PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA
FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe
![]()
Processo nº. 98.3611-3 - Classe 01000 - 1ª. Vara
Ação: Ordinária
Autor: Dulce dos Santos (Espólio)
Réu: Instituto Nacional do Seguro Social.
Juiz Federal: Ricardo César Mandarino Barretto.
Ação Ordinária de Concessão de Benefício junto ao INSS. Provada a relação de união estável da companheira para com o segurado falecido, faz aquela jus à pensão por morte deste. Falecendo a mesma no curso do processo e, habilitados os herdeiros em representação do espólio, atende-se ao preceituado no art. 462, do CPC. Prejudicado o pedido de concessão de benefício. Procedência quanto às importâncias impagas.
SENTENÇA:
Vistos, etc...
Dulce dos Santos, qualificada na inicial de fls. 02, propôs, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, a presente ação de conhecimento, objetivando receber pensão por morte do ex-segurado José Pedro da Silva, a partir de seu óbito.
Alega ter sido companheira do mencionado segurado, mantendo uma convivência que se estendeu de 1986 até 1996, quando este último faleceu, mas o requerido nega-se a conceder o benefício, por não entender caracterizada a qualidade de dependente.
Percorrera, à exaustão, a via administrativa, mas seus esforços resultaram estéreis.
Interpreta a Lei 8.213/91, a Lei 9.278/96, respaldando-se em lições doutrinárias, para, ao fim, anexar os documentos de fls. 11 a 20.
Citado, o INSS contesta, aduzindo, em síntese, que a legislação de regência, especialmente o Decreto 611/92, exige prova material, citando, em reforço, artigos do Código de Processo Civil e lições juriprudenciais.
A autora manifestou-se sobre a contestação.
Após saneado o feito, como o deferimento de prova testemunhal, adveio, nas fls. 73/74, pedido de habilitação dos sucessores legais da demandante, em razão de seu falecimento. Ao mesmo tempo, apresentou-se o respectivo rol de testemunhas.
Em audiência, tendo em vista o incidente suscitado, deu-se vista ao réu, que não se opôs. Assim, a habilitação foi deferida, com a determinação de que fossem juntadas as respectivas procurações.
Atendida a diligência, continuou-se a audiência, efetivando-se a oitiva das testemunhas arroladas pelo espólio.
As partes declinaram suas razões, oralmente.
É o relatório.
A situação de união estável está devidamente configurada.
Em que pese existirem pontos de dissonância nos testemunhos colhidos, é de se destacar o aspecto meramente circunstancial da divergência, visto que a situação de convivência foi categoricamente afirmada tanto pelo Sr. Joane Mota (fls. 105), quanto pela Sra. Maria dos Prazeres Melo (fls. 106).
O primeiro, assegurou que "... conheceu a autora desde quando eram crianças e se recorda que ela conviveu com o Sr. José Pedro durante uns dois anos até o falecimento deste. Antes, a autora vivia com seus filhos ."
A segunda, por seu turno, disse também conhecer "... a autora há muitos anos, tendo sido, inclusive, testemunha de seu casamento com o primeiro marido. Depois da viuvez, a depoente recorda-se que a autora passou a viver com o Sr. José Pedro da Silva, há cerca de 04 anos. A depoente não se recorda quanto tempo a autora conviveu com o Sr. José Pedro, mas sabe que foram muitos anos."
Acima foi dito ser circunstancial a divergência. E efetivamente o é, pois, ao contrário do que sustenta o INSS, a duração da convivência, para efeitos previdenciários, é irrelevante. Ora, é fácil perceber ter sido justamente esse o único ponto no qual as testemunhas não foram concordes.
Quanto às exigências da legislação previdenciária, verdadeiro fetiche pelas provas ditas materiais, de há muito venho reputando-as dissociadas da realidade social do País, merecendo uma interpretação contemporizadora, de modo a impedir que se transformem em uma "camisa de força" para o juiz, ferindo o princípio do livre convencimento.
Em todo caso, constam dos autos cópias de fotografias com os conviventes de outrora, não impugnadas, sendo merecedoras, portanto, de mesma consideração destinada aos documentos particulares.
Presente, também, a certidão de óbito do segurado, descrevendo, como seu antigo endereço, o mesmo que servia de residência à Sra. Dulce dos Santos (fls. 15).
Completando o quadro de elementos de convicção, há o termo de rescisão do contrato de trabalho do Sr. José Pedro da Silva, por força de sua morte, assinado, no campo reservado ao empregado, pela falecida autora (fls. 14).
São veementes os indícios materiais acerca da existência de união estável, representando, indubitavelmente, começo de prova escrita, sempre tão reclamado pela autarquia-ré.
Nas ações cujas provas alcançam tal envergadura, a jurisprudência dos TRF’s não discrepa. Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRO. CARACTERIZAÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL DESNECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS PREVISTOS NO ARTIGO 20, DO DECRETO N. 611, DE 1992. PROVA TESTEMUNHAL E DOCUMENTAL SUFICIENTES PARA O CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO.
1. A caracterização da união estável, para fins de percepção do beneficio de pensão por morte, pode ser comprovada, judicialmente por quaisquer meios em direito permitidos. A exigência de apresentação dos documentos indicados pelo artigo 20, do Decreto n. 611, de 1992, refere-se, tão-somente, aos requerimentos administrativos.
2. Em processo judicial, pode-se constatar a existência de união estável, independentemente da apresentação dos referidos documentos, vez que, de acordo com o principio da persuasão racional do juiz, pode o mesmo considerar a prova testemunhal como bastante para a comprovação do concubinato.
3. Apelação improvida.
TRF da 5ª Região - AC. nº 579299-9/AL – DJ de 18.05.98 – Rel. Des. Fed. Geraldo Apoliano.
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.
1. A Lei nº 8213/91, em seu art-16, inc-1, dá, à companheira ou ao companheiro, a condição de dependente do segurado na forma estabelecida pela CF-88. Nem a Carta Política, nem a Lei nº 8213/91 estabeleceram prazo para que a união entre homem e a mulher seja considerada estável.
2. A dependência econômica, ainda que parcial, no caso é presumida, por força do que dispõe o art-16, inc-1 e seu par-4. da lei nº 8213/91.
3. O pedido de substituição de um beneficio pelo outro que lhe é mais favorável, foi feito na esfera administrativa em 25-08-89, data a ser considerada para a concessão.
TRF da 4ª Região – AC. nº 403707-9/SC – DJ de 15.05.96 – Rel. Des. Fed. Luíza Dias Cassales.
PENSÃO POR MORTE - COMPANHEIRA - VIDA EM COMUM -PRAZO.
1 . A companheira é dependente do segurado, no caso das uniões estáveis, independentemente de designação específica ou tempo de vida em comum.
2. O Dec. 89312/84 (CLPS) exigia, de fato, a designação da companheira e a vida em comum por mais de 5 anos, mas a lei-8213/91 não reproduziu tais exigências, em obediência ao preceito constitucional que reconhece a união estável como entidade familiar para efeito de proteção do Estado (art-226, par-3, CF-88).
TRF da 4ª Região – AC. nº 425760-5/RS – DJ de 29.05.96 – Rel. Des. Fed. Amir Finocchiaro Sarti.
Desse modo, exsurge o direito da primitiva requerente, hoje falecida, à pensão por morte, posto ser presumida a dependência econômica durante a união estável (Lei 8.213/91, art. 16, I, c/c § 4º).
E mais: em hipóteses como as aqui configuradas, o benefício, independentemente da data do requerimento administrativo, é devido desde o óbito, pois, conforme decidi em outra oportunidade, "...o direito à pensão adquire-se no momento do óbito e não no momento do requerimento, não podendo o legislador restringir um direito apenas por mera formalidade de não ter sido requerido no prazo estabelecido ... Tanto é verdade que no caso de morte presumida, o legislador, acertadamente, colocou a data do início do benefício como a data de declaração judicial reconhecendo a morte. Isso porque, qualquer sentença judicial de reconhecimento presuntivo da morte, não pode precisar a data da morte (...)".
Semelhante panorama decerto ensejaria a total acolhida do pleito autoral.
No entanto, a Sra. Dulce dos Santos, demandante originária nos autos, faleceu no curso da ação, habilitando-se seus herdeiros legítimos em representação do espólio. Com isso, inviabilizado fica, desde logo, o requerimento de concessão atual do benefício.
A solução vem do art. 462, do CPC, permitindo-me, por força do evento superveniente, considerar perecido o objeto daquele pleito, mas, de forma diversa, conceder aos mencionados herdeiros o direito à percepção das parcelas vencidas, consoante postulado no item "b", na inicial, às fls. 09.
Isto posto:
a) julgo prejudicado o pedido de concessão de pensão por morte, apenas para efeito de implante mensal do benefício.
b) julgo procedente o pedido de concessão de pensão por morte para efeito exclusivo de pagamento das parcelas vencidas, condenando o INSS a pagar aos herdeiros da Sra. Dulce Santos, ora habilitados, os valores compreendidos entre o óbito do Sr. José Pedro da Silva e o óbito daquela primeira.
Citadas prestações devem ser todas acrescidas de correção monetária e de juros de mora, contados com a citação, conforme Súmula 204, do STJ, no patamar de 1% ao mês, nos termos de entendimento também consolidado naquela Colenda Corte, reiterado em diversos julgados (veja-se, por exemplo: RESP nº 233.380/RN – rel. Min. Gilson Dipp, RESP nº 297.244/CE – rel. Min. Edson Vidigal, RESP nº 297.058/SE – rel. Min. Jorge Scartezzini, RESP nº 298.309/CE – rel. Min. Vicente Leal, RESP nº 302.099/CE – rel. Min. Félix Fischer).
Condeno o réu, por fim, em honorários advocatícios, no importe de 10% sobre a condenação, aferindo-se tido em liquidação.
Retifique-se a autuação, inserindo, em substituição, no pólo ativo, o espólio de Dulce dos Santos.
Sentença sujeita a reexame.
P. R. I.
Aracaju, 14 de maio de 2001.
Ricardo César Mandarino Barretto
Juiz Federal da 1ª. Vara