Processo nº 2003.7496-7 - Classe 02000 - 3ª Vara.
Ação: Mandado de Segurança
Partes:
Impetrante: EURICO CÉSAR SOUZA NASCIMENTO
Impetrados: REITOR DA UNIVERSIDADE TIRADENTES – UNIT E OUTRO
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. MATRÍCULA EM UMA DISCIPLINA. COBRANÇA DE SEMESTRALIDADE INTEGRAL. INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DE EQUIVALÊNCIA ENTRE A PRESTAÇÃO EXIGIDA DO ALUNO E A CONTRAPRESTAÇÃO OFERECIDA PELA INSTITUIÇÃO DE ENSINO. SEGURANÇA CONCEDIDA.
SENTENÇA
Vistos, etc.
EURICO CÉSAR SOUZA NASCIMENTO ingressa com ação de segurança contra ato do Magnífico REITOR DA UNIVERSIDADE TIRADENTES - UNIT, alegando que estava a cursar o último período de Direito, preparando-se para a colação de grau e arcando com todas as despesas, quando, ao final do semestre, fora reprovado em uma das disciplinas.
A fim de matricular-se na disciplina em que fora reprovado, de apenas quatro créditos, precisou assinar um contrato segundo o qual teve que pagar, no ato da matrícula, a primeira mensalidade e terá que pagar, no decorrer do semestre, o equivalente a vinte créditos.
Aduz, com esteio no Código de Defesa do Consumidor e na Carta Magna, ser abusiva a cláusula V do referido contrato, que estabelece o pagamento do semestre, integralmente. Informa somente haver pago o que lhe foi determinado para garantir a matrícula na disciplina da qual depende para formar-se.
Requer: a) a concessão de medida liminar “inaudita altera pars”, visando a permitir o livre exercício de sua atividade estudantil, determinando que as autoridades coatoras não adotem qualquer providência administrativa que impeça o exercício de tal direito, sob o argumento de inadimplência do impetrante; b) a notificação das autoridades coatoras, para que prestem as devidas informações; c) a confirmação da medida liminar, declarando abusivos e ilegais quaisquer atos tendentes a lesar seu direito líquido e certo, condenando as autoridades responsáveis ao pagamento das custas processuais.
Junta procuração de fl. 16 e os documentos de fls. 17/31.
Liminar deferida em decisão de fls. 34/36.
Em informações prestadas às fls. 45 usque 48, o Magnífico Reitor da UNIT diz estar ausente uma das condições da ação: o interesse de agir, pois inexiste, in casu, lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo que autorizasse a utilização do presente remédio jurídico. Afirma jamais ter havido qualquer óbice ao acesso do aluno ao Campus, como também ao seu ingresso na sala, a fim de assistir à aula da disciplina para a qual se matriculou.
Elucida que a única medida administrativa adotada, autorizada por lei, seria no sentido de não efetuar a matrícula do aluno que se encontre inadimplente. Aduz não haver receio quanto à situação do impetrante, por faltar-lhe apenas um período para se formar, a não ser que o aluno não obtenha a aprovação.
Ressalta a inadequação da via eleita, pois a proporcionalidade das prestações é questão que exige dilação probatória, impossível na espécie.
Assevera que o valor pago pelo impetrante, mesmo aplicando o entendimento por ele explicitado, teria sido menor do que efetivamente devido.
Junta a procuração de fl. 49.
Às fls. 51/54, a ASSOCIAÇÃO SERGIPANA DE ADMINISTRAÇÃO S/C LTDA. diz estar ausente o interesse processual, devendo ser o presente feito extinto sem julgamento do mérito. Destaca a inadequação da via eleita, por não admitir dilação probatória e sustenta que o discente não efetuou pagamento algum de mensalidade no semestre em curso.
Junta a procuração de fl. 55 e os documentos de fls. 56 usque 61.
O impetrante rebate os argumentos da autoridade apontada como coatora, bem como da litisconsorte passiva, às fls. 64/65.
O Ministério Público absteve-se de manifestar-se sobre o mérito, em razão da natureza da ação – fls. 67/74.
Autos conclusos para prolação de sentença.
É O RELATÓRIO.
PASSO A FUNDAMENTAR E DECIDIR.
Inquestionável a competência da Justiça Federal para apreciar a lide, haja vista que, nos termos do art. 209 da Constituição Federal, o ensino é livre à iniciativa privada, submetendo-se as instituições de ensino, contudo, à autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público e ao cumprimento das normas gerais da educação nacional, aqueles atos e estas normas editadas pela União, quando se tratar de ensino superior.
A preliminar de carência de ação, suscitada pela impetrada e pela litisconsorte passiva, por ausência de provas pré-constituídas, não merece acolhimento, pois o requerente demonstrou a qualidade de aluno do curso de Direito da UNIT, bem assim a ausência de proporcionalidade na cobrança efetivada para o semestre letivo.
No mérito, observo que a educação é direito de todos, como consignado no art. 205 da Carta Política e o ensino será ministrado de modo a propiciar a todos igualdade para o acesso e permanência na escola, como assentado no art. 206 da Lei Suprema.
Por outro lado, a Lei no 9.870/99 veda às instituições de ensino a imposição de quaisquer penalidades pedagógicas aos alunos, por motivo de inadimplência, como positivado no seu art. 6o, e impedir o livre exercício estudantil do aluno que já efetuou pagamento da matrícula, estando prestes a concluir a grade curricular e a colar grau, por causa da inadimplência, constitui uma supressão do direito à educação, sendo a maior das sanções pedagógicas.
De mais a mais, o contrato de prestação educacional não pode ser rompido unilateralmente pela UNIT, por inadimplemento de obrigação pecuniária pelo aluno, devendo a instituição de ensino, com base em cláusula contratual descumprida, promover a cobrança do seu crédito através de processo judicial adequado, que é o método constitucional e legal posto ao seu dispor.
As decisões judiciais a seguir transcritas assentam a diretriz a ser adotada na matéria:
“MENSALIDADE ESCOLAR. Curso de Engenharia. Matrícula em uma disciplina, cobrança de semestralidade integral. Deve ser respeitada a equivalência entre a prestação cobrada do aluno e a contraprestação oferecida pela escola. Se falta apenas uma disciplina a ser cursada, não pode ser exigido o pagamento de semestralidade integral, embora não se exija, nesse caso, a exata proporcionalidade. Recurso conhecido e provido.” (STJ – RESP 200101012572 – MG – 4ª T. – Rel. Ruy Rosado de Aguiar – DJ 20/05/2002 – p. 152).
“MENSALIDADE ESCOLAR. DEPENDÊNCIA. Não viola o disposto no art. 51, IV do CDC a decisão que considera abusiva a cobrança de alunos que concluíram a última série, de mensalidade integral, para cursar apenas uma disciplina, em que não obtiveram aprovação.” (STJ – RESP 199500427729 – SP – 3ª T. – Rel. Eduardo Ribeiro – DJ 19/12/1997 – p. 67489).
Saliente-se ainda que os procedimentos administrativos internos da UNIT não podem sobrepor-se às decisões judiciais e que estas devem ser cumpridas na forma determinada, assegurando-se à parte insatisfeita os recursos legais.
POSTO ISSO, considerando relevantes os fundamentos fáticos e jurídicos do pedido, reconheço como líquido e certo o direito deduzido em Juízo pelo impetrante, determinando à autoridade coatora que não crie qualquer óbice à sua atividade estudantil durante o semestre letivo em curso, até a colação de grau, garantindo à UNIT a cobrança ao autor do valor proporcional à mensalidade escolar estabelecida, em relação à disciplina cursada, no mais confirmando a medida liminar deferida.
Condeno o impetrado ao pagamento das custas processuais.
Sem honorários, em face da Súmula nº 512 da Corte Suprema.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
P.R.I.
Aracaju, 29 de abril de 2004.