PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA
FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe
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Processo n.º 99.779-9 - Classe 10000 – 1.ª Vara.
Ação: Sumária.
Autor: Jovaldina Matos
Réu: Instituto Nacional do Seguro Social.
Juiz: Ricardo César Mandarino Barretto.
Previdenciário. Revisão de pensão previdenciária fruto de obrigação alimentícia. Direto intertemporal. Aplicação de lei posterior mais benéfica. Ação procedente.
SENTENÇA:
Vistos, etc...
Jovaldina Matos, qualificada na inicial de fls. 02, propõe, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, a presente ação de revisão de proventos cumulada com diferenças não recebidas, objetivando revisar o valor de seu benefício previdenciário.
Alega que foi companheira do segurado José Freire Gomes da Cunha, sendo contemplada, a partir do seu falecimento, com o benefício previdenciário da pensão por morte. Referido benefício foi tripartido, por força da existência de mais duas dependentes (Josefa Perpétua de Rezende e Carmelita F. G. da Cunha).
Com a morte da pensionista Josefa Perpétua de Rezende, entende que o valor de sua cota deve ser repassado para as demais beneficiárias.
Requer ao final, o julgamento procedente de sua pretensão, a fim de que seja determinada a revisão de seus proventos e o pagamento das diferenças daí decorrentes, acrescida de juros, correção monetária e ônus sucumbenciais.
Com a inicial, os documentos de fls. 05 a 11.
Citado, em audiência o INSS apresenta sua resposta, sob a forma de contestação, arguindo, em preliminar, a prescrição quinquenal.
No mérito, diz que, por ter o benefício previdenciário da autora origem em uma obrigação alimentícia, não lhe cabe o direito perseguido. Assim entende, por força da interpretação dada aos comandos do Decreto nº 83.080/79, vigente à época da concessão da pensão por morte, que expressamente proibia o repasse do valor da cota pretendida pela autora ao seu benefício, eis que este se tratava de uma prestação alimentícia.
Requer a improcedência da ação.
Pelo MM. Juiz Edmilson Pimenta foi proferida sentença, desacolhendo o pedido autoral.
O TRF da 5ª Região, ao apreciar o recurso de apelação interposto pela requerente, anulou a sentença, por entender imprescindível a participação da viúva do segurado no feito, como litisconsorte necessária.
Intimada, a autora promoveu a citação da Sra. Carmelita Freire Gomes da Silva.
Citada, a litisconsorte necessária não se manifestou.
É o relatório.
A preliminar de prescrição quinquenal não merece prosperar, eis que o evento motivador da pretensão posta em juízo (falecimento da pensionista Josefa Perpétua de Rezende) ocorreu em 22.01.93, e a presente ação foi distribuída em 06.03.96. Constata-se, assim, que não decorreu o lapso temporal suficiente à sua ocorrência.
No mérito, trata-se de um pedido de revisão de pensão por morte, em que a autora pretende incorporar aos seus proventos o valor atribuído a outro pensionista, do mesmo segurado, que viera a falecer.
O seu benefício, conforme documentos de fls. 26 e 27, é fruto de uma prestação alimentícia arbitrada em seu favor no percentual de 25%.
Na verdade, a querela posta em juízo não traria maiores discussões não fosse uma questão peculiar – a sucessão de leis no tempo – da qual resulta a problemática do direito intertemporal.
A concessão da pensão por morte da autora ocorreu em 20.05.1990, quando vigia o Decreto nº 83.080/79 (doc. fls. 08). Nesta norma, havia um dispositivo que estabelecia a permanência da prestação alimentícia, com a morte do segurado, nos mesmos parâmetros anteriormente estipulados (art. 69, § 3º). Expressava, ainda, que, apenas na extinção da cota de beneficiário de prestação alimentícia, o seu valor seria destinado ao recálculo do grupo dos dependentes remanescentes (art. 129 § único).
Já o evento do falecimento de uma das cotistas da pensão, ocorreu em 22.01.93, quando vigente a Lei nº 8.213/91, que assim dispõe quanto ao objeto da presente ação:
"Art. 77 – A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em partes iguais.
§ 1º - Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar."
No direito previdenciário, o princípio da norma vigente à época do fato é tido como um dos preceitos basilares de sua existência e validade. A irretroatividade de comando posterior é uma regra geral, e assim o é, por força das inúmeras disposições normativas que se sucedem nesse ramo do direito brasileiro.
A razão principal de sua aplicação é o resguardo das conquistas sociais dos beneficiários do sistema previdenciário, impedindo que lei posterior venha a prejudicar o já tão combalido segurado da previdência social.
No entanto, em casos como o dos autos, quando a legislação sucessora interpreta de forma mais benéfica o direito do segurado ou pensionista, entendo que a mesma deve de imediato ser aplicada, inclusive aos fatos pretéritos. É uma situação diferente daquela que acima fora descrita.
O Professor Wladimir Novaes Martinez, nesse aspecto, assim se manifesta:
"Na aplicação do Direito Previdenciário raramente a lei retroage, como acontece em outros ramos jurídicos, mas é comum ditame novo alterar a avaliação dos elementos pertencentes ao passado, para melhor. Na interpretação e integração, isto é, nos casos de obscuridade e fissura da norma jurídica vigente à época dos acontecimentos, é cabível a argumentação relativa à posterior mais benéfica."
A interpretação analógica deve ser aqui posta em prática, eis que casos há onde a própria legislação previdenciária reconhece essa possibilidade aos segurados, como o faz o artigo 144, da lei nº 8.213/91, que determinou a revisão de todos os benefícios concedidos pela Previdência Social, entre 05.10.88 e 05.04.91.
A jurisprudência também alberga esse entendimento, conforme os julgados a seguir transcritos:
TRIBUNAL:TR4 ACORDÃO RIP:04481132 DECISÃO:05-09-1996
PROC:AC NUM:0448113-2 ANO:95 UF:RS
TURMA:05 REGIÃO:04
APELAÇÃO CIVEL
Fonte:
DJ DATA:23-10-96 PG:080898
Ementa:
PREVIDENCIARIO. APOSENTADORIA. PENSÃO RURAL POR MORTE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. EMBORA O PEDIDO ADMINISTRATIVO TENHA SIDO FEITO NA VIGENCIA DO DEC-83080/79, NÃO HA OBICE NA CUMULAÇÃO DE APOSENTADORIA PROPRIA COM PENSÃO RURAL PELA MORTE DO ESPOSO, DEVENDO-SE APLICAR OS ART-75 E ART-77 DA LEI-8213/91, LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE MAIS BENEFICA AO SEGURADO.
2. APELAÇÃO IMPROVIDA.
Relator:
JUIZ:425 - JUIZA MARGA INGE BARTH TESSLER
TRIBUNAL:TR2 ACORDÃO DECISÃO:01-10-1996
PROC:AC NUM:0213184-1 ANO:94 UF:RJ
TURMA:03 REGIÃO:02
APELAÇÃO CIVEL
Fonte:
DJ DATA:15-04-97 PG:023657
Ementa:
PREVIDENCIARIO - BENEFICIO DE AUXILIO-DOENÇA - REVISÃO - GRATIFICAÇÃO NATALINA.
I - HIPOTESE DE BENEFICIO DE AUXILIO-DOENÇA CONCEDIDO EM 1989, ONDE SE PRETENDE SEJA O MESMO CALCULADO NOS TERMOS DA LEI 8.213/91;
II - TRATANDO-SE DE BENEFICO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA, SOBREVINDO LEI POSTERIOR QUE POSSIBILITE O CALCULO DO MESMO DE FORMA
MAIS BENEFICA AO SEGURADO, DEVE A NOVA LEI SER APLICADA, O QUE NÃO IMPLICA EM SE NEGAR VIGENCIA A SUMULA 359 DO STF;
III - O § 6º DO ART.201 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL É AUTO-APLICAVEL. JURISPRUDENCIA DO STF;
IV - RECURSO DO AUTOR PROVIDO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO.
Relator:
JUIZ:213 - JUIZ VALMIR PEÇANHA
Destarte, o cunho social sob o qual o direito previdenciário foi erigido não permite uma interpretação vacilante, que ora beneficia ora prejudica os segurados, gerando e mantendo desigualdades sociais. Se assim o for, a justiça social não se concretiza, tampouco se harmoniza com o princípio da igualdade, insculpido na Lei Maior.
Diante do exposto, julgo procedente o pedido da autora para determinar ao INSS que efetue a revisão do seu benefício, procedendo ao rateio da cota da pensionista falecida Josefa Perpétua de Rezende entre as pensionistas remanescentes Jovaldina Matos e Carmelita Freire Gomes da Cunha.
Desse modo, os benefícios previdenciários ficarão assim recompostos:
|
BENEFICIÁRIO |
SITUAÇÃO ATUAL |
REVISÃO |
TOTAL |
|
Jovaldina Matos |
25,00% |
25,00% + 18,75% |
43,75% |
|
Carmelita F.G. da Cunha |
37,50% |
37,50% + 18,75% |
56,25% |
|
Total |
100,00% |
Condeno o réu ao pagamento, à autora, das diferenças resultantes da revisão do seu benefício, que devem ser atualizadas e acrescidas de juros de mora de 1,0% ao mês, estes contados da citação (Súmula 204, do STJ).
Condeno-o, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios em 10% sobre o valor das referidas parcelas, tudo a ser apurado em liquidação.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
P.R.I
Aracaju, 27 de março de 2001.
Ricardo César Mandarino Barretto
Juiz Federal - 1ª Vara