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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

 

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Processo nº 99.3103-2 - Classe 05024 - 1ª Vara

Ação: Reintegração de Posse

Autor: Escola Técnica Federal de Sergipe

Réu: SINASEFE – Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Federal de 1º, 2º e 3º Graus da Educação Tecnológica – Secção Sindical do Estado de Sergipe

Juiz: Ricardo César Mandarino Barretto

 

Ação de reintegração de posse. Possibilidade de conversão em ação reivindicatória, se a posse é reivindicada em função do domínio e não se identifica os requisitos do art. 927, do CPC. Pedido procedente.

 

SENTENÇA:

Vistos etc...

Escola Técnica Federal de Sergipe, qualificado na inicial de fl. 02, propõe, contra o Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Federal de 1º, 2º e 3º Graus da Educação Tecnológica – Secção Sindical do Estado de Sergipe - SINASEFE, a presente ação de reintegração de posse, com pedido de liminar, objetivando a reintegração do imóvel onde se encontra instalada a ré.

Diz que é proprietária e possui a posse mansa e pacífica de um prédio localizado na Av. Gentil Tavares da Mota, 1166, nesta Capital.

Alega que o Sindicato-réu mantém, em uma das salas desse prédio, a sua sede, ocupando-as de forma gratuita e sem a celebração de qualquer contrato, constituindo-se, o seu uso, em mero ato de tolerância.

Sustenta que, a partir da edição da Portaria nº 542, de 12..11.98, foi dado um prazo de 30 dias para que o Sindicato providenciasse a desocupação do imóvel, com a consequente retirada dos seus pertences. Não tendo cumprido a determinação, entende que o Sindicato cometeu esbulho, tendo uma posse precária sobre o imóvel.

Requer a concessão da liminar reintegratória, sendo, ao final, julgado procedente o pedido.

Com a inicial, os documentos de fls. 16/39.

Designei audiência de justificação prévia e determinei a citação do réu.

Citado, o SINASEFE apresenta contestação onde alega, em preliminar, falta de interesse de agir, por entender que não houve esbulho, já que possui posse mansa e pacífica do imóvel há mais de 28 anos.

No mérito, sustenta que houve a celebração de um contrato tácito de comodato, estando na posse direta do imóvel há 28 anos. Argumenta que o contrato fora firmado com prazo indeterminado, só podendo ser rescindido nas condições do art. 1.250, do Código Civil.

Requereu, ao final, por força do caráter dúplice das ações possessórias, o deferimento do mandado proibitivo, nos termos do art. 932, do CPC.

Em audiência de justificação, foram ouvidas as testemunhas arroladas pela autora.

Nessa oportunidade, neguei o pedido de liminar, face a inexistência dos requisitos do art. 927, do CPC. Indeferi, ainda, a preliminar de falta de condição de ação, por entender que a ação tem cunho reivindicatório, prosseguindo no rito ordinário.

A União Federal atravessa petição externando que não possui interesse em integrar o feito como assistente da autora (fl. 81).

A autora manifestou-se sobre a contestação.

O Sindicato-réu (fls. 88/99) comunica a interposição de agravo de instrumento, apresentando cópia do recurso.

A autora (fls. 100/106) comunica interposição de agravo de instrumento, juntando cópia do recurso.

Intimadas as partes a dizerem sobre produção de provas, manifestaram-se sobre a sua desnecessidade.

 

É o relatório.

 

Cuida-se de ação de reintegração de posse da Escola Técnica Federal, em Sergipe, contra o Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Federal, objetivando reaver uma das salas do prédio localizado na Av. Gentil Tavares, nº 1.116, de propriedade da autora, que estaria sendo ocupado pela ré, por força do esbulho cometido em 14.12.98, quando expirou o prazo de 30 dias para que devolvesse a sala, em face da Portaria nº 524, de 12.11.98, que concedeu o referido prazo para a devolução da mesma.

Na audiência de justificação prévia, indeferi a liminar, por entender inexistente o esbulho, eis que o Sindicato já se encontrava, há bastante tempo, ocupando a sala com o consentimento da autora. Rejeitei a preliminar de carência de ação, por entender que, indeferida a liminar "initio litis", a ação segue o rito ordinário, assumindo um caráter reivindicatório.

Essa decisão não se encontra preclusa, alvejada que foi por dois agravos de instrumento das partes, cada um atacando aspectos que lhes foram desfavoráveis.

Como não há notícia sobre o julgamento dos agravos, volto ao tema, até porque encontra-se envolto no próprio mérito da demanda.

Com efeito, aprofundando a questão, verifico que, realmente, não havia condições para a concessão da liminar "initio litis", porque não houve prova do esbulho. A relação jurídica entre a autora e o réu, pelo depoimento das testemunhas ouvidas na justificação (fl. 79) e pelas afirmações das partes em suas manifestações, tem toda a característica de contrato de comodato regulado pela disposição do art. 1.248, do CC.

Evidentemente que, em face da administração pública, cuida-se de um contrato irregular, eis que não se admite, perante o poder público, contratos verbais dessa natureza. No particular, a regra é a da obediência de requisitos formais, tais como contrato escrito, precedido de licitação, quando for o caso.

A afronta a essas regras, entretanto, não constitui objeto da demanda, obrigando-me a essas breves considerações para caracterizar a situação que, conquanto irregular, gerou efeitos jurídicos.

Assim tenho como certo que a relação jurídica entre a autora e o réu é de comodante e comodatário, sendo o contrato por prazo indeterminado, que se extingue com a constituição em mora do comodatário, caracterizado o esbulho após esse momento.

Efetivamente, a autora notificou o réu para entregar a sala ocupada, mas parte da jurisprudência entende que essa constituição só se dá com a notificação judicial ou, se extrajudicial, pelo Cartório de Títulos e Documentos. A notificação, no caso, não se operou na segunda modalidade, daí porque tenho que a mora só veio a ocorrer com a citação do réu para responder aos termos da presente ação, substituindo, assim, a notificação especial específica.

Constituído o réu em mora, convertida a ação reintegratória ao rito ordinário, assume o pedido caráter reivindicatório, uma vez que o domínio é incontroverso, prestando-se a ação para o objetivo da disposição do art. 524, do CC.

Maria Helena Diniz ensina que

"Várias são as medidas defensivas da propriedade.

Quando o proprietário for totalmente privado do seu bem poderá retomá-lo de quem quer que injustamente o detenha, por meio da ação de reivindicação, devido ao seu direito de sequela."

 

Ainda na obra citada, diz a autora na pág. 93.

 

"Deve ainda individualizar a coisa, mencionando todos os elementos que a tornem conhecida. Precisa ainda demonstrar que a coisa reivindicada encontra-se na posse do réu, pouco importando que essa posse seja de boa ou má fé, em nome próprio ou de outrem.

O efeito reivindicatório é fazer com que o possuidor restitua o bem com todos os seus acessórios."

 

É o caso dos autos, onde os fatos, propriedade do bem reivindicado e a posse do réu, são incontroversos.

Inadmitir que a ação de reintegração de posse possa ser convertida em ação reivindicatória é o mesmo que não pretender conferir efetividade às normas do processo, eis que ambas as ações visam, na verdade, reivindicar o imóvel.

Evidentemente que a ação de reintegração só discute a posse, e a reivindicatória a obtenção da posse, face a existência do domínio. Ambas são de natureza real, sendo inconcebível que não se proceda a conversão, quando a posse pretendida decorre do domínio e não estejam presentes os requisitos do art. 927, do CPC.

Estamos aqui em uma zona cinzenta, onde há um comodato, extinto com a citação do réu para reaver o imóvel, admitindo a jurisprudência a reintegratória, como se vê da decisão abaixo:

 

"Civil – Comodato – Reintegração de Posse.

    • O comodato obriga a restituição de imóvel no prazo ajustado ou quando lhe for reclamado, ressalvado o tempo necessário a que preencha a finalidade para a qual o contrato foi celebrado.
    • Regularmente notificado para devolver o imóvel, não o fazendo, torna cabível a ação de despejo.
    • Apelação a que se nega provimento, em decisão unânime."

(TRF 2ª Região, AC 0212092-3, UF: RJ, Rel. Juiz Celso Passos, j. 19/07/94)

 

Se se admite a reintegratória, não há motivo plausível para não admitir a sua conversão em reivindicatória se a posse reivindicada decorre do domínio, uma vez ausente as condições do art. 927, do CPC. Só por puro fetiche processual, concebe-se pensar o contrário.

Julgar-se o autor carecedor da ação só pela nominação inadequada da ação, menos por erro técnico, mais pelo fato de haver uma zona cinzenta, um "buraco negro", é o mesmo que transformar o processo em algo lúdico, divertir-se às custas do interesse legítimo da autora, negando efetividade da regra hoje consagrada de que processo é meio e não fim em si mesmo.

Essa visão moderna há de ser o norte dos juízes e advogados, em busca de uma justiça mais célere, sem apego a concepções formais ultrapassadas, que só servem para atulhar o judiciário de feitos repetidos desnecessariamente, travando o andamento da máquina judicial.

No processo nº 94.21095-7, ação de reintegração de posse promovida pela Universidade Federal de Sergipe contra Rosalina Felix Santos, extingui o processo sem julgamento de mérito, uma vez não provada a posse, inadmitindo a conversão para reivindicatória, seguindo raciocínio diometralmente oposto ao que estou a desenvolver nesta sentença.

A sentença anterior a que me refiro é de 11.10.95, mas a ação foi ajuizada em 11.10.94, antes da Lei 8.952/94.

Com o advento da Lei nº 8.952, de 13.12.94, que introduziu, em nosso ordenamento processual, o instituto da antecipação da tutela, os procedimentos judiciais de jurisdição contenciosa restaram esvaziados, tendendo, a maioria deles, a desaparecerem do nosso ordenamento jurídico, pela sua inutilidade, face à possibilidade de antecipar-se tutela em todo e qualquer processo, verificadas as hipóteses do art. 273, do CPC, daí a mudança do meu posicionamento.

No caso das ações possessórias, a previsão da concessão de liminar "initio litis" nada mais é do que um disciplinamento de antecipatório nas condições do art. 927, do CPC.

Se é assim, se esse mesmo procedimento poderia ser conferido em uma ação reivindicatória de rito ordinário, nada obsta a possibilidade da conversão da possessória em reivindicatória, se o pedido baseia-se no domínio e se o objetivo de ambas é reaver o bem.

Isto posto, julgo procedente a ação, pelo que condeno o réu a desocupar o imóvel no prazo de dez dias.

Convertida a ação ao rito ordinário, tenho o pedido de liminar como de antecipação de tutela, que defiro, para que o réu desocupe o imóvel no prazo acima.

Condeno o réu a pagar à autora um aluguel mensal de R$ 100,00, a partir do prazo da contestação, até a data em que permanecer no imóvel.

Condeno o réu nas custas e honorários de advogado em 15% sobre o valor da causa.

 

P. R. I.

 

Aracaju, 27 de setembro de 2000.

 

Juiz Ricardo César Mandarino Barretto