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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Processo n.º 2001.85.00.4390-1 - Classe I - 1ª Vara.

Ação: Ordinária.

Autor: Djenal Gonçalves Soares.

Ré: União Federal.

Juiz: Ricardo César Mandarino Barretto.

 

Adm-Mudança natureza da Aposentadoria-Integralidade proventos-Evento indemonstrado-Improcedência-Djenal Gonçalves

 

Previdenciário e Processual Civil. Aposentadoria de Parlamentar. Direito intertemporal. Alteração da natureza jurídica. Prescrição da pretensão rejeitada. Aplicabilidade da lei vigente ao tempo da aposentação. Ausência de previsão legal e de plausibilidade quanto à retroatividade de lei posterior mais benigna, na peculiar hipótese de se deparar o intérprete com normatividade expressa, inocorrendo omissão ou lacuna das leis confrontadas. Ônus da prova que não se desincumbiu o autor, referente à configuração de doença preexistente. Pretensão que se julga improcedente.

 

 

SENTENÇA:

 

Vistos etc...

Djenal Gonçalves Soares, qualificado na fl. 02 dos autos, propõe, em face da União Federal, a presente ação de conhecimento, pelo rito ordinário, objetivando a concessão da integralidade do benefício de aposentadoria que recebe na condição de ex-deputado federal, eis que fora atestado ser possuidor de cardiopatia grave, circunstância essa justificadora da sua pretensão.

Esclarece ter requerido, e obtido, a aposentadoria como deputado federal em 1995, ainda na vigência da Lei n.º 7.087/82, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, mas, desde 1993, devido à sua também condição de médico, percebeu a existência de sintomas da doença acima citada, pelo que efetuou diversos exames.

Aduz que o seu pedido de conversão de aposentadoria, de proporcional ao tempo de serviço para invalidez, na via administrativa, restou indeferido, não obstante a nova lei de regência – Lei n.º 9.506/97 - haver garantido os direitos adquiridos na vigência do diploma anterior, e trazer a previsão da integralidade dos proventos na hipótese de ocorrência de doença grave verificada no exercício do mandato.

Esclarece, mais, haver conseguido isenção de imposto de renda sobre seus proventos, tanto pela Câmara dos Deputados, como pelo Ministério da Saúde, de quem é servidor aposentado, justamente por lhe ter sido reconhecida a condição de cardiopata.

Pugna, ao final, pela procedência do pedido e pela condenação da ré a ressarci-lo das diferenças que deixou de perceber desde o momento da aposentação.

Com a inicial, os documentos de fls. 11 a 69.

Custas iniciais pagas (fl. 70).

À fl. 71, afastei a Câmara dos Deputados e o Plano de Seguridade Social dos Congressistas do pólo passivo, pelas razões ali declinadas, determinando, tão-somente, a citação da União Federal. Tal decisão não sofreu qualquer irresignação.

Citada, a União Federal contesta a demanda, ofertando arrazoado de fls. 75 a 85, arguindo, preliminarmente, a prescrição do próprio direito embasador da pretensão, além das prestações daí decorrentes, com base nas disposições do Decreto n.º 20.910/32.

No mérito, argumenta, em síntese, que o ato de aposentadoria do requerente teve por base as disposições da Lei n.º 7.087/82, vigente à época, que traçava as regras quanto à integralidade ou proporcionalidade dos proventos, não havendo se falar em lacunas, com a utilização de legislações outras, ou mesmo da nova lei disciplinadora da seguridade dos congressistas – Lei n.º 9.506/97.

Sustenta, ademais, não ter o autor provado sua condição de cardiopata ao tempo de exercício do mandato parlamentar, fato esse reconhecido muito posteriormente, em nada lhe socorrendo os exames acostados com a inicial.

                        Junta documentos (fls. 86/140) e pede a improcedência dos pedidos.

                        Intimado, o autor manifestou-se cobre a contestação, requerendo o julgamento antecipado do feito (fls. 142/144).

                        É o relatório.

Decido.

                        Opto pelo julgamento antecipado da lide, eis que verificada a hipótese do art. 330, I, do Código de Processo Civil.

Por ser uma questão prejudicial à análise direta do mérito, examino a preliminar de prescrição argüída pela ré.

Nas ações em que se pretende discutir uma determinada situação jurídica (fundo do direito), criando-a, modificando-a ou extinguindo-a, temos propriamente uma ação constitutiva que, em se tratando da "fazenda pública", o prazo prescricional é de 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem (art. 1.º do Decreto n.º 20.910/32), registrando-se que ato ou fato quer dizer uma manifestação concreta da administração pública, como, v. g., a negação do direito pleiteado.

A pretensão ora deduzida pelo requerente visa, explicitamente, modificar uma situação jurídica base, com a transmudação da natureza de sua aposentadoria – de proporcional ao tempo de serviço para invalidez -, sendo mera conseqüência a percepção, caso assim fosse procedente o pedido, da integralidade dos proventos, isto é, o autor apenas terá direito a receber proventos integrais, como se vê da leitura dos pedidos constantes da pág. 09, itens "a" e "b", da inicial, se se reconhecer o seu direito à aposentadoria por invalidez. Para tanto, funda o pedido nas disposições da Lei n.º 9.506/97, a qual, revogando a anterior norma de regência – Lei n.º 7.087/82 -, trouxe previsão expressa quanto ao direito em se receber a integralidade da remuneração paga aos congressistas, entre outros casos, quando o parlamentar for acometido de doença grave, contagiosa ou incurável, no exercício do mandato (art. 2.º, inciso I, alínea "a").

Na particular situação dos autos, onde o autor perfez as condições de aposentadoria em 1995, logrando obtê-la em fevereiro do mesmo ano, e apesar de já transcorridos, assim, mais de 05 (cinco) anos para a propositura da ação tendente a discutir o próprio fundo de direito inicial – natureza da aposentadoria concedida em 11.09.2001 -, entendo que a prescrição não se operou, porque o fundamento de validade da pretensão ora manejada, se acaso acolhida, baseia-se no surgimento da Lei n.º 9.506/97, mormente seu art. 2.º, inciso I, alínea "a", e da alegação, por parte do autor, de ser possuidor de doença grave em decorrência e durante o período em que exerceu o mandato de deputado federal, cujos efeitos pecuniários – percepção integral dos proventos – somente se verificarão para o futuro, a partir da edição da lei embasadora, ou, mas a partir desse marco temporal, do reconhecimento da aludida condição de saúde, e não como pleiteou o acionante, com efeitos pretéritos à época da aposentação. Isso se, repita-se, julgar-se procedente o mérito.

Destarte, seja pela data de publicação da vigente lei reguladora da matéria (31.10.1997), eleita como fundamento de validade do pedido e da qual o acionante busca extrair uma interpretação extensiva mais benéfica, seja pela data em que a Administração Pública manifestou-se, concretamente, rejeitando o pedido de novo enquadramento do autor, em maio de 2001 (documento de fl. 67), não há que se falar em ocorrência da prescrição do fundo de direito.

Rejeito a preliminar.

No mérito, a questão cinge-se à possibilidade de retroação dos efeitos de uma nova lei a uma aposentadoria concedida com base em diploma revogado, ainda que a truncada redação da peça inicial suponha uma interpretação, quanto à causa de pedir, de que a aposentadoria do autor foi concedida de forma errônea, tendo a Administração Pública malferido seu direito à situação jurídica de aposentado por invalidez, ao ignorar sua condição de saúde ao tempo de exercício do mandato parlamentar.

Tratando-se de matéria previdenciária, e em especial de aposentadoria, o princípio norteador, tanto para o legislador, como para os órgãos do Poder Executivo e do Poder Judiciário, é o respeito ao direito adquirido e, portanto, a estrita observância dos requisitos exigidos em cada época e se o titular logrou implementar as condições a esse fim, tendo-o por incorporado ao seu patrimônio jurídico, ainda que não exercitado. A regra, então, será a aplicação da lei vigente ao tempo em que se aperfeiçoou o direito à aposentadoria.

Neste feito, verifica-se que o autor detém a condição de aposentado como ex-parlamentar, que lhe foi deferida em fevereiro de 1995, com fulcro nas disposições do art. 31 "a", c/c os arts. 34 e 35, da Lei n.º 7.087/82 (fls. 56 e 111), e ex-servidor público federal, vinculado ao Ministério da Saúde, com base no art. 186, inciso III, "c", da Lei n.º 8.112/90 (fls. 69 e 90), cujos respectivos atos tiveram, como traço comum e motivação, a solicitação a pedido e proporcionais, respectivamente, ao tempo de mandato e ao tempo de serviço.

 A referida Lei n.º 7.087/82 trazia regras específicas quanto à aposentadoria por invalidez, cuja integralidade de proventos somente era admitida na particular hipótese de acidente de serviço, além de outras disposições, inclusive com a previsão da proporcionalidade da pensão caso a invalidez tivesse causa outra (art. 37). Nesse caso, e por se utilizar de termo técnico – acidente de serviço, tendo por significado todo infortúnio ocorrido pelo exercício do trabalho, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho (art. 19, da Lei n.º 8.213/91) -, tem-se que o legislador quis restringir a sua aplicabilidade apenas àquelas situações efetivamente englobadas, afastando, como diversamente sói acontecer no Regime Geral da Previdência (art. 20, da Lei n.º 8.213/90), e no Regime Jurídico dos Servidores Público Civis (Lei n.º 8.112/90, art. 186, § 1.º, c/c o art. 190), outras situações análogas ou mesmo similares, mas abrangidas pela expressão "acidente de serviço", a tanto equiparadas. Contudo, não foi este o espírito da Lei n.º 7.087/82.

Com a edição da novel Lei n.º 9.506/97, a qual prevê, textualmente, como causa de aposentadoria por invalidez, com rendimentos integrais, o advento de doença grave ou incurável concomitantemente ao desempenho do mandato, e, consoante se depreende da leitura da peça inicial, o autor vislumbrou a possibilidade de alterar sua situação jurídica de aposentado por tempo de mandato para uma aposentadoria por invalidez, eis que, posteriormente, detectou-se ser o mesmo portador de cardiopatia grave. Para tanto, procurou estabelecer uma causa preexistente e necessária à consecução do seu objetivo, mas já agora buscando a aplicação, com efeitos retroativos, do diploma legal acima citado.

Entendo não haver como se acolher a tese autoral. Primeiro, porque as aposentadorias devem ser regidas pela lei vigente ao seu tempo, admitindo-se uma interpretação retroativa benéfica se houver expressa disposição nesse sentido, contida na lei nova - o que repele, desde logo, a alegação de retroatividade da Lei n.º 9.506/97, uma vez que a mesma não traz qualquer disposição desse jaez -, ou, se as novas disposições legais apenas criam desigualdades para situações idênticas, sem estabelecer novos parâmetros ou requisitos outros, distintos dos anteriormente exigidos, ou, se determinada situação deixou de receber tratamento normativo. Quanto a esse último aspecto, já tive a oportunidade de analisá-lo em outra oportunidade – autos do processo n.º 99.779-9-1.ª Vara -, e por reconhecer sua ocorrência, acolhi o argumento da retroatividade da lei mais benéfica, valendo-me, inclusive, de ensinamento do professor Wladimir Novaes Martinez, o qual preleciona:

Na aplicação do Direito Previdenciário raramente a lei retroage, como acontece em outros ramos jurídicos, mas é comum ditame novo alterar a avaliação dos elementos pertencentes ao passado, para melhor. Na interpretação e integração, isto é, nos casos de obscuridade e fissura da norma jurídica vigente à época dos acontecimentos, é cabível a argumentação relativa à posterior mais benéfica.”[1] (grifei).

Portanto, não há se falar em integração de normas tendente a aplicar retroativamente a Lei n.º 9.506/97, porquanto a Lei n.º 7.087/82 não contém qualquer lacuna ou omissão legislativa acerca da questão específica das hipóteses de invalidez e suas conseqüências financeiras, levando-se à conclusão de que a aceitação de exegese outra, na concreta situação dos autos, cria uma situação privilegiadora, sem qualquer fundamento legal ou mesmo plausível, onde o autor fica dispensado de atender aos novos requisitos assim exigidos para os atuais parlamentares, como, por exemplo, contar 60 (sessenta) anos de idade e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição.

Segundo, e em socorro à assertiva de que as diversas leis ora confrontadas não padecem de qualquer omissão ou sofreram solução de continuidade quanto à questão debatida, a Lei n.º 9.506/97, em seu art. 4.º, § 2.º, trouxe, como regra de transição para a concessão de novos benefícios do Plano de Seguridade Social dos Congressistas, de forma expressa, a impossibilidade de cômputo dos períodos de tempo já considerados para concessão de anterior e equivalente benefício, em qualquer regime previdenciário, como é o caso específico do autor.

Assim, defluindo desse mesmo contexto de existência de normatização suficiente e específica, conclui-se, mais, pela inaplicabilidade integrativa de regras do Regime Geral da Previdência ou aquelas atinentes aos servidores públicos civis, porquanto não ser possível a utilização híbrida de regimes distintos, buscando-se a conjugação de dispositivos benéficos ao requerente.

Sob outro prisma, e com fincas a não pairarem dúvidas quanto ao pleno enfrentamento de todas as questões postas, tenho que a própria condição de cardiopata do autor não restou caracterizada ao tempo do desempenho dos mandatos como parlamentar – verificados entre 1991 a 1995 -, não se desincumbindo do ônus de provar o fato constitutivo de seu direito, sendo referida circunstância – portador de doença grave – somente reconhecida em outubro de 2000, primeiramente pelo Ministério da Saúde, do qual integrava o quadro de servidores (fls. 69, 87 e 90), e, após, em fevereiro de 2001, pela Câmara dos Deputados, após análise dos atestados e laudos médicos confeccionados entre os meses de dezembro de 2000 e janeiro de 2001 (fls. 68 e 90 a 107), não o socorrendo, eis que desacompanhados do pertinente laudo, os exames acostados às fls. 12 a 41.

Portanto, e considerando-se que sua aposentadoria requerida junto ao Ministério da Saúde, datando de 1993, como se infere do documento de fl. 69, o foi a pedido e proporcional ao tempo de serviço, deflui-se não estar o mesmo acometido da doença indicada – cardiopatia grave -, como sustenta na peça inicial, pois, de outra forma, faria jus à aposentadoria por invalidez como servidor público federal, cuja legislação já trazia expressa previsão nesse sentido (art. 186, inciso I e § 1º, da Lei n.º 8.112/90), não fazendo sentido ter pleiteado uma outra, como o fez, e que lhe era prejudicial, haja vista prever o pagamento proporcional dos proventos.

Esse mesmo raciocínio vale para a aposentadoria requerida em fevereiro de 1995, perante a Câmara dos Deputados, a qual, também, com já se disse, fundamentou-se no tempo de mandato como parlamentar, fazendo jus, apenas, à proporcionalidade dos rendimentos então percebidos, refutando-se ser portador, no respectivo período, de qualquer moléstia.

            Isto posto, julgo improcedentes os pedidos.

Condeno o autor, em face da sucumbência verificada, ao pagamento das custas e em honorários advocatícios de R$ 400,00 (quatrocentos reais), estes arbitrados com fulcro nas disposições do art. 20, § 4.º, do Código de Processo Civil.

                        P. R. I.

Aracaju, 12 de fevereiro de 2003.

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal - 1ª Vara



[1] Em Curso de Direito Previdenciário – Tomo I - Noções de Direito Previdenciário – Editora LTr.: 1997.