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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

 

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Processo nº. 2000.85.00.3145-1 - Classe 05000 - 1ª Vara – Ação Diversa.

Autor: José Luiz de Arimatéia.

Interessado: Caixa Econômica Federal.

Juiz Federal: Ricardo César Mandarino Barretto.

 

Constitucional e Processual Civil. FGTS. Direito à movimentação de contas vinculadas decorrente da extinção do vínculo laboral há mais de três anos. Interpretação Lógica. Ação procedente em parte.

 

SENTENÇA:

 

Vistos, etc...

 

José Luiz de Arimatéia, qualificado na inicial de fl. 02, ingressa com o presente pedido de expedição de Alvará Judicial, em face da Caixa Econômica Federal, objetivando a liberação dos valores residuais de suas contas vinculadas ao FGTS, eis que rescindiu os contratos de trabalho respectivos e não pôde receber os valores depositados a título de FGTS.

Junta documentos e pede, ao final, o acolhimento do pedido.

Com a inicial, a procuração de fl. 04 e os documentos de fls. 05-19.

Intimado, o autor requer a citação da Caixa Econômica Federal (fl. 24).

Citada, a CEF oferece resposta, argumentando, no mérito, inexistência de documentos a amparar o pleito autoral, eis que apresentou, apenas, extratos de conta vinculada ao FGTS e cópias de páginas da CTPS.

Ao final, requer a apresentação das provas necessárias à sustentação das alegações, sendo deferido o pedido, com a apresentação dos mesmos.

Intimado, o autor não se manifestou sobre a contestação.

O MPF, à fl. 38, requer que o autor apresente cópia dos termos de rescisão de alguns contratos de trabalho referidos na exordial.

Intimado, o autor apresentou duas Carteiras de Trabalho e Previdência Social, não atendendo especificamente à cota ministerial.

Instada a se manifestar sobre os documentos acostados, a CEF ratificou a sua contestação.

O MPF, às fls. 64-65, opina pela procedência parcial do feito.

 

É o relatório.

 

Com efeito, o cerne da lide encontra-se no período de atividade das contas vinculadas e a apresentação de documentos suficientes à liberação do seu saldo.

Busca o autor o levantamento das quantias depositadas a título de FGTS decorrente dos contratos de trabalho celebrados com a Construtora Celi Ltda (23/07/81 a 03/08/81 e 06/12/82 a 19/01/83), a Cimavel Com. Imp. de Máqs. e Veículos Ltda. (01.04.87 a 26.12.87), o Condomínio Conjunto de Angelis (10/10/89 a 08/11/89), o Condomínio Edifício Tocantins (01/11/91 a 04/01/94), o Condomínio Residencial Jardins di Napoli (04.01.94 a 29.08.95) e o Condomínio Edifício Renoir e Monett (01/02/96 a 21/01/99).

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço foi instituído com a finalidade de proporcionar uma reserva de numerário ao empregado, provendo-o, quando o mesmo fosse demitido da empresa, de recursos para garantir a sua manutenção.

Inicialmente, buscou-se compatibilizá-lo com o sistema da estabilidade decenal, onde o empregado, após dez anos de serviço, tornava-se estável e sua despedida implicaria em indenização em dobro. No caso, o trabalhador optaria por qual regime seu contrato de trabalho seria regido. No entanto, com o passar dos anos, a "opção" pelo FGTS passou a ser requisito obrigatório para admissão por parte das empresas, que vislumbraram uma diminuição dos custos na extinção dos vínculos laborais.

Referida dualidade de sistemas vigeu até a promulgação da Carta Magna de 1988, quando, em seu artigo 7º, inciso III, disciplinou o FGTS como um direito do trabalhador.

A partir de então, exceto no efêmero período de vigência da Lei nº 7.839/89, passou a ser regido pela Lei nº 8.036/90 e regulamentado pelo Decreto nº 99.684.

Pois bem. A Lei nº 8.036/90 prevê, em seu artigo 20, as hipóteses de movimentação da conta vinculada do trabalhador no FGTS. Em seu inciso VIII, há a possibilidade de saque quando a conta "permanecer 3 (três) anos ininterruptos, a partir da vigência desta Lei, sem crédito de depósitos;".

O disciplinamento desta possibilidade de saque tem motivado grandes discussões jurídicas. Há aqueles que a interpretam restringindo-a ao afastamento do trabalhador do sistema do FGTS, isto é, que o empregado não possua qualquer vínculo laboral no período de três anos, para poder haver o levantamento das quantias depositadas. Outros, contudo, extraem do seu comando, o entendimento de que a inatividade da conta é específica a cada contrato de trabalho, possibilitando ao empregado, após o lapso de três anos, movimentá-la quanto àquele vínculo específico.

Ao apreciar feitos anteriores, busquei uma interpretação literal dos dispositivos ensejadores de saque nas contas vinculadas. Sorvendo o conhecimento de Savigny, onde interpretação é a reconstrução do pensamento contido na lei, reexamino o meu entendimento com o fim de alcançar a perfeita harmonia e coerência entre a ordem constitucional e o sistema legal vigente.

O intuito do legislador, como visto acima, ao criar o FGTS, foi garantir um mínimo de recursos materiais ao trabalhador nos casos de término do seu contrato de trabalho, possibilitando sua mantença através da multa imposta ao empregador, no caso de despedida sem justa causa, ou na inatividade da conta após o transcurso do lapso temporal de três anos, entre outros casos. Dirigiu-se, sempre, à conta vinculada do trabalhador, individualizada, em nada se referindo ao sistema do FGTS. E não poderia ser diferente, eis que, repito, buscou sempre proteger o hipossuficiente (empregado) após a extinção do seu contrato de trabalho.

Tal interpretação não é isolada, senão vejamos recente decisão do STJ:

 

"FGTS. SAQUE.  LIBERAÇÃO.  ART. 20, VIII, DA LEI Nº 8.036/90 e  LEI
Nº 8.678/93.  PRELIMINAR.  LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DA UNIÃO. 
INEXISTÊNCIA.
1.  A CEF tem legitimidade exclusiva para figurar no pólo passivo das ações propostas
por titulares de contas vinculadas ao FGTS Incidente de Uniformização de 
Jurisprudência  nº 77.791-SC, DJU 30/6/97).
2. Em face do decurso do prazo de três anos de paralisação das referidas contas, 
previsto na Lei nº 8.036/90, fica autorizado o respectivo levantamento.
3. Precedentes.
4. Recurso especial não conhecido."
(RESP 182664/CE – 1998/0053660-4 / 17.12.99 / Relator: Min. Paulo Gallotti – Segunda
 Turma do STJ)

Assim o é, porque o FGTS encontra-se constitucionalmente resguardado entre os direitos sociais, firmando-se como norma de ordem pública, com característica de imperatividade. Ademais, os direitos sociais constituem uma decorrência natural de um dos objetivos fundamentais da República – "erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais" (artigo 3º, inciso III).

Partindo desse prisma, entendo que se deve ter como parâmetro as contas fundiárias individualmente consideradas em relação a cada vínculo empregatício, para, a partir daí, com o término de créditos decorrentes de depósitos, iniciar-se o cômputo do prazo de três anos necessários ao seu resgate. É a dicção da lei (art. 20, VIII, lei nº 8.036/90 e art. 35, VIII, do Decreto nº 99.684/90).

No feito em tela, os documentos carreados aos autos demonstram que o postulante realizou sete contratos de trabalho, com empregadores diversos (fls. 07, 08 e 11), onde, apenas no último deles – Condomínio Edifício Renoir e Monett – ainda não houve o transcurso do prazo de três de sua extinção.

Assim, com base no artigo 20, inciso VIII, da Lei nº 8.036/90, julgo procedente em parte os pedidos, para assegurar o direito do requerente,
José Luiz de Arimatéia, de sacar os valores existentes em suas contas vinculadas, salvo quanto àquela referente ao Condomínio Edifício Renoir e Monett, devendo ser expedido, para tanto, alvará de levantamento.

Quanto à sucumbência, embora a CEF não lhe tenha negado a possibilidade de levantamento na esfera administrativa, resistiu em âmbito judicial quanto ao saque de algumas contas, daí porque, com fulcro no art. 34, do CPC, condeno-a nas custas e honorários advocatícios, que arbitro em 5% dos valores existentes nas contas fundiárias do requerente.

P. R. I.

 

Aracaju, 14 de maio de 2001.

 

Ricardo César Mandarino Barretto

Juiz Federal da 1ª Vara