Processo nº 2003.85.00.004862-2 – Classe 12000 – 2ª Vara
Ação Cautelar
Partes: ... Carlos Alberto Gonçalves Oliveira Lins
... Caixa Econômica Federal – CEF
EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. AFIRMAÇÃO DO REQUERIDO NO SENTIDO DE QUE NÃO POSSUI O DOCUMENTO RECLAMADO. ÔNUS DO REQUERENTE QUANTO À PROVA DA NÃO VERACIDADE DA ALEGAÇÃO. ART. 357 DO CPC.
I – O art. 357 do CPC dispõe que se o requerido afirmar que não possui o documento ou a coisa, o juiz permitirá que o requerente prove, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade.
II – Constitui, pois, ônus do requerente demonstrar em juízo que a recusa do requerido é inconsistente. Não o fazendo, o pleito de exibição deve ser julgado improcedente, tendo em vista a ausência de prova de que o documento efetivamente existe e a parte se recusa a exibi-lo em juízo.
S E N T E N Ç A:
(Relatório)
Carlos Alberto Gonçalves Oliveira Lins promove a presente ação de exibição de documentos em face da Caixa Econômica Federal – CEF, alegando que financiou, através de um contrato por instrumento particular de compra e venda de fração ideal com sub-rogação de dívida hipotecária e retificação de cláusulas, a compra de um imóvel, segundo as normas do sistema financeiro da Habitação. Aduz que, em razão de dificuldades financeiras, deixou de honrar os compromissos assumidos, motivo pelo qual o referido imóvel foi vendido extrajudicialmente pela requerida. Afirma que, diante disso, (...) requereu, junto à empresa, cópia do processo de execução administrativo de nº 114, conforme protocolo de requerimento em anexo. A empresa enviou a documentação incompleta, faltando às fls. 49 a 58, referentes a avaliação do imóvel em questão. Requer, assim, a exibição dos documentos em juízo, no prazo de cinco dias, na forma dos arts. 355 a 363 do CPC.
A demandada, em contestação, alega, em síntese, que tais documentos inexistem, uma vez que teria havido mero equívoco na numeração das folhas do processo administrativo, acrescentando, ademais, que não se encontram presentes os requisitos necessários ao deferimento do provimento cautelar requerido.
Réplica às fls. 75/76.
(Fundamentação)
1. Do julgamento antecipado da lide:
No caso dos presentes autos, as partes, intimadas quanto à necessidade de produção de outras provas, além das que já constam dos autos, restaram silentes.
Assim, há de se julgar antecipadamente a lide, na conformidade dos fundamentos abaixo delineados, com fulcro no art. 330, inciso I do CPC.
2. Mérito:
A questão controvertida neste feito refere-se à exibição de documentos, supostamente existentes no bojo do procedimento administrativo de nº 114, que diz respeito à execução extrajudicial de um imóvel pertencente ao autor.
O requerente alega que faltam os documentos pertinentes às fls. 49 a 58 dos referidos autos, requerendo a sua exibição em juízo, invocando, ademais, as disposições constantes nos arts. 355 a 363 do CPC.
A requerida, em sua contestação, aduz que tais documentos inexistem, argumentando que o lapso existente na numeração das folhas do procedimento administrativo citado decorre de mero equívoco material.
Trata-se o caso de processo cautelar de exibição de documentos que se traduz em procedimento autônomo, inteiramente satisfativo, eis que se esgota na simples apresentação dos documentos requeridos, podendo, se assim o quiser a parte autora, utilizá-los em ação a ser ajuizada depois. De sua parte, o art. 845 do CPC afirma que observar-se-á, quanto ao procedimento, no que couber, o disposto nos arts. 355 a 363, e 381 a 382.
O art. 357 do CPC assim dispõe:
Art. 357. O requerido dará a sua resposta nos cinco (5) dais subseqüentes à sua intimação. Se afirmar que não possui o documento ou a coisa, o juiz permitirá que o requerente prove, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade.
Ora, no caso, após a contestação da CEF, na qual argumenta a inexistência dos documentos que supostamente estariam colacionados às fls. 49 a 58 do procedimento administrativo de execução extrajudicial do imóvel, a parte autora manifestou-se em réplica, limitando-se a repetir que os tais documentos existem, sem fazer qualquer prova do alegado. Não obstante isso, à fl. 78, determinei que ambas as partes especificassem as provas que ainda teriam de produzir, restando silentes quanto à providência reclamada, em conformidade com a certidão de fl. 79.
Sem embargo, constitui ônus do requerente, ante a alegação de inexistência da documentação, fazer prova de que tal afirmação não condiz com a verdade. Não o fez, muito embora tenha sido dada a oportunidade para tal. Importante ressaltar que o caso não se enquadra nas hipóteses constantes do art. 358 do CPC.
Dessa forma, inexiste prova cabal de que os documentos existem e a requerida se nega a exibi-los. Aliás, a jurisprudência vem entendendo que, se a documentação é inexistente, a conseqüência é a extinção do processo por perda de seu objeto. Nesse sentido, é o seguinte julgado:
PROCESSO CIVIL. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
SE A PARTE PEDE A EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO QUE NÃO EXISTE, A ELUCIDAÇÃO DESSE FATO IMPLICA NA EXTINÇÃO DO PROCESSO POR FALTA DE OBJETO, SEM QUE SE POSSA IMPUTAR AO RÉU O PAGAMENTO DE DESPESAS PROCESSUAIS E DE HONORÁRIOS DE ADVOGADO. APELAÇÃO PROVIDA.
(Origem: TRIBUNAL QUARTA REGIÃO, Classe: AC – APELAÇÃO CÍVEL Processo: 9204017457 UF: RS, Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA, REL JUIZ ARI PARGENDLER, Data da decisão: 26/03/1992, Documento: TRF400005799, DJ DATA: 15/04/1992, PÁGINA: 9490).
No que toca a este feito, há de se frisar que não houve a elucidação do fato – se o documento existe ou não –, tendo em vista que a parte a quem incumbia tal prova deixou de fazê-la no tempo oportuno.
O caso é de improcedência do pedido.
De outra parte, mesmo abstraindo a fundamentação exposta acima, vê-se que é crível a afirmação da requerida de que teria ocorrido mero equívoco na numeração dos autos do procedimento. É que, pelo que se deduz da seqüência da documentação, vê-se que a fl. 48 corresponde à capa da carta de arrematação, cujo conteúdo respectivo vem logo a seguir, na folha que recebeu a numeração 59, quando deveria ser 49. Não há qualquer descompasso nas informações que deveriam constar do processado, do que se pode inferir o mero equívoco material.
3. Das verbas sucumbenciais:
Neste feito, a parte autora teve deferido o benefício da justiça gratuita, conforme decisão irrecorrida de fl. 67.
É sabido que a Lei n. 1.060/50, em seus arts. 11 e 12, assim dispõe:
Art. 11. Os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário de assistência for vencedor na causa.
§ 1º. Os honorários do advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença.
§ 2º. A parte vencida poderá acionar a vencedora para reaver as despesas do processo, inclusive honorários do advogado, desde que prove ter a última perdido a condição legal de necessitada.
Art. 12. A parte beneficiada pela isenção do pagamento das custas ficará obrigada a pagá-las, desde que possa fazê-lo, sem prejuízo do sustento próprio ou da família, se dentro de cinco anos, a contar da sentença final, o assistido não puder satisfazer tal pagamento, a obrigação ficará prescrita.
Ocorre que a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LXXIV, dispõe que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Ora, se se trata de assistência jurídica integral aos que comprovam insuficiência de recursos, tal aspecto é vislumbrado quando do trâmite da ação judicial, tanto que o benefício pode ser postulado no ato de interposição do pleito, bem como depois, desde que comprovada a necessidade. Pode, inclusive, ser revogado no trâmite do processo.
Não se pode admitir, contudo, que a parte, embora detentora de um direito fundamental – assistência jurídica integral e gratuita – fique, mesmo após o término da demanda, jungida a uma obrigação condicional. É possível inferir que a norma do art. 12 da Lei nº 1.060/50 não guarda correspondência com a norma constitucional constante do art. 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal.
De outra parte, não se pode equivaler tal situação àquela pertinente ao demandante que, de antemão, sabe que terá condições de arcar com as despesas processuais. Tal se dá no caso da parte que, no ato de interposição do pedido, embora não tenha condições de pagar as despesas processuais, sendo o seu pleito procedente, se verá em situação financeira que a capacite a fazê-lo. Nesse caso, é bom frisar, pertine a mera postergação da obrigação de pagar, vale dizer, a parte – necessitada da assistência judiciária gratuita inicialmente – compromete-se a arcar com as despesas, quando do recebimento das verbas a que a parte contrária for condenada.
Ademais, e do contrário, estaria o juiz proferindo decisão condicional, isto é, condenando a parte vencida – e beneficiária da gratuidade – ao pagamento das despesas processuais, condicionando, porém, ao posterior implemento da condição financeira.
É este o entendimento recentemente esposado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, cujo julgado restou ementado nos seguintes termos:
EMENTA: Ônus da sucumbência indevidos: beneficiário da Justiça gratuita: a exclusão dos ônus da sucumbência se defere conforme a situação atual de pobreza da parte vencida (RE 313348 AgR /RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 15/04/2003, DJ 16/05/2003).
Colhem-se do voto do eminente Ministro Sepúlveda Pertence, acolhido à unanimidade, as seguintes considerações:
A exclusão dos ônus da sucumbência se defere conforme a situação atual de pobreza da parte.
Ao órgão jurisdicional não cabe proferir decisões condicionais.
Se um dia – quiçá em razão dos pingues benefícios que recebe do INSS – o vencido tiver condição econômica para responder por custas e honorários, persiga-os a autarquia pelas vias ordinárias.
Nada mais há a acrescer às razões expendidas.
(Dispositivo)
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido de exibição dos documentos.
Sem custas e nem honorários advocatícios, em vista à gratuidade judiciária deferida.
P.R.I.
Intimar.
Aracaju, 12 de janeiro de 2004.
Ronivon de Aragão
Juiz Federal Substituto