PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA
FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe
Processo nº 2003.85.00.007566-2 – Classe 10000 – 2ª VaraAção Sumária
Partes: ... Luciene Pereira de Jesus
... Caixa Econômica Federal - CEF
EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. SERASA. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. NEXO DE CAUSALIDADE E DANO CONFIGURADOS.
I – Provando-se a ocorrência de negativação indevida do nome da autora no cadastro do SERASA, por parte da instituição financeira, é de ser esta condenada por danos morais, desde quando tal conduta resultou em constrangimento indenizável.
II – A indenização por danos morais deve observar a extensão do dano, a conduta do agente, a natureza punitiva do quantum aplicado, bem como, e no caso específico, o relacionamento da cliente com a instituição financeira.
S E N T E N Ç A:
(Relatório)
Luciene Pereira de Jesus ingressa com ação sumária de indenização por danos morais contra a Caixa Econômica Federal - CEF, alegando que, após ter sido contemplada no consórcio nacional de distribuidores Ford, não pôde receber o veículo respectivo, tendo em vista constar uma anotação restritiva de seu nome no cadastro do SERASA. Aduz que, após se certificar do problema, constatou ter sido a dita negativação originada de um cheque devolvido pela agência 2186 da requerida. Afirma que se dirigiu à instituição financeira demandada, havendo constatado tratar-se de equívoco a mencionada informação, eis que o suposto cheque devolvido sequer pertencia ao talonário da requerente. Requer a procedência do pedido, para o fim de que seja condenada a requerida ao pagamento de indenização, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Designei audiência de conciliação, instrução e julgamento.
Realizado o referido ato, as partes não restaram acordes, apresentando, então, a demandada peça contestatória, na qual requer a improcedência do pedido, sob a alegação de que, mesmo tendo havido erro da CAIXA, não houve dano moral à Autora na modalidade porque a este risco ela se expõe quase que cotidianamente, haja vista ter a mesma emitido, anteriormente, vários cheques sem suficiente provisão de fundos.
Colhido o depoimento pessoal da autora (fls. 17/18).
No ato, designei a presente data, no intuito de publicar a sentença, conforme termo de fl. 16.
(Fundamentação)
1 – Da gratuidade judiciária:
Inicialmente, há de se deferir o benefício da gratuidade judiciária à requerente, eis que a sua afirmação contida na inicial não se encontra contrariada pela prova ora acostada aos autos.
2 – Considerações prévias:
As partes manifestaram-se, em audiência, pela desnecessidade de produção de outras provas, além das que já constam dos autos.
De outra parte, inexistem preliminares a solver.
3 – Do mérito:
No caso, inexiste controvérsia quanto ao equívoco da Caixa Econômica Federal, tendo em vista que se encontra provado o erro quanto à negativação da autora nos cadastros do SERASA, fato este admitido, expressamente, pela requerida.
Com efeito, na própria contestação, a CEF admite que uma outra correntista da Caixa emitiu um cheque sem a correspondente provisão de fundos, acarretando a devolução pelo motivo 12 (segunda apresentação), provocando o encerramento da conta. E, a seguir, explicita: Quando do lançamento da informação no processamento de dados, a empresa contratada para o serviço digitou o número da conta erradamente, de modo que foi enviada a conta da Autora para o Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos do Banco Central, de onde a SERASA “pescou” a informação.
Assim, o fato é incontroverso.
Alega, no entanto, a CEF que inexistiu dano moral indenizável, porque a autora, em oportunidades anteriores, teria emitido 40 (quarenta) cheques sem suficiente provisão de fundos, razão pela qual, mesmo tendo havido erro da CAIXA, não houve dano moral à Autora na modalidade porque a este risco ela se expõe quase que cotidianamente.
Primeiramente, há de se ressaltar que a requerente não teve quarenta cheques devolvidos, por insuficiente provisão de fundos. É que, desse número, vinte e nove títulos foram devidamente pagos pela requerida, apenas gerando adiantamento a depositante e excesso sobre o limite do cheque especial, como admite a contestante. Assim, inexistiu devolução dos mencionados cheques. É que, se a CEF efetivou o seu pagamento, mesmo que excedendo o saldo em conta, é porque a cliente possuía lastro financeiro para suportar a obrigação.
A comprovação existe, apenas, em relação a onze cheques que foram efetivamente devolvidos. Muito embora tais cheques não guardem relação com o equívoco cometido pela CEF, tal fato importa na definição do valor indenizável, tendo em vista que um dos critérios para fixação do dano moral, no caso, é exatamente a postura e a conduta do correntista em relação à instituição financeira.
O dano moral, pois, está plenamente configurado. Não é outro o entendimento da jurisprudência pátria, conforme julgado abaixo:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSCRIÇÃO DO NOME DO CLIENTE NO SERASA. NEGATIVAÇÃO CADASTRAL INDEVIDA. INEXISTÊNCIA DE INADIMPLÊNCIA. DANO MORAL CARACTERIZADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA.CORREÇÃO MONETÁRIA. ATO ILÍCITO. SÚMULA 43 DO STJ.
- A inscrição indevida do nome do cliente em órgãos de negativação cadastral constitui constrangimento ilegal, ensejando indenização por danos morais, independentemente de ocorrência de prejuízo patrimonial.
- Tratando-se de ato ilícito, a correção monetária é devida da data em que o dano se concretizou, nos termos da súmula 43 do STJ.
- Apelação improvida e recurso adesivo parcialmente acolhido.
(Origem: TRF – PRIMEIRA REGIÃO, Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 01001018614, Processo: 199901001018614 UF: MA, Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR, REL. JUIZ JULIER SEBASTIÃO DA SILVA (CONV.), Data da decisão: 12/12/2001, Documento: TRF100122721 DJ DATA: 23/01/2002, PÁGINA: 38).
Passo, então, à análise do seu quantum de que é responsável efetiva a demandada.
Para a caracterização do dano moral não é necessário, como é sabido, a ocorrência de um dano material, demonstrável e concreto. Tal incongruência já foi devidamente superada no tempo. A própria Constituição Federal de 1988 trouxe, em norma potenciada, a possibilidade da cumulação de ambos, o que evidencia a sua diferença.
O dano moral é, pois, na lição da doutrina autorizada, a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão patrimonial. Seja a dor-física – dor-sensação, como a denomina Carpenter -, nascida de uma lesão material; seja a dor moral – dor-sentimento -, de causa imaterial. (DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A reparação dos danos morais. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 8).
É mister ressaltar que, por ser um dano, não obstante por vezes imbricado com o dano material, com este não se confunde. A sua existência deve ser inferida, inclusive, de forma presumida. Neste aspecto, há a necessária avaliação do juiz. É este que irá sopesar os diversos elementos constantes dos autos.
Não há dúvida que, sendo a autora negativada indevidamente, por culpa da demandada, tal fato importa em dano moral.
A quantificação do mesmo, de igual sorte, resulta de avaliação prudente do julgador. No caso dos autos, a extensão do dano foi acentuada, porque repercutiu, inclusive, em transação comercial que a requerente pretendia efetivar perante o consórcio nacional de distribuidores Ford, no sentido de adquirir determinado veículo.
Por outro lado, há de se sopesar o fato de que a autora, apesar de não ser responsável pela negativação ocorrida, revelou-se uma cliente que, durante o vínculo havido com a CEF, emitiu onze cheques sem suficiente provisão de fundos.
Por fim, é preciso assinalar que, apesar de ter o requerente pedido um quantum específico para a condenação da demandada, o dano moral é arbitrado pelo juiz e, como já dito, dentro das balizas de seu prudente arbítrio. Assim, embora tal quantia tenha sido levada em conta para efeito de definição do valor de alçada e conseqüente pagamento de custas processuais, não vincula o julgador, necessariamente. Ademais, a condenação em valor menor do que o pedido não configura procedência em parte do pleito, tanto porque o pedido central é para a indenizabilidade do dano moral. Reconhecido este, procedente é a demanda.
(Dispositivo)
Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial, condenando a Caixa Econômica Federal – CEF a pagar à parte autora a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de danos morais, devendo tal quantum ser corrigido monetariamente, desde a data em que se concretizou o fato (Súmula 43 do STJ), isto é, dia 01/10/2003, com a aplicação de juros de mora, devidos desde a citação válida, ou seja, 14/11/2003.
Condeno, ainda, a requerida ao pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios que arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
Sentença publicada em cartório, nesta data, (conforme termo respectivo), de cujo ato foram devidamente cientificadas as partes, com antecedência (fl. 16).
Registre-se.
Aracaju, 27 de fevereiro de 2004.
Ronivon de Aragão
Juiz Federal Substituto