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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

 

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Ação: Mandado de Segurança

Impte: Carlos Alberto de Oliveira Silva e Outros

Impdo: Delegada Regional do Trabalho

Juiz Federal: Ricardo César Mandarino Barretto

 

Administrativo. Mandado de Segurança. Exercício da profissão de jornalista. Inexegibilidade do diploma de jornalista.

Segurança concedida.

 

SENTENÇA:

Vistos, etc...

Carlos Alberto de Oliveira Silva e Outros, qualificados na inicial de fls. 02 e por seu advogado constituído nos instrumentos de mandato de fls. 07 e 08, impetram o presente mandado de segurança contra ato imputado à Delegada Regional do Trabalho, objetivando que seja determinada à autoridade impetrada que efetue o registro dos impetrantes na profissão de jornalista, sem exigir o correspondente diploma do curso de jornalismo ou a apresentação de comprovante de exercício anterior da profissão.

Fundamentam sua pretensão em arrazoado de fls. 03/06, aduzindo que, por força da liminar concedida nos autos da ação civil pública n.º 2001.61.00.25946-3, em curso na 16ª Vara Federal da Seção Judiciária de São Paulo, foi determinado que a União Federal deixasse de exigir o diploma do Curso Superior em Jornalismo para registro profissional junto ao Ministério do Trabalho, decisão esta ainda vigor, tendo em vista que foi negado o efeito  suspensivo no agravo interposto perante o TRF da 3ª Região.

Com base na decisão, protocolaram requerimento administrativo junto à DRT de Sergipe, cujo pedido foi negado pela impetrada, que teria baseado sua decisão em parecer desfavorável do Sindicato dos Jornalistas do Estado de Sergipe e exigido a comprovação de exercício anterior da profissão de forma regular, em total desrespeito àquilo que foi determinado judicialmente.

Juntam documentos, pedem a liminar e, ao final, a concessão da segurança.

Reservei-me para apreciar o pedido de liminar para após a notificação da autoridade coatora que, em suas informações, alega, preliminarmente, a inadequação da via eleita, uma vez que bastaria aos impetrantes comunicar ao Juízo da 16ª Vara Federal de São Paulo o descumprimento da liminar.

No mérito, rechaça a pretensão dos impetrante, afirmando que o ato atacado buscou apenas verificar se os impetrantes preenchiam os pressupostos necessários ao desempenho da função, tal como determinado na liminar.

Em decisão de fls. 36, indeferi a liminar.

Em seu parecer, o MPF opina pela concessão da segurança.

É o relatório.

A preliminar de inadequação da via eleita improcede. Com efeito, a negativa de registro se deu por entender a autoridade que, no exercício de suas funções, tinha competência para apreciar a existência ou não de outros pressupostos necessários ao exercío da profissão de jornalista, sem exigir, contudo, o diploma em curso superior em jornalismo, conforme determinava a decisão.

Assim, mesmo que houvesse a comunicação ao juízo prolator da decisão, a situação permaneceria inalterada, porque as exigência feitas pela impetrada não foram objeto de apreciação na referida decisão judicial.

Rejeito a preliminar.

No mérito, a razão está com os impetrantes. Vejamos.

Em sua decisão, a qual adoto também como razão de decidir, a MM. Juíza Federal Carla A. Rister[1], assim se manifestou:

“Outra irrazoabilidade na exigência do diploma ao jornalista consiste na decorrência lógica que isso cria, levantada por um dos nossos parecerista a que se refere o autor na inicial: caso tal exigência prevalecesse, o economista não poderia ser o responsável pelo editorial da área econômica, o professor de português não poderia ser o revisor ortográfico, o jurista não poderia ser o responsável pela coluna jurídica e, assim, por diante, gerando distorções em prejuízo do público, que tem o direito de ser informado pelos melhores especialistas da matéria em questão. Outrossim, verifica-se também os locais de escassa população, em que inexistem os profissionais com diploma, em que a atividade jornalística restaria comprometida, em detrimento do público, que tem direito à informação (art. 5º, inciso XIV, da C.F.).

Sobre o tema da liberdade de imprensa, trago as oportunas palavras de Jean Rivero, trazidas em sua obra “Les libertés publiques” (Tome 2, PUF, 6ª edição, 1997, pg. 233), cuja universalidade de suas premissas pode ser aplicada ao presente caso, em que podera: “É necessário sublinhar-se que a profissão de jornalista é uma das raras profissões a cujo acesso não se exige diploma algum, nenhuma formação anterior,  nenhuma qualificação particular. Há escolas de jornalismo, mas a passagem por uma delas não é requerida para se adentrar na profissão. Essa total liberdade de recrutamento tem os seus aspectos positivos, sendo que o aprendizado pela prática atende bem às peculariedades da profissão. A despeito disso, é mesmo paradoxal que uma atividade que confere um poder excepcional sobre o conjunto da opinião pública seja subtraída da verificação de qualidades daqueles que a exercem” (destaquei).

Nem seria necessário aprofundamento em demasia da questão, na atual da fase processual, mas incumbe notar que adoto posicionamento favorável ao caráter vinculante da Convenção Americana de Direitos Humanos, em face da sua ratificação pelo Brasil aos 25.09.92, conforme, aliás, já defendi na monografia: “A relação entre o ordenamento internacional e ordenamento interno em matéria de direitos humanos” (in Boletim dos Procuradores da República , Ano II, n.º 16, Agosto/99). Assim, verifico que o art. 13 da referida Convenção consagra a liberdade de expressão e a proibição de qualquer forma de obstáculos ou meios indiretos ao direito de informação, como se verifica com a exigência do diploma de nível superior para o exercício da profissão de jornalista.

Concluo, assim, que não houve a recepção do art. 4º, inciso V, do Decreto-lei n.º 972/69, pela CF/88, no que tange è exigência de nível superior para o exercício da profissão de jornalista. Porém, não acredito que a exigência do registro junto ao Ministério do Trabalho seja de todo despropositada, desde que não se faça a exigência do referido diploma, tendo em vista que, em todos as profissões, é salutar que exista uma entidade de controle e fiscalização daquelas pessoas que a exercem de modo profissional. Nesse sentido, trago novamente as palavras de Jean Rivero, na obra citada, pg. 232: “A qualidade de jornalista profissional supõe duas condições de fundo: - a profissão deve ser exercida a título principal, de forma regular e remunerada, em uma publicação periódica, uma agência de imprensa, ou em rádio e televisão; - o interessado deve ter esta como a principal de suas fontes de renda (Código do Trabalho, artigo L. 761-2). A reunião dessas condições é constatada pela Comissão da Carteira de Identidade Profissional. A carteira permite ao titular prevalecer-se de medidas tomadas pelas autoridades administrativas em favor dos representantes da imprensa”. Assim, tenho que a idéia subjacente ao trecho mencionado pode ser aproveitada no presente, ou seja, o registro em si mesmo não importa em cerceamento de direitos, diferentemente do que ocorre com a exigência do diploma de nível superior.

Resta presente, outrossim, o requisito do perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, na medida em que aqueles que exercem a profissão de jornalista sem o devido registro (por não possuírem o diploma) podem vir a ser autuados a qualquer momento pela ré, bem assim sofrer constrangimentos de toda sorte.”

Como se vê, a douta Juíza prolatora da decisão entendeu ser inexigível o diploma de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão de jornalista e, embora tenha traçado alguns delineamentos acerca da presença de outros requisitos para aqueles que exercem a profissão sem o referido diploma, não deixou ao critério dos órgãos de fiscalização, no caso as DRTs, a análise da presença ou não destes requisitos, para o fim de procederem ao registro. Se os impetrantes, uma vez registrados, não exercerem profissionalmente a função, isto é questão a ser apreciada posteriormente, não quando do simples registro junto àquele órgão.

De mais a mais, não há cabimento em exigir-se prova do exercício da profissão, justamente de quem busca autorização para exercê-la. Chegar-se-ia ao absurdo, com isso, se a OAB, o Conselho de Medicina ou o CREA exigissem de quem pretende ser advogado, médico ou engenheiro, a comprovação de exercício profissional anterior.

Assim, a autoridade coatora ao negar o registro, exigindo que os impetrantes apresentassem comprovante de exercício anterior da profissão, excedeu sua competência, porque, se se tratava de efetuar o registro, não dispunha de poderes para tanto.

Isto posto, concedo a segurança para determinar que a autoridade impetrada proceda ao registro dos impetrantes na profissão de jornalista, abstendo-se de exigir a demonstração de exercício anterior na profissão.

Condeno a impetrada no ressarcimento das custas adiantadas pelos impetrantes.

Sem honorários, por força da Súmula 512, do STF.

Sentença sujeita ao reexame.

P. R. I. C.

Aracaju, 24 de março de 2003.

 

 

Ricardo César Mandarino Barretto
Juiz Federal - 1ª Vara


[1] Fls. 34/35 destes autos