memoriais

 

 

 

II - FUNDAMENTAÇÃO.

2.1 - Questões de Fato.

A matéria fática é preponderante. Entretanto, o assunto tem tal pertinência com o mérito, que juntamente com este passa a ser examinado.

 

 

 

2.2 - Questões de Direito.

2.2.1 - Preliminares.

As partes não invocaram preliminares.

 

 

 

2.2.2 - Mérito.

De fato, pretende a autora uma proteção contra um embargo administrativo de obra - uma cerca - obstando-lhe a construção. Ao lado disto, quer a anulação do auto de infração.

O processo mereceu, além da perícia realizada por profissional da área de proteção ao meio ambiente, a inspeção judicial feita in loco. À primeira vista, após verificar a área, pareceu-me não haver dunas na área demarcada, mas tão somente pequena área de vegetação fixadora de uma duna situada no terreno limítrofe.

AD PRIMUM, ao estudo do relatório pericial, deparamo-nos com as seguintes informações:

A área da DECIDE encontra-se inserida naquela caracterizada nos 300 metros da preamar máxima, de domínio (gerenciamento do IBAMA), nos termos da Lei Federal, mesmo não apresentando elevações que possam ser caracterizadas como elevações dunares. O que se observa (...) é uma elevação que não ultrapassa 2 metros de altura e que se caracteriza como sendo o "espraiamento ou base" de uma duna inserida na área circunvizinha e limítrofe;

A vegetação característica da área é basicamente do tipo gramíneas e fixadora de dunas, principalmente na área aqui denominada - "espraiamento ou base da duna".

(...) a duna a que me refiro (localiza-se no terreno vizinho ao da inspeção), apresenta altura e características fitogeográficas que garantem a sua importância ecofisiológica e ecofisiográfica dentro do contexto da Zona Costeira do Brasil e conseqüentemente da Zona Costeira de Sergipe.

Oportunamente, valho-me da significação do vocábulo base, consignada no dicionário:

Base: tudo quanto serve de fundamento, apoio ou sustentáculo(...). Parte inferior onde alguma coisa repousa ou se apóia.

Ora, cerca de 10% da área objeto do litígio constitui a base de uma elevação dunar. Ainda que esta duna esteja em terreno vizinho, encontra-se protegida pela legislação e seu apoio, sustentáculo mesmo, situa-se na área da requerente a quem, por força de dispositivo constitucional, incumbe a responsabilidade de preservação do meio ambiente, ainda que se trate de área com aparente insignificância. Aliás, a autora declara-se ciente dessa responsabilidade ao afirmar:

"(...) Qualquer uso futuro, caso venha a ser feito, será com prévio conhecimento e sob licença da prefeitura Municipal de Aracaju e do IBAMA."

Parece-me resolvida a demanda, pois, quanto à necessidade de licenciamento prévio para construir naquela área, a qual, por encontrar-se em zona costeira, situada a 300 metros da preamar, caracteriza-se como de preservação ambiental. Como órgão executor do SISNAMA, compete ao IBAMA executar e fazer executar a política e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.

AD SECUNDUM, vejamos o cerne da matéria que ensejou o auto de infração:

DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO: alterando as características naturais da zona costeira (loteamento), sem prévio licenciamento ou em desacordo com o mesmo, no loteamento Aruana, lote 01, medindo 3.025 m², em área de preservação permanente nas restingas em faixa mínima de 300 metros a contar da linha de preamar máxima. Obs: Cercando com poste de cimento e arame farpado.

Resta, agora, perquirir sobre se, neste caso, o IBAMA poderia exercer a incursão fiscalizatória, e aplicação de embargo e de sanção pecuniária.

Observe-se que a proteção ao meio ambiente merece um especial desvelo no ordenamento jurídico. A fonte constitucional está pervadida de menções sobre o assunto.

Só como exemplo, temos o §3º, do art. 225, onde há chamada à responsabilidade, a todas as pessoas, físicas ou jurídicas, sem quaisquer distinções para as da administração pública ou para o particular. UBI LEX NON DISTIGUIT, NEC INTERPRETES DISTINGUERE POTEST.

A Resolução nº 004/85 c/c a Resolução nº 004/1993 estabelece que atividades, obras, planos e projetos a serem instalados na faixa de preservação permanente devem ter prévio licenciamento. E isso, como já explicitado anteriormente, a própria requerente admite.

A requerente, todavia, argumenta que a cerca tão-somente demarcaria o seu imóvel, evitando assim maiores danos, inclusive à própria vegetação fixadora de duna ali existente.

Cercar, portanto, não caracterizaria a construção, nem a instalação de que trata o art. 6º da Lei 7.661/88.

Melindrosa a questão. Por isso, recorro à lição doutrinária do mestre HELLY LOPES MEIRELLES :

(...) tanto é construção a edificação ou a reforma, como a demolição, o muramento, a escavação, o aterro, a pintura e demais trabalhos destinados a beneficiar, tapar, desobstruir, conservar ou embelezar o prédio.

A instalação de estacas de concreto, inclusive chumbadas, a atividade de demarcar a área com postes e arame farpado é instalação, é construção - de cerca. Parece-me que este entendimento firmou-se:

O juiz da respectiva Vara, ao suspender a construção das cercas... (grifei).

Com isto, entende-se a elevação de cerca como ato de construir. E porque não houve o prévio licenciamento, a construção deve ser embargada, a infração deve ser autuada. Rechaçada qualquer atitude abusiva do poder público, o IBAMA estava no exercício de suas funções.

Antoja-me que a possibilidade de construir existe, mas não ao livre talante de qualquer pessoa física, ou jurídica, de direito público ou privado. Mas sim, com a observância das condições impostas pelo ordenamento.

Quanto ao aspecto divergente sobre a existência de restinga fixadora de dunas, ou ainda da existência de semi-dunas no imóvel, não altera o resultado desta lide, uma vez que o pedido centra-se apenas na anulação do auto de infração e dos embargos.

 

 

 

2.3 - Sucumbência.

2.3.1 - Honorários Advocatícios.

Por força de dispositivo dos arts. 20ss, do Estatuto Civil de Ritos, a parte contra quem o resultado do conteúdo sentencial for desfavorável deve arcar com o encargo da verba honorária. Até mesmo, se vem plasmando o entendimento que tal cominação prescinde de qualquer menção no pedido inicial. Opera-se OPE LEGIS.

A alíquota arbitrada deve incidir, em princípio, e salvo disposição diferente, expressamente manifestada na sentença, sobre o valor total da condenação, por força do art. 20, § 3º, do CPC.

 

 

 

2.3.2 - Despesas Processuais.

No que concerne ao aspecto das custas, incide o princípio geral de que a parte sucumbente arca com o ônus.

No entretanto, temos na lembrança a isenção prevista no art. 4º, e incisos, da Lei 9.289/96, mas que onera as pessoas lá mencionadas, quanto ao reembolso do que foi adiantado pelo vencedor. É a previsão do parágrafo único, do art. 4º, do mesmo diploma legal.

 

 

III - DISPOSIÇÃO.

Como Órgão do Judiciário, Poder da União emanado do povo:

Rejeitado o Pedido.

 

Extingo o processo com julgamento do mérito, e rejeito o pedido da parte ativa.

Honorários pelo demandante em 10% sobre o valor da causa, com atualização a partir do ajuizamento.

Custas pelo demandante.

Desapense-se do processo 96.349-1, para onde deve ser trasladada cópia desta sentença.

 

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

 

Aracaju, 31 de maio de 2000.

 

 

 

Carlos Rebêlo Júnior

Juiz Federal - 3ª Vara.