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PODER JUDICIÁRIO - JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Estado de Sergipe

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Processo nº 2006.85.00.03324-3 - Classe 1 -  3ª Vara

Ação Civil Pública

Partes:

            Autor: Ministério Publico Federal

Ré:     União Federal             

  

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DENOMINAÇÃO DE PRÉDIOS PÚBLICOS DA JUSTIÇA FEDERAL DE SERGIPE. HOMENAGENS A MAGISTRADOS FEDERAIS E        EX-REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE. CONSTITUCIONALIDADE. NÃO-RECEPÇÃO DO ARTIGO 1º DA LEI Nº 6.454/77 PELO ARTIGO 99 DA CARTA MAGNA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, MORALIDADE E IMPESSOABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. INAPLICABILIDADE DA RESOLUÇÃO Nº 497-CJF. INOCORRÊNCIA DE FAVORECIMENTO PESSOAL OU VANTAGEM ECONÔMICO-FINANCEIRA PARA OS HOMENAGEADOS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO PARA O PATRIMÔNIO PÚBLICO. INDEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA REQUERIDA.

 

  

                                                                                                       D E C I S Ã O

 

 

Trata-se de Ação Civil Pública promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face da UNIÃO FEDERAL, em que se insurge o autor contra a denominação do Forum da Justiça Federal em Itabaiana-SE, que tem o nome do Juiz da Federal Vladimir Souza Carvalho, titular da 2ª Vara desta Seção Judiciária; do Fórum da Justiça Federal em Estância-SE, que tem o nome do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José de Castro Meira; do Edifício-Sede do Juizado Especial Federal em Aracaju, que tem o nome da Desembargadora Federal Margarida de Oliveira Cantarelli; e do Pavilhão existente neste último Prédio, que foi batizado com o nome do ex-Reitor da Universidade Federal de Sergipe, Doutor José Fernandes de Lima, esclarecendo que as aludidas denominações foram atribuídas por deliberação do Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região e estão explicitadas em letreiros dispostos sobre cada entrada principal dos mencionados prédios.

 

Argumenta o MPF que é inquestionável que as indigitadas homenagens beneficiam pessoas vivas, contrariando o disposto no art. 1º da Lei nº 6.454, de 24 de outubro de 1977, violando os princípios constitucionais da legalidade, moralidade e impessoalidade, previstos no art. 37 da Constituição Federal.

 

Acrescenta que o ato inquinado é de natureza administrativa e está desrespeitando a lei acima mencionada, o que afronta o princípio da legalidade, sendo que a moralidade administrativa foi agredida, na medida em que o ato atendeu à satisfação de interesses alheios à coisa pública, ao atribuir nome de pessoas vivas a bens públicos.  Argúi, também, que a não-demonstração dos critérios utilizados pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região para denominar os Prédios da Justiça Federal em Sergipe – embora solicitados pelo Órgão Ministerial – fere, ainda o princípio da impessoalidade da Administração, pois nenhuma forma de promoção pessoal é  mais ostensiva que possuir o próprio nome em obras ou prédios públicos.

 

Salienta que o eventual tempo transcorrido desde a inauguração dos aludidos prédios públicos com as combatidas denominações, por óbvio, não pode ser invocado para convalidar o ilícito, pois se trata de afronta permanente à lei e à Constituição Federal, vez que é renovada a cada dia a lesão à legalidade, a impessoalidade e à moralidade  administrativa, com a exposição para a sociedade dos letreiros com nome de pessoa viva na entrada de prédios da Justiça Federal.

 

Aduz que “O Conselho da Justiça Federal, mediante a Resolução nº 497, de 20 de fevereiro de 2006, em consonância com todos os argumentos expressados, dispôs que ‘aos imóveis de uso e patrimônio da Justiça Federal’ é proibido o uso de nome de pessoa viva, nos termos da Lei nº 6.454, de 24 de outubro de 1977, “inexistindo qualquer ressalva de manutenção de denominações efetivadas em momento anterior à Resolução 497/2006, e por razões evidentes, o ato administrativo do Conselho da Justiça Federal determina a óbvia observância à Lei 6.454, que é de 1977.  Logo, faz quase três décadas que está proibida a homenagem, nesses termos, a pessoas vivas.  A situação combatida, efetivada pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, é ilegal.”

 

Proclama a legitimidade do Ministério Público Federal para propor a ação, a legitimidade passiva da União Federal para reponde-la e a competência da Justiça Federal para processá-la.

 

Pede o MPF:

 

“Em virtude do delineado, o Ministério Público Federal requer a esse Juízo Federal que, liminarmente, invalide, como medida de antecipação de tutela, todos os atos administrativos que atribuíram nomes de pessoas vivas aos prédios da Justiça Federal em Aracaju-SE, Itabaiana-SE e Estância-SE, e determine à ré, a imediata retirada dos letreiros respectivos.

 

Requer, também em sede de liminar, seja determinado à ré que tome todas as providências necessárias, de cunho normativo ou material, para que, através do Serviço de Patrimônio da União, identifique a denominação de todos os prédios e obras integrantes do seu patrimônio no Estado de Sergipe, para fins de implementar efetivo controle contra homenagens ilegais como a descrita na presente Ação Civil Pública, e também para retificar todos os casos em que exista ofensa ao disposto na Lei de Regência (Lei 6.454/1977) e na Constituição da República, com a retirada de letreiros e placas com o nome de pessoas vivas constantes desses prédios e obras, e a invalidação dos atos administrativos que atribuíram a denominação ilegal.

 

Requer, para devida efetividade das postulações, a imediata intimação pessoal, inclusive por fac-símile, do Excelentíssimo Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª. Região, Desembargador Federal Francisco Cavalcanti (Av. Martin Luther King – Cais do Apolo S/N – Edifício Djaci Falcão, Bairro do Recife – CEP 50030-908 – Recife-PE) para que dê cumprimento administrativo à liminar, sem prejuízo da intimação à Advocacia da União em Sergipe.

 

Requer seja a decisão proferida inaudita altera parte em razão de que a cada momento a ilegalidade, a imoralidade e a impessoalidade prosseguem produzindo efeitos, OU, que seja cumprido com rigor o prazo de manifestação (72 horas) da pessoa jurídica de direito público (União Federal) em consonância com o disposto no artigo 2º. da Lei número 8.437/92.

 

DO PEDIDO PRINCIPAL

 

Ao final, requer o Ministério Público Federal seja julgada procedente a Ação Civil Pública, com a invalidação dos atos administrativos combatidos, confirmando-se o inteiro teor da tutela antecipada pleiteada, e condenando-se a União Federal a retirar todos os letreiros dos prédios da Justiça Federal em Sergipe denominados com nome de pessoas vivas, devendo, inclusive, identificar a denominação de todos os prédios e obras integrantes do seu patrimônio no Estado de Sergipe, para fins de implementar efetivo controle contra homenagens ilegais (retirando os letreiros respectivos e invalidando os atos administrativos).”

 

Junta os documentos de fls. 25 usque 98.

 

Foi colhida a manifestação da União Federal, nos termos do art. 2º da Lei nº 8.437/92, fls. 101/104 e documentos de fls. 105/148, tendo a ré aduzido que a Secretaria de Patrimônio da União, órgão do Poder Executivo, não tem competência para controlar ou anular atos do Poder Judiciário, pois “ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira”, como corolário lógico do princípio geral da separação e independência dos poderes,...” Positivou também a União que:

 

“No caso dos autos faz-se necessário esclarecer que, embora todos os bens imóveis de qualquer dos três Poderes constituam patrimônio da União, enquanto pessoa dotada de personalidade jurídica, tais bens, ao serem afetados aos serviços específicos do Legislativo, do Executivo ou do Judiciário, passam à Administração exclusiva da respectiva esfera de Poder.”

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“Por tais razões, exigir que a SPU controle, retifique, retire letreiros ou placas, invalide atos administrativos relacionados à denominação de bens afetados aos serviços da Justiça Federal constitui pedido juridicamente impossível, por ofensa ao princípio constitucional da separação dos Poderes.”

 

Quanto à invalidação dos atos que deram denominação de pessoas vivas aos Prédios da Justiça Federal em Sergipe, patenteia a União Federal a ausência de dano irreparável ou de difícil reparação, pois:

 

“Com efeito, as pessoas homenageadas são profissionais cuja atuação restringe-se ao meio acadêmico ou à judicatura federal, não auferindo qualquer vantagem pessoal com a homenagem.  Um Juiz ou Desembargador Federal, ao ter seu nome estampado em um prédio público, pode até sentir uma satisfação pessoal mas, objetivamente, nada acrescenta a sua carreira.  Eventual ascensão a cargos mais elevados, por exemplo, está condicionada à rigorosa observância dos requisitos legais a todos impostos.  

Ponderou, ainda, a União Federal que:

 

“Ademais, os atos inquinados de nulidade estão em vigor há mais de um ou dois anos, como é o caso do Fórum Juiz Vladimir Souza Carvalho, em Itabaiana.

........................................................................................................

 

É razoável, portanto, manter-se o status quo até a decisão definitiva, na medida em que a simples referência às autoridades homenageadas, no caso presente, pela natureza de suas atividades, não tem o condão de lhes conferir objetivas vantagens pessoais.  Diversa seria a situação se os mesmos exercessem funções públicas cuja imagem fosse determinante para seu sucesso, a exemplo de ocupantes de cargos de natureza política.”

 

O Ministério Público Federal, às fls. 152/154, refuta as razões esgrimidas pela União Federal, reiterando os pedidos estampados na inicial e pleiteando a juntada de ofício que encaminhou ao Egrégio Conselho Nacional de Justiça.

 

Designada audiência de conciliação, fl. 157, esta resultou infrutífera, conforme Termo de fl. 162.

 

À fl. 165, foi determinada a citação da União Federal, que ofertou a contestação de fls. 168/173, onde argúi a inocorrência de violação aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade da Administração, considerando que:

 

“Os Atos Administrativos questionados foram editados em obediência à decisão administrativa unânime, tomada pelo Plenário do Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, nas sessões realizadas nos dias 1 a 17/03/2004 e 23 de fevereiro de 2005, conforme faz prova a documentação de fls. 139 e 141.”

 

Assevera que o ato administrativo hostilizado não se enquadra na proibição contida no art. 1º da Lei nº 6.454/77:

“a uma, porque não objetivou fazer divulgação indevida ou cultuar gratuitamente a personalidade de nenhum administrador público, de maneira a ferir o PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE ou de contrariar a Lei de regência da matéria.  Pelo contrário, os atos vergastados buscaram fazer justiça a magistrados e professores merecedores de homenagens;  a duas, o ato questionado não implicou em geração de qualquer despesa para os cofres públicos, o que afasta, por completo, a apontada violação ao PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA.”

 

Assinala que os homenageados são:

 

“... homens reconhecidamente simples, que galgaram, por seus próprios méritos, os espaços mais respeitados na Magistratura Nacional e no Magistério Superior...”

 

Pontua que a Secretaria do Patrimônio da União, órgão do Poder Executivo, não dispõe de mecanismos de controle da atividade administrativa dos Tribunais, em face do que dispõe o art. 99 da Constituição Federal.

 

Por fim, pede a improcedência do pleito autoral, pois os homenageados não tomaram parte no Colegiado que adotou a decisão imugnada e não obtiveram qualquer vantagem pessoal em razão dela, além do que não houve oneração dos cofres públicos com as homenagens inquinadas de ilegais.

 

Pendente o exame da antecipação de tutela requestada, vieram-me os autos conclusos para decisão.

 

É o breve relato.

Decido.

 

A questão suscitada nos autos é, aparentemente, de fácil solução, vez que, nos termos literais do art. 1º da Lei nº 6.454, de 24 de outubro de 1977, estaria proibido “atribuir nome de pessoa viva a bem público, de qualquer natureza, pertencente à União ou às pessoas jurídicas da Administração indireta.”

 

Ocorre que referida lei é de constitucionalidade duvidosa, considerando que é questionável a sua recepção pela Carta Magna de 1988, em face do que dispõe o seu art. 99, que estatui:

 

“Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira.”

 

Obviamente que dentro da autonomia administrativa do Poder Judiciário insere-se a gestão dos seus bens, inclusive imóveis, sendo-lhe lícito dispor acerca dos mesmos como recomendarem as normas da boa administração.

 

Dentro do espírito da aludida norma constitucional, afigura-se razoável que os Tribunais tenham autoridade para denominar os seus prédios, homenageando as personalidades públicas, especialmente, membros do próprio Poder Judiciário, com relevantes serviços prestados ao Estado e à coletividade, como o fez o Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, quando batizou o Fórum da Justiça Federal em Itabaiana-SE de Juiz Vladimir Souza Carvalho, magistrado federal, nascido em Itabaiana, neste Estado, além de literato consagrado, com diversas obras publicadas, no campo do direito, da história e da literatura, sendo um dos mais festejados autores da cultura sergipana;  bem assim quando denominou o Fórum da Justiça Federal de Estância-SE de José de Castro Meira, ilustrado Ministro do Superior Tribunal de Justiça, que foi Juiz Federal em Sergipe e Desembargador e Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, sem falar que foi, ainda professor do Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe;  igualmente, quando nominou de Desembargadora Margarida de Oliveira Cantarelli o prédio do Juizado Especial Federal em Aracaju, sendo relevante destacar que a douta homenageada foi Presidente do Colendo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, tendo instalado as Varas Federais de Itabaiana e Estância, neste Estado, além de implantar a nova sede do Juizado Especial Federal de Aracaju, dentre outras obras e realizações que implementou na Seção Judiciária de Sergipe, inclusive tendo sido homenageada com os títulos de cidadania que lhe conferiram a Assembléia Legislativa do Estado de Sergipe e a Câmara Municipal de Estância/SE.  É de notar que a Doutora Margarida Cantarelli é também professora universitária.

 

Homenageado também foi o Professor José Fernandes de Lima, ex-Reitor da Universidade Federal de Sergipe, onde se consagrou como mestre e administrador universitário, muito tendo contribuído para que o Juizado Especial Federal se instalasse no Prédio da Praça Camerino, pertencente à aludida Universidade.

 

Indiscutível, pois, que os agraciados foram e são merecedores das homenagens que lhes foram prestadas pela Corte Regional Federal.

 

Sob o ponto de vista da legalidade, está demonstrado que a Constituição Federal ampara os atos adminsitrativos que foram impugnados pelo MPF;  não se vislumbra qualquer ofensa à moralidade administrativa, haja vista que os homenageados não postularam a atribuição do seu nome a prédios públicos nem tampouco auferiram qualquer vantagem econômica ou financeira desse atos da Administração, não havendo de se falar em despesas que, se existiram, foram irrisórias, com a aposição do nome dos homenageados nos aludidos prédios.  O princípio da impessoalidade da administração também não restou agredido, porquanto a alegada promoção pessoal inexistiu, considerando que os homenageados são magistrados de carreira, todos exercendo a judicatura, de onde não podem obter qualquer favorecimento pessoal com a utilização do seu nome em prédio público.  O mesmo se pode dizer do professor José Fernandes de Lima que, como administrador acadêmico e membro do magistério, não pode extrair do empréstimo do seu nome a um prédio público qualquer promoção social ou vantagem de qualquer ordem.

 

Se tudo isso não bastasse, a matéria somente foi regulamentada pelo Conselho da Justiça Federal, através da Resolução nº 497, de 20 de fevereiro de 2006, quando houve, efetivamente, a proibição, pelo órgão administrativo do Poder Judiciário Federal,  do uso do nome de pessoa viva para batizar imóveis do patrimônio da Justiça Federal.

 

Os atos administrativos guerreados são anteriores à Resolução nº 497/2006-CJF, não podendo alcançá-los.

 

Merece registro, também, que a matéria foi apreciada pelo Conselho de Administração do Tribunal Regional da 5ª Região, em 18 de janeiro de 2006, quando, por unanimidade, os Desembargadores que integram o órgão entenderam que a postulação dos doutos membros do Parquet Federal não é da competência dos Procuradores Regionais que atuam junto à Corte Regional Federal, sendo de destacar que o Dr. Procurador Regional Federal que oficia perante o douto Tribunal Regional Federal da 5ª Região participou da Sessão Plenária da aludida Corte e não impugnou a designação dos nomes que batizaram os reportados Fóruns Federais em Sergipe, consoante emerge dos documentos de fls. 40/42.

 

Ademais, inexiste “periculum in mora”, pois os atos administrativos combatidos datam de abril de 2004 e março de 2005, não tendo sido demonstrados os prejuízos que a União sofreu até então com as denominações atribuídas aos referidos prédios.

Posto isso, ausentes os requisitos legais autorizadores da antecipação de tutela requestada, indefiro-a, mantendo a denominação atribuída pelo Colendo Tribunal Regional Federal da 5ª Região aos Prédios da Justiça Federal em Sergipe.

 

Manifeste-se o MPF acerca da contestação da União Federal, no prazo de dez dias.

 

Intimem-se.

 

Aracaju, 05 de fevereiro de 2007.

 

 

JUIZ EDMILSON DA SILVA PIMENTA.