Processo
nº 98.0004326-8
Ação de Mandado de Segurança.
Impetrante – Renato Tavares
Moura.
Impetrados – José Roberto Lima
Bispo – Presidente do CARI/20ª e outro.
Litisconsorte – União Federal.
EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL.
1.
Apreensão definitiva de CNH e suspensão do direito de dirigir requerem
precedência de procedimento administrativo regular.
2.
Hipótese em que houve desrespeito aos ditames constitucionais.
SENTENÇA
Trata-se
de Mandado de Segurança em que o impetrante alega que, no dia 07/09/1998, seu
veículo foi interceptado por agentes da Polícia Rodoviária Federal, tendo
sido submetido a um teste de “bafômetro”, contra a sua vontade, e, de
imediato, foi-lhe aplicada multa. Alega,
também, que, sumariamente, foi-lhe aplicada pena de recolhimento da sua
Carteira de habilitação, sem que lhe fosse facultado, antes, qualquer
oportunidade de defesa.
Após
discorrer sobre o direito à ampla defesa e ao contraditório, pediu que fosse
declarada a ilegalidade da atuação policial no que tange à retenção sumária
do documento de habilitação e que cópia da sentença fosse anexada ao
procedimento administrativo, iniciado contra o impetrante.
Documentos
foram trazidos aos autos[1].
O
pedido de liminar foi deferido[2],
e determinado às autoridades impetradas que devolvessem, ao impetrante, a sua
CNH, posto que ainda não tinha sido imposta, até então, “qualquer sanção
impeditiva desse direito”.
As
informações vieram aos autos[3],
tendo sido argüido que o procedimento adotado pelos agentes da Polícia
Rodoviária Federal, estava dentro das disposições do Código Brasileiro de
Trânsito.
A
União compareceu aos autos, apresentando contestação e requerendo que o Juízo
a admitisse na qualidade de litisconsorte passivo necessário.
Na sua peça contestatória, asseverou que: 1) o nível de álcool
encontrado no sangue do autor fora de 1,2 g, o que equivale ao dobro do
permitido na Lei; 2) o art. 165, do CTB considera tal infração gravíssima,
impõe a multa de cinco vezes o valor de 180 UFIRs, além da retenção do veículo,
até que condutor habilitado se apresente, e recolhimento do documento de
habilitação; 3) uma vez que a conduta do impetrante revelara-se prejudicial
à comunidade, os patrulheiros estavam autorizados a adotar a medida que fora
objeto desta ação, ou seja, recolher a CNH, posto que é inerente ao poder
de polícia, a auto-executoriedade; 4) o impetrante foi notificado em
16/09/98, para apresentar defesa escrita, em 30 dias e deixou transcorrer, em
branco, tal prazo, fazendo-se presumir verdadeiras as acusações que lhe
foram imputadas, o que levou a CARI (Comissão
Administrativa de Recurso de Infração) da 20ª Superintendência da
Polícia Rodoviária Federal, considerando a natureza da transgressão, a
sugerir a suspensão do direito de dirigir por um prazo de 180 dias.; 5) a
jurisprudência colacionada aos autos não socorre o autor, posto que editada
em data anterior à vigência do novo Código.
Por
fim, aduziu a União, que o impetrante, o qual tivera a devolução da
Carteira por meio da liminar, não compareceu para devolver a mesma e cumprir
a sanção imposta, após a conclusão do processo administrativo que concluíra
pela sua culpabilidade.
Admitido
o litisconsórcio passivo necessário[4]
O
MPF opinou pela extinção do processo sem julgamento do mérito, sob o
argumento de que o objeto da ação perecera, em vista de ter sido satisfativa
a liminar deferida.
O
MM Juiz então condutor do
processo exarou sentença extinguindo-o, sem julgamento do mérito, porque
entendeu que o pedido restou prejudicado.
A
litisconsorte apelou, e o Egrégio TRF anulou a sentença, determinando o
retorno dos autos, para que o mérito da causa fosse apreciado.
RELATEI.
DECIDO.
Em
princípio, deve-se deixar muito bem esclarecido que a lide se limita à análise
da validade ou não da apreensão da Carteira
Habilitação, e conseqüente restrição ao direito de dirigir, antes
do julgamento do procedimento administrativo.
Isto está patenteado:
1)
no pedido autoral expresso nestes termos: “que seja
declarado expressamente na sentença a ilegalidade da autuação policial no
que tange à subtração sumária do documento (...)”.
2)
na decisão concessiva de liminar, em que o MM Juiz assim
determinou: “defiro a liminar
requerida, determinando às autoridades coatoras que, devolvam ao
impetrante, imediatamente, a sua CNH, possibilitando a que ele possa dirigir
veículo, vez que não foi imposta, até então, qualquer sanção
impeditiva desse direito. (apenas
os grifos são nossos).
O
que esta Magistrada sentenciante deixa claro, desde agora, é que, se, ao
final, decidir pela concessão da Segurança, significa, tão somente, que o
alcance da decisão, como não poderia deixar de ser, estará circunscrita ao
pedido e, em conseqüência, será reconhecido o direito apenas em relação a
não apreensão definitiva da CNH e suspensão do direito de dirigir veículos
antes de procedimento administrativo com decisão que assim determine.
Em outras palavras, após regular procedimento, se foi aplicada a pena
acima descrita, ela não estará amparada por este Mandamus,
uma vez que isto implicaria em decisão extra
petita, vedada pelo nosso ordenamento jurídico, mais especificamente,
o art. 460 (parte final), do CPC.
Pois
bem, tanto um dos impetrados como a litisconsorte alegam que o atual CTB
autoriza a medida tomada pelo agente policial, sob o argumento de que havia
uma atividade que colocava em perigo a segurança e saúde de outras pessoas,
e, no dizer da União, por “se tratar de infração instantânea comprovada
através de auto de infração, a administração age de pronto, aplicando
sumariamente, a sanção sem a defesa”.
Entretanto, o nosso ordenamento não aplaude este tipo de argumentação e há que se analisar o disposto no referido Código, sem deslembrar os preceitos da nossa Carta Republicana/88, para, da análise, extrair-se a tese sustentável e sem dúvida, quem analisou com extrema felicidade a situação foi o MM Juiz Edmilson Pimenta, prolator das decisão concessiva de liminar, consoante mostraremos abaixo.
Realmente,
como bem disse o ilustre Magistrado, a retenção do veículo e o recolhimento
do documento de habilitação são medidas administrativas adotadas a título
precário, com o escopo de evitar, de imediato, qualquer potencialidade de
dano “à vida ou à incolumidade física das pessoas”.
Ou seja, passado este momento de precaução, deverá ser restabelecido
o direito, até que decisão administrativa, em que seja assegurada a defesa e
o contraditório, conclua pela aplicação de penalidade ao infrator.
Servindo-me,
ainda, da fundamentação do prolator da medida liminar, realmente, mesmo que
uma das sanções previstas no CTB, para a infração atribuída ao impetrante
seja a de suspensão do direito de dirigir veículos, esta penalidade somente
poderá ser aplicada, de forma definitiva, como pretenderam os impetrados, após
o julgamento procedente do auto de infração, em decisão irreformável,
administrativamente. Em verdade,
o auto de infração é, na verdade, a peça inicial do procedimento, sendo
obrigatório que se assegure ao autuado a defesa e o trâmite, sem qualquer
eiva de nulidade. Admitir o
pretendido pelos impetrados e litisconsorte é transformar o Auto de Infração
em verdade absoluta, coisa que a Lei não fez e nem poderia. Suponha, então, que um auto de infração desta natureza
seja julgado improcedente e durante todo o trâmite do seu julgamento
definitivo, o autuado tenha ficado sem a sua CNH, e suspenso do direito de
dirigir?
Percebe-se,
então, que teve inteira razão o MM Juiz já referido, quando ponderou que
“Somente se imposta a penalidade de suspensão do direito de dirigir, por
decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, é que a CNH
deverá ser recolhida, enquanto durar o impedimento para conduzir veículo”.
Diante
de tudo quanto foi exposto, concedo a
Segurança, nos limites do pedido, consoante já explicitado acima, ou
seja, para determinar que o impetrante tem o direito de não ter sua CNH
apreendida, em definitivo, e de não receber, antes de regular procedimento
administrativo, a sanção de suspensão do direito de dirigir veículos.
Custas
pelos sucumbentes.
Sem
honorários, nos termos das Súmulas: 105, do STJ, e 512, do STF.
P. R. I.
Aracaju,
19 de dezembro de 2001.
Telma Maria Santos
Juíza Federal Substituta da 3ª Vara.